sábado, 5 de novembro de 2011

Entrevista com o Padre Jaime Nuno Cepeda Coelho

Nasceu em Soeima concelho de Alfandega da Fé. É, portanto, um transmontano. Fale-nos da sua infância na aldeia.

A minha infância foi uma infância normal, de uma criança normal, de uma criança da aldeia. Era filho de uma professora da aldeia e tinha a alcunha de “professor” que me indignava e por causa da qual tive algumas lutas com os meus companheiros, coisa de que agora me rio.

Mas essas lutas até eram saudáveis…

Sim. Não havia sangue. Era só para saber qual era o primeiro que conseguia deitar o outro abaixo e terminava tudo.

Que condicionalismos fizeram com que fosse jesuíta?

Foi a passagem de um missionário em Soeima. Um missionário jesuíta que eu muito admiro que era o padre Ferraz que, infelizmente, já faleceu. Impressionou-me. Não me lembro o que dizia mas impressionou-me a maneira como ele falava de Jesus. Depois soube que ele era jesuíta e em vez de ir para espiritano, onde já tinha um irmão mais velho a estudar, decidi ir para jesuíta porque os meus pais criaram-nos a todos com muita independência. Lembro-me que quando tinha nove anos perguntaram-me para onde queria ir e eu é que lhes perguntei a eles e eles disseram: “ Como tu já és um homem, tu decides e depois avisas-nos” e assim foi a minha vocação para jesuíta.

Fale-nos um pouco da sua vida de seminarista.

Fiz o curso que se faz nos liceus. Era um seminário muito aberto em Macieira de Cambra no concelho do Porto. Comíamos bem, tínhamos bons professores, de maneira que foram uns anos muito felizes na minha vida em que aprendi a nadar no rio Caima e estudei muito e depois fui para os jesuítas, oficialmente, em Braga onde entrei na Universidade da companhia de Jesus.

Há quantos anos está no Japão e como foi a sua adaptação a uma cultura tão diferente da nossa?

Estou há quarenta e quatro anos. Adaptei-me porque vivia com outros estrangeiros, tínhamos uma boa organização lá e já tínhamos uma grande tradição portuguesa no Japão porque fomos os primeiros a chegar lá em 1543 e eu, quando cheguei lá, foi como se entrasse em casa própria porque tinha lido muito sobre o Japão e entendo-me com os japoneses como me entendo com os portugueses.
Qual foi a maior diferença dessa mudança?

A maior diferença foi ver que lá as pessoas são um bocadinho fechadas e era difícil quebrar o gelo ou romper as barreiras da comunicação. Nós aqui falamos com imensa facilidade uns com os outros. Andamos sempre à procura dos conhecidos e gostamos de ter muitos amigos, abrimo-nos com muita facilidade e lá não. São fechados mas, depois de se ultrapassar essa barreira, foi lá que fiz dos amigos mais fiéis da minha vida que ainda hoje conservo.

Adaptou-se bem à gastronomia?
Ao princípio custou um bocadinho. O chá verde sem açúcar custa um bocadinho a tomar, o peixe cru também mas agora como com gosto. É uma comida muito saudável embora não seja tão saborosa como a chinesa ou como a portuguesa.

Fale-nos um pouco da cultura oriental?

Não sei por onde começar. Estou a tentar escrever um livro que depois terei muito gosto em fazer aqui, alguns comentários sobre ele.
A cultura é muito diferente da nossa porque é uma cultura isolada, procura até defender-se da China mas, é uma cultura muito interessante. Eu aprendi lá muita coisa porquê tem muita coisa boa no Japão. Não gostam de incomodar as outras pessoas. No Japão não há ladrões, coisa que a mim me impressiona porquê, sendo um país não cristão eu pensava que seriam inferiores a nós em muitos aspectos e são superiores. Lá nunca, na minha vida de professor, onde estive quarenta anos a ensinar na Universidade, me desapareceu nada do meu gabinete; se alguém perde uma carteira vêm entregá-la se tiver o nome da pessoa. São coisas muito, muito lindas.

Tem uma identidade muito própria e muito próxima em termos de respeito uns pelos outros… Como foi a sua experiência como professor universitário no Japão e quais são as diferenças mais marcantes entre o ensino oriental e ocidental?

É um assunto interessante e isto levaria muito tempo a explicar. A primeira diferença é que os alunos no Japão são muito ordeiros, não há dificuldade em manter a disciplina na aula, eles fazem tudo o que a gente lhes diz e têm um respeito tal pelo professor, a palavra professor que, em japonês, se diz sensei é uma palavra que os alunos respeitam a tal ponto e, isto talvez, escandalize os nossos ouvintes portugueses que, quando desconfiam que o professor não sabe eles não perguntam só para não envergonhar o professor frente aos seus colegas. Acho que aqui em Portugal é um bocadinho ao contrário, os alunos quando desconfiam que o professor não sabe, é quando lhe fazem a pergunta e para envergonhá-lo diante dos alunos.

Sei quão difíceis são as línguas orientais mais particularmente o chinês o japonês e o coreano, pois estudei durante dois anos o japonês na USP (Universidade do Estado de São Paulo). Admiro muitíssimo o trabalho desenvolvido pelo Padre Jaime que culminou com a publicação de um dicionário de japonês/português, editado pela Porto editora. Fale-nos desse percurso.

Esse dicionário levou-me 24 anos a fazer. Foi muito difícil. Era um projecto em que os meus colegas de ensino não acreditavam mas, eu lancei-me a ele de cabeça porquê sentia a necessidade dele. Os meus alunos pediam-me esse dicionário e eu tenho muitos alunos, centenas de alunos a que ensinei português e cultura portuguesa e vi que era uma falta de consciência estar a ensinar numa universidade sem ter esse elemento básico de trabalho. Apesar das dificuldades financeiras, de tempo, às vezes tive de ficar a trabalhar até há meia-noite e uma da manhã, sobretudo quando foi da correcção das provas mas, estou muito contente por esse trabalho e se hoje tivesse… nunca me arrependi dos 24 anos que dediquei a esse dicionário.

Esse dicionário é de japonês para português, portanto, para ser usado pelos japoneses para aprenderem português. O inverso… acha que os portugueses conseguem aprender essa língua com facilidade?

Eu acho que é mais difícil para um português aprender japonês. Isso foi a minha experiência porque eu era português e aprendi japonês. Demorei dois anos a estudar e foi preciso estudar a sério para aprender bem a língua em dois anos. Foi a língua que me demorou mais a aprender. Eles dizem que o português é muito difícil mas eu acho que o japonês é a língua mais difícil do mundo porquê… é mais difícil que o chinês. Nós dizemos em português “isto para mim é chinês” como se fosse uma coisa muito difícil mas, podíamos mudar esse ditado para “isto para mim é japonês” porquê é muito mais difícil. O japonês tem as letras chinesas e a mesma letra pode-se ler de muitas maneiras quando no chinês só tem uma maneira de ler a mesma letra.

Num dicionário de português/japonês a tradução viria em letras latinas a que nós estamos habituados ou viria em kanji?

Eu acho que terá de vir nas duas, para principiantes. Eles precisam de ter também no nosso alfabeto latino porque senão olham para aquilo e não entendem mas para quem está adiantado na língua e faz progressos no japonês então, já quer aprender a escrever em japonês. Isso foi uma novidade que introduzimos no nosso dicionário as palavras japonesas estão também escritas no alfabeto latino e depois nas letras deles. A edição da porto editora só tem o alfabeto latino mas na edição japonesa tem também as letras japonesas ou chinesas.

O que torna bastante mais interessante…

Interessante e serve para todos porque eu pensei em todas as possibilidades, todos os possíveis utentes.

Julgo saber também que o primeiro dicionário de japonês/português foi escrito por um português. Fale-nos da receptividade do seu dicionário. Em quantos países foi lançado?

Foi lançado solenemente no Japão, em Portugal e no Brasil mas, já me pediram para traduzir o dicionário para francês. Eu neguei-me porque não tenho tempo. Vou fazer agora o irmão dele que é português/japonês e se possível também um, só de português para estrangeiros. As características do nosso dicionário e quem o usar, dá conta disso, é que é um dicionário muito elaborado, muita gente colaborou, estão ali milhares e milhares de horas de trabalho e por isso segundo as críticas dos jornais japoneses porque, saíram criticas em quatro ou cinco jornais de maior circulação no Japão, apontavam este dicionário como o mais bem trabalhado, o mais bem elaborado dos dicionários que eles conheciam. Não é para me gabar assim, à transmontana mas, se eles disseram isso, algum fundamento deve ter.

Preferiu que ele demorasse muito tempo a ser elaborado e ficasse bem feito ou não se importaria que ele tivesse demorado dois ou três anos e que saísse com um erro ou dois?

Com alguns erros, ou seja, com menos cuidado, não levaria tanto tempo e renderia mais e eu receberia mais direitos autorais. Isto, no entanto, é uma obra puramente cultural. É uma paixão que continua e entrou-me cá dentro e por isso quero voltar a fazer também os outros dois dicionários.

Qual é a relação dos japoneses com a cultura portuguesa?

Os japoneses têm uma grande admiração pelos portugueses por termos sido os primeiros europeus a chegar ao Japão em 1543. Eles, quando vêm a Portugal e vão a Lisboa e lhes dizem: “Foi daqui que saíram os barcos dos portugueses que chegaram ao seu país.”, ficam ali, às vezes, horas a olhar para a barra do Tejo e dizem: “Foi daqui” e repetem essas palavras. Têm uma tal admiração por nós que, no Japão, há seis universidades em que a língua portuguesa é cadeira oficial como as germânicas são em Portugal. Em seis universidades japonesas e, em Portugal, ainda não temos a recíproca que é de ter aqui uma faculdade com pelo menos um departamento.

Sabemos que o Doutor Mário Soares, aquando de uma visita ao Japão como Presidente da República, durante o encontro com o Imperador, preteriu o intérprete que lhe estava destinado e chamou por si. Fale-nos desse episódio.

Foi uma destas graças, talvez do Doutor Mário Soares porque, eu já tinha traduzido para ele quando visitou a nossa universidade em Tóquio onde eu ensinei trinta e tantos anos quase quarenta e ele gostou da tradução e, então, quando viu que eu estava ali ao lado dele, preferiu escolher-me como intérprete, só isso.

Fale-nos da sua luta por Timor leste e dos problemas que isso lhe acarretou.

Timor tocou-me muito por eu viver geograficamente perto. No Japão estava geograficamente mais perto do que os portugueses que estavam aqui em Portugal e eu senti, sobretudo, depois do massacre de Santa Cruz em 1991 que, era um crime que não se podia deixar passar. Um país forte, com um grande exército contra um povo indefeso… tenho lá colegas meus, sacerdotes de quem sou muito amigo, jesuítas… vi que tinha de fazer qualquer coisa no Japão e então integrei-me num dos grupos que apoiavam a independência de Timor que são treze grupos do norte ao sul do Japão. O nosso era, talvez, o mais activo em Tóquio porque também tínhamos mais meios, mais facilidade de entrar em contacto com meios de comunicação etc… a cena mais interessante, a hora em que me empenhei mais por Timor, foi numa visita de Suharto ao Japão, sendo, então, Presidente da República da Indonésia. Foram muitos anos de ocupação como vocês sabem e, pensei que tinham de fazer qualquer coisa para… fazer ali um grito e então pintei as paredes da embaixada da Indonésia com “Libertem Timor” e a polícia veio prender-me, no entanto, a polícia tratou-me muito bem porque sabia que eu fiz aquilo por uma causa justa. Foi uma cena muito interessante em que eu senti muita, muita alegria ter feito alguma coisa por Timor. Isso saiu na imprensa e o Suharto voltou para a Indonésia e não pode dizer que a Indonésia tinha sido muito bem recebida no Japão.

Qual é a sua opinião sobre a situação que se vive agora e quais são as suas perspectivas de futuro para Timor?

Eu acho que Timor vai ser a pérola da Ásia. Um país onde vai haver bons cidadãos onde não vai haver diferenças entre ricos e pobres. Aliás, os nossos políticos actuais de Timor estão a dar exemplo de desapego do poder e do dinheiro a começar pelo Presidente da República. Embora esse perigo exista sempre, certamente não vai acontecer o que aconteceu em Angola, Moçambique, onde os governos se apropriaram dos bens do povo. Eu estive lá quando foi da celebração da independência e vim de lá muito, muito optimista e continuo.

Sendo, talvez, o mais importante lexicologista português da actualidade, que futuro preconiza para a língua portuguesa?

Ai não sou… de maneira nenhuma, não sou o número um em lexicologia em Portugal mas, sei que o trabalho que estou a fazer sobretudo o dicionário de português para estrangeiros com exemplos de sinónimos, antónimos, provérbios da língua portuguesa, sei que vai ser um grande instrumento para divulgar a nossa cultura no mundo. Nós não temos esse dicionário, as grandes línguas têm esse dicionário e eu quero terminar essa obra e estou agora cem por cento empenhado nela e também no dicionário português/japonês como há pouco disse.

Vai sair antes do dicionário português/japonês?

Depende. Pode ser que saía mas, ainda não lhe posso dar a certeza.

Ambos são importantes?

Sim, ambos são importantes e depende um bocadinho, também, das editoras, das facilidades que nos derem porque vai ser editado pela editora que nos der mais facilidades.

Realizou-se, no ano passado em Bragança, o segundo congresso de lusofonia. Este ano terá lugar o terceiro, também aqui. Não nos quer falar sobre esse assunto?

São congressos muito bons mas que não têm tido muita gente a participar. O próximo também se vai realizar em Bragança? No próximo eu, infelizmente, não poderei participar mas, gostaria que mais bragançanos também participassem e se daqui saíssem colaboradores para os meus dicionários o congresso valia o dobro.

Este congresso não deve ser só para bragançanos.

Pois não, é a nível nacional. Aquele em que participei organizado aqui em Bragança teve muito sucesso mas a participação em número de pessoas acho que foi… devia ter tido mais gente. Um dos participantes foi o Doutor Seabra, antigo Ministro da Cultura que já faleceu. Ele foi um dos participantes, de maneira que, deveria vir mais gente e todos os que estão interessados na nossa língua deviam participar.

O que pensa da participação do Doutor Chrystello, todo o empenhamento que ele tem nisto?

Foi fantástico. Gostei imenso da maneira como ele organizou tudo. Apreciei muito também a colaboração do senhor Presidente da Câmara, o Engenheiro Jorge Nunes a maneira como nos receberam e foi tudo tão bem organizado. O primeiro congresso, ou colóquio como lhe quiserem chamar em que no fim da realização todos os congressistas tinham em disquete os trabalhos apresentados. Nunca me tinha acontecido isso aqui em Portugal de maneira que dou também os parabéns aqui.

Sabemos que fez a oferta da sua biblioteca oriental ao Instituto Politécnico de Bragança. Fale-nos disso.

Eu fiz a oferta porque eu gosto muito de Bragança. Gosto de promover o nosso distrito e queria que fosse uma espécie de isca para ligar Trás-os-Montes ao oriente porque a biblioteca consta, fundamentalmente, de obras que têm ligação com o oriente e também das nossas relações históricas . Embora não haja, neste momento, estudos orientais que eu saiba, no Instituto Politécnico, temos de fazer qualquer coisa porque há tantas ligações de Trás-os-Montes com o oriente sobretudo de missionários e dentro de Trás-os-Montes sobretudo de Freixo de espada à cinta. Há dois anos faleceu em Chaves um português, o padre Manuel Teixeira que esteve no oriente. Deve ser o português que esteve mais anos no oriente. Ele esteve lá nada mais nada menos que 75 anos. Foi para lá com doze anos e esteve praticamente toda a sua vida. Eu não vou batê-lo, estou lá há 44 mas, não devo estar lá 75 anos. De maneira que estas ligações de tantos missionários sobretudo no oriente. Nós não podemos fechar-nos a essas culturas que, até comercialmente, são muito interessantes. O Japão e a China podem, comprar meio Portugal. Se nós mandarmos para lá castanhas não chegam todas as castanhas de Trás-os-Montes para dar um pacotinho delas…

Eles são tantos também. Deseja uma universidade para Bragança. A existir, que ainda temos de lutar muito por ela, gostaria de leccionar o japonês?

Não sei se estou com idade para isso mas, com certeza, estaria disposto a leccionar por cá se fosse nesse ramo em que eu vivi e em que me formei.

E acredita?

Eu acho que sim porque, uma só universidade para todo o Trás-os-Montes é muito pouco. A universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro a começar pelo nome que é demasiado comprido, acho que era melhor integrar Miranda do Douro, Mirandela e Bragança numa Universidade e depois Vila Real com outra. Até para haver uma certa complementaridade, uma sadia competição. Há universidades a mais em Lisboa e no Porto. É tendo aqui universidades que se atrai a população que se mantêm aqui. Daqui a pouco deixa de haver transmontanos, vão todos para o Porto e para Lisboa e não pode ser. Perdemos esta tradição de gente que está sempre disposta a trabalhar, a lutar porque, é nestas fragas e nestas dificuldades que tivemos até aqui que se formou gente com capacidade para enfrentar todos os perigos e superar  todos os trabalhos. Não estou a falar contra a juventude que eu estou muito contente com os nossos jovens. Eu conheço muitos e espero muito deles mas, a nível nacional temos de por Bragança no mapa. Nós quisemos fazer um congresso na nossa universidade com Bragança e quando ouviram dizer que havia só um Instituto as universidades negaram-se. Não sabem o que é um Instituto. A palavra Instituto usa-se para tantas coisas e. mesmo que seja universidade, podem-se dar os cursos técnicos que a região precisar e que o governo achar bom.

Na nossa região há muitos santuários marianos, entre os quais se destaca o de Cerejais que, além de toda a religiosidade que o envolve, nos oferece das paisagens mais bonitas que conheço. Acha que o desenvolvimento deste tipo de turismo pode ser uma mais-valia para a região?

Eu acho que sim. Na semana passada estive a pregar em Santo Antão da Barca que é outro santuário muito típico aqui da região e que, se ficar submerso com a construção da barragem do Sabor, prometeram que vão transportar pedra a pedra para o alto do monte perto da Parada porque é a freguesia a que pertence esse santuário. Eu acho que a religiosidade popular aqui em Trás-os-Montes é importante. Temos Outeiro, temos a Senhora da Serra, temos ali perto da minha aldeia a Senhora das Neves que é mais pequenino mas, também, é um santuário com muita tradição. Aliás aí já está instalada uma estalagem que fica perto do santuário mas, também não podemos transformar religiosidade em turismo.

Trabalhar em  prol do turismo, será uma mais-valia? Parece-lhe o caminho a seguir?

Eu acho que sim e aqui temos muito a dar em Trás-os-Montes porque tem este ar puro, as boas águas e depois o relevo. Os países com mais relevo são os mais bonitos. O Japão também é um país bonito porque tem muitas montanhas. Eu subi o monte Fuji duas vezes. Tem quatro mil metros o dobro da Serra da Estrela. Nós temos um futuro risonho nesse ponto.

Já agora satisfaça-me uma curiosidade o monte é branco?

Vê-se a terra alguns meses, a maior parte do ano está mesmo branco.

Branco, branco como a neve?

Como a neve sim. È um monte de origem vulcânica altíssimo cone, muito bonito e é tanta a neve que todo o ano, o degelo da neve, forma um rio. Tem umas cataratas chamadas fios de prata. São as cataratas que dão origem a esse rio. Eu já lá estive e bebi dessa água do degelo das neves.

Recordo que em Soeima foi erigido um busto à sua mãe. Uma grande mulher, interventiva e interessada por tudo o que dizia respeito à sua terra. Deve sentir-se muito orgulhoso disso.

Sobretudo muito grato aos alunos dela que erigiram esse monumento. Para mim foi a maior educadora que tive. Teve e tem ainda uma grande influência na minha vida. Foi em parte, origem da minha vocação sacerdotal e, o que mais apreciei nela e admirei sempre nela, foi a imparcialidade que ela tinha na maneira como tratava todas as crianças, de maneira igual. Não havia rico nem pobre nem aluno atrasado e aluno adiantado. Era aos mais atrasados que ela se dedicava mais e dizia-me sempre as crianças gostam que haja igualdade que não haja favoritismos e que nunca haja mentira da parte de um professor e ela foi um modelo disso. Era uma mulher de fé mas, também, era uma boa cozinheira, uma mulher que, primeiro cumpria a sua obrigação, depois é que ia para a sua devoção. Era uma mulher que tinha uma vida muito integrada e foi uma grande educadora. Os alunos que ela tem espalhados pelo mundo sobretudo no Brasil, são muitos. Lembro-a também com muita saudade.

Para terminar que personalidade ou personalidades mais o marcaram ao longo da sua vida?

Eu diria São Francisco Xavier, certamente, foi uma delas. Li a biografia dele e foi essa a segunda causa da minha escolha do Japão. Eu pedi para ir para lá, não fui mandado pelos meus superiores, eu é que pedi e eles concederam-me essa licença. Outra pessoa que admiro muito é a Madre Teresa de Calcutá porque acho que é uma cristã que, escolhendo dedicar a sua vida aos mais pobres dos pobres, não só foi uma luz para nós cristãos mas, também, para os muitos pagãos da Índia. Uma mulher extraordinária. Uma grande santa. Será, com certeza, canonizada também, algum dia. Outro que eu admirei imenso foi o padre Américo, fundador da casa do Gaiato uma pessoa que vivia a sua fé. Ele, como padre, viu na promoção dos jovens sem pais, dos jovens abandonados, dos jovens pobres uma grande virtude, dedicou a isso a sua vida e foi talvez dos homens mais amados em Portugal. Ele, talvez, com o santo padre Cruz, os dois sacerdotes modelo do século vinte em Portugal.

Sem comentários:

Enviar um comentário