Nos primeiros verões da minha infância e como fosse muito mais novo que os meus irmãos e irmã, a minha mãe mandava-me, às vezes, com o meu irmão José Emílio, quando ele ia à estação dos caminhos de ferro buscar gelo para o peixe que os meus pais vendiam no Mercado Municipal.
O José Emílio, no princípio, até nem se importava muito e lá íamos os dois, todos contentes. No entanto, à medida que a idade dos porquês ia tomando forma, a sua boa vontade foi declinando, subjugada ao peso das crescentes perguntas que eu fazia.
- Olha, o que é aquilo?
- É um carro.
- Para que serve?
- Para andarmos nele.
- E como se faz?
- Tem que se aprender a conduzir.
- Aonde? Como? Porquê?
Era um nunca mais acabar de perguntas, um inquérito sem fim à vista que, nem assim, saciava a minha ânsia de saber.
O meu irmão lá ia respondendo conforme podia ou até se cansar e, de vez em quando, desabafava: "Que chato és, que nunca mais te calas. Da próxima vez não te trago comigo, nem que a mãe me obrigue!"
No entanto, lá ia eu sempre que a mãe mandava. E lá iam as perguntas do quando, onde, porquê, para quê, quem, etc... Ainda hoje o meu irmão fala nisso e continua a dizer: "Que chato eras, que nunca mais te calavas, parecia que tinhas engolido um gira discos".
Outras vezes levava-me ele, por sua livre vontade, até à fonte que fica nas costas do Castelo, ainda dentro do enquadramento das muralhas, para apanharmos girinos e rãs.
Esses passeios eram feitos ao fim da tarde e a seguir ao jantar pois, durante o dia o meu irmão trabalhava. Como, normalmente, jantávamos cedo e os dias de verão são muito grandes, tínhamos muito tempo para as descobertas.
Foi com o José Emílio que descobri como era engraçado brincar com os girinos e as rãs. Foi com ele, também, que aprendi alguns jogos de paciência para apanhar os bichos. Lembro-me que passávamos horas e horas à volta da fonte, sem outro interesse que não aquele.
Marcolino Cepeda
(Retirado do livro "Pontes - segredando segredos", de 2001, edição do autor)
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