segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

Especialista diz que é necessário arrancar Torga de "uma visão paroquial e provinciana"

O professor de Literatura Portuguesa da Universidade de Coimbra (UC) José Augusto Bernardes considera que o escritor Miguel Torga está «muito prisioneiro de lugares comuns», sendo necessário «arrancá-lo de uma visão paroquial e provinciana». 

O também director da Biblioteca Geral da UC sublinha que ainda há «muitos campos por investigar» na obra de Miguel Torga, escritor que morreu há 20 anos.

Um campo de investigação prioritário «seria inscrever Torga na cultura europeia do seu tempo» e «arrancá-lo da visão paroquial e provinciana», disse o professor catedrático, sublinhando que seria necessário «abordar o diálogo» que o escritor natural de Trás-os-Montes teve «com importantes nomes da cultura europeia como Homero, Montagne ou Camões».

Segundo José Augusto Bernardes, Torga está prisioneiro de lugares comuns, como «o Torga telúrico», ligado à terra, «o Torga resistente» ou ainda a «imagem muito cristalizada» de ser um «autor sobretudo juvenil».

Porém, o director da Biblioteca Geral frisou a importância deste escritor «para o adolescente de hoje», por evocar, na sua obra, «um mundo em extinção» - o Portugal rural -, podendo os seus livros servirem «de contraponto à realidade» actual. «Torga faz mais sentido hoje que no meu tempo», observou. 
Para José Augusto Bernardes, aprender Torga é também «aprender a escrever», por ser um autor dono de uma escrita «com clareza, elegância, mas também profundidade».

O autor, que morreu a 17 de Janeiro de 1995 em Coimbra, «era um mestre da pergunta», com contos que deixavam uma «sensação de perplexidade» - «um homem que nunca procurou alinhamentos», durante ou depois do Estado Novo.

«É uma figura da nossa comunidade, que atravessa o século XX. Um homem de coragem, que conhecia o país e Portugal no mundo», frisou.

Ana Paula Arnaut, também docente de Literatura Portuguesa na Faculdade de Letras da UC, salientou o olhar «extraordinário» de Torga em relação a um «Portugal específico», sendo fundamental para se saber «o que foi o Portugal ditatorial, mas também o Portugal pós-25 de Abril».

Os seus diários, bem como a poesia e os contos, oferecem «um manancial de interpretações», sempre em torno de temas universais, «mesmo quando trata de Trás-os-Montes», referiu.

Corroborando com José Augusto Bernardes, a professora considerou que Miguel Torga se assumia como «um purista da Língua portuguesa», que tentava «alcançar a perfeição».

Apesar de ser «um dos grandes nomes» da literatura portuguesa, a academia «tem esquecido um pouco Torga», bem como o mundo editorial, que «não tem feito a devida divulgação», frisou Ana Paula Arnaut.

Hoje, (17 de Janeiro) assinalam-se os 20 anos da morte de Miguel Torga, pseudónimo de Adolfo Correia da Rocha, que nasceu a 12 de Agosto de 1907, em Sabrosa, Vila Real, e que viveu grande parte da sua vida adulta em Coimbra.

Ao longo da sua vida, publicou livros como «Bichos», «Criação do Mundo» ou «Novos Contos da Montanha», tendo sido traduzido em diversas línguas.

Retirado de www.noticiasdonordeste.pt

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