quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

O FIO DAS LEMBRANÇAS (8)

(Excerto da Biografia que escrevo sobre Amadeu Ferreira)

No dia 16 de Março tudo muda. «Nesse dia, estou de serviço de Oficial de Prevenção e aparecem-me lá com uma série de oficiais presos, na patente de Capitão, Major.» Eram os militares que tinham chefiado o Golpe das Caldas. «O Depósito Geral de Adidos era uma tropa fandanga, que até metia medo só de pôr aquela gente a disparar, porque não sabiam se a arma disparava para a frente se disparava para trás, mas por força das circunstâncias tornou-se um centro dos acontecimentos e eu vi-me envolvido, com essa gente no 16 de Março. » Amadeu não tinha tido qualquer informação prévia sobre o Golpe das Caldas, ao contrário do 25 de Abril, sobre o qual estava informado. « Eu sabia que ia acontecer o 25 de Abril, o oficial de ligação do MFA, no Depósito Geral de Adidos, tinha-me contactado para eu fazer parte do apoio. Eu aderi imediatamente, mas nunca participei em reunião nenhuma, era um oficial miliciano aspirante ainda novito e portanto tinha que ser mantido à distância. No entanto era um puto reguila, falador, e puxavam-me para o lado deles.»
O Oficial de ligação do MFA, no Depósito Geral de Adidos era o Capitão Santa Clara Gomes. « Um madeirense ferido de guerra, um homem dos copos, que desde que saí da tropa não voltei a ver, com quem fiz uma grande amizade e que eu gostava de voltar a ver. Era o oficial de ligação e dizia-me “puto vamos lixar esta merda toda, tás connosco, vamos embora !”. Estes oficiais do 16 de Março, como é sabido, anteciparam-se, eram oficiais spinolistas que não estavam devidamente enquadrados no movimento, mas de alguma maneira tinham tomado a liderança e precipitaram a saída dos militares do Quartel das Caldas. Juntamente com essa gente vêm outros oficiais efectivamente ligados ao 25 de Abril e são todos desterrados para os Açores.» É Amadeu, enquanto Oficial de Prevenção, coadjuvando o Oficial de Dia, que os mantém sob prisão militar e os acompanha ao avião para os Açores.
«Eu e o Oficial de Dia temos a função de os receber, de os manter ali, de conversar com eles. Havia pelo menos um ou dois que tinham passado lá pelo quartel e somos nós que os acompanhamos que os encaminhamos ao avião e que os enviamos para os Açores. Isso acontece durante uma noite, enquanto eles estão ali sob prisão militar. A partir de então torna-se seguro que o 25 de Abril vai acontecer, mais cedo ou mais tarde, e nós sabíamos que aqueles oficiais estavam integrados num movimento mais amplo, que viria a dar os seus frutos.»


Escrito por Teresa Martins Marques

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