quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018

MOVIMENTO PELO INTERIOR DISCUTE EM BRAGANÇA ESTRATÉGIA PARA MINIMIZAR DESIGUALDADES TERRITORIAIS



Diminuir assimetrias entre o interior e o litoral através de 6 medidas, este é o objectivo do Movimento pelo Interior que realizou um debate em Bragança, na passada sexta-feira. Estão previstos mais cinco debates noutros territórios do interior.
O auditório Paulo Quintela não ficou repleto de participantes, mas foram muitos os que não quiseram faltar a uma discussão que teve de tudo, no que toca à esperança de um interior mais desenvolvido e com maior qualidade de vida. Não faltaram também críticas às políticas desenvolvidas, em governos anteriores, no âmbito desta temática. Uma participação activa onde não faltaram personalidades políticas do distrito de Bragança e um público interventivo, no que diz respeito a uma cidadania atenta ao destino do interior do país. 
Os problemas do interior, que no debate foram evidenciados e que assolam no momento o país serão os problemas da demografia, do despovoamento, do abandono do espaço rural, do pouco número de postos de trabalho e o cada vez mais acentuado abandono da actividade económica. 
É importante destacar factos. Segundo o Instituto Nacional de Estatística 50% da população concentra-se em 33 municípios da faixa litoral, representando 11% do total dos municípios portugueses. Juntando a este facto, em 2014, segundo dados do Banco Mundial, Portugal registou a quinta maior perda populacional do mundo. Já de acordo com as projecções do Instituto Nacional de Estatística, a população residente em Portugal tenderá a diminuir até 2080, passando dos actuais 10,3 para 7,5 milhões de habitantes, ficando abaixo do limiar dos 10 milhões em 2031. 
Este é ponto de partida para que sete personalidades políticas se tenham unido no Movimento pelo Interior e tenham solicitado o alto patrocínio do Presidente da República. O Movimento junta dois presidentes de Câmaras de cidades do interior, da Guarda e de Vila Real, Álvaro Amaro e Rui Santos. Álvaro Amaro, para além de ser o autarca do município da Guarda também é o presidente dos autarcas social-democratas e Rui Santos é presidente dos autarcas socialistas. Outras duas personalidades que se uniram a este movimento estão ligadas ao ensino superior e técnico (António Fontainhas Fernandes, reitor da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, e presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas e Nuno Mangas, presidente do Instituto Politécnico de Leiria e presidente do Conselho Coordenador dos Institutos Politécnicos de Portugal). Do sector empresarial, Rui Nabeiro, fundador do Grupo Delta, une-se ao movimento. Fernando Nunes, presidente do Grupo Visabeira, também se constitui como proponente deste movimento. Por fim, a sétima personalidade política que se uniu a este movimento cívico foi José Silva Peneda, ex-presidente do Conselho Económico e Social e ex-deputado no parlamento europeu. O Movimento pelo Interior é uma causa que pretende recolher e reflectir contributos de todos os interessados para apresentar 6 medidas concretas numa última sessão, a decorrer em Lisboa, com a presença do Presidente da República, primeiro-ministro e todos os líderes partidários. O objectivo é apresentar 6 políticas públicas para implementar e alcançar no espaço de 12 anos, ou seja, 3 legislaturas, objectivos a cumprir, que possam ter a sua aplicação no terreno de forma a reverter a situação do interior.
Na sessão do Movimento pelo Interior, em Bragança, no auditório Paulo Quintela, esteve presente Álvaro Amaro, que apresentou o Movimento, o presidente da Câmara de Bragança, Hernâni Dias, Sobrinho Teixeira, presidente do Instituto Politécnico de Bragança e ainda Miguel Pinto, director-geral da Kathrien Automotive, uma empresa sediada em Vila Real. Estes últimos três foram os oradores da conferência. 
Na apresentação do movimento, o autarca da Guarda referiu que tem de se apresentar ao governo “medidas radicais e até mesmo violentas” porque a situação é de um forte desequilíbrio. Para sustentar esta perspectiva, Álvaro Amaro, referiu que é necessário “conseguir que todos dispam qualquer fato político-partidário e vestir o fato do equilíbrio do país, é esse o motivo que nos move”. Para o autarca da Guarda, o Movimento pelo Interior é um desafio para todo o espectro partidário e destacou a “importância deste movimento, como um desafio para todo o sistema político.”
As propostas irão assentar em três eixos fundamentais: o educativo, o fiscal e da descentralização de serviços do estado para zonas menos desenvolvidas. Como coordenadores destes três pilares, foram nomeados coordenadores da maior importância política, como Miguel Cadilhe, que ficará responsável na área fiscal, Jorge Coelho, responsável pela ocupação do espaço pelo Estado, sendo que a questão educativa ficará a cargo de Pedro Lottie. 
Hernâni Dias, anfitrião da iniciativa, reivindica como propostas concretas a atribuição de um estatuto jurídico de interioridade aos territórios menos desenvolvidos, em que se possa “tratar uma parte do interior do pais, como se tratou ao longo dos últimos 40 anos, o processo da insularidade, com a atribuição de um estatuto jurídico de interioridade a estes territórios e ao mesmo tempo, que esses territórios pudessem vir a beneficiar de medidas fiscais radicais, como por exemplo, a nível empresarial, do IRC zero, que poderia ser gradual, à medida que o tempo ia passando, mas também uma redução do IRS para os cidadãos que se fixem no interior e a questão da aplicação da derramas, às empresas”.
Outro argumento que o autarca da capital de distrito apresentou foi a “redução de 50% nos 95 % que o Estado arrecada para si próprio, relativo àquilo que é o rendimento dos cidadãos, seria extremamente benéfico porque poderíamos ter aqui a possibilidade de deixar aqui, anu-almente, 15 milhões de euros nos cidadãos de Bragança”. Um dos convidados a orador da conferência foi Sobrinho Teixeira que defende que “Bragança é o ponto do país mais próximo da Europa” e refere que o factor proximidade é uma vantagem para se definir como um pontos estratégicos para a dinamização do interior. 
Na sua intervenção defende que é necessário dar continuidade na aposta do sector primário, mas sobretudo é muito importante fomentar o sector secundário. Sobrinho Teixeira considerou que Bragança já se encontra num patamar avançado de desenvolvimento, exemplo disso, é o IPB desenvolver um trabalho de “geração de conhecimento” através do CIMO – Centro de Investigação da Montanha, que considera como a “jóia da coroa”. O CIMO não se encontra só virado para a agricultura, mas também para a tecnologia alimentar. O Presidente do Instituto Politécnico de Bragança apresenta a criação de um Laboratório de Inovação Industrial, que já foi candidato e vai se especializar em inovação industrial de forma a potenciar o desenvolvimento e a economia numa região de baixa densidade. Acrescenta que “gostava que fosse uma referência a nível ibérico e europeu”.
Outro factor importante, ressalvado pelo presidente desta instituição de ensino superior, é a aprovação do projecto de seis laboratórios colaborativos, para as regiões de montanha, projecto desenvolvido em parceria com o Instituto Politécnico da Guarda. O Centro de Inovação Industrial é uma das novidades que apresenta, de forma a potenciar o desenvolvimento e economia numa região de baixa densidade. Na sua comunicação, também criticou a CCDRN afirmando que os fluxos financeiros não estão a ser canalizados para o interior, porque não existe majoração para as regiões de baixa densidade. Neste aspecto, até deu um exemplo, em que não existe uma empresa que seja capaz de candidatar um projecto, no valor de um milhão e quinhentos mil euros, porque as empresas instaladas no interior não têm essa capacidade financeira. 
Já Manuel Pinto, da empresa vila-realense, como gestor de uma empresa do interior queixou-se relativamente ao facto de o IRC ser elevado, que terá de diminuir e é necessário que seja adaptado às necessidades destas empresas do interior. Na sua intervenção, afirmou “é uma questão que me preocupa, porque o meu maior concorrente é a China”. 
José Silva Peneda, na sua defesa do movimento, referiu “que nunca é tarde, para contrariar esta tendência de despovoamento e de desequilíbrio, ainda vamos a tempo e a prova é esta reunião, porque vi aqui pessoas com cepticismo e com vontade de contrariar estas tendências”. 
O Jornal Nordeste tentou obter a reacção de Artur Nunes, presidente do município de Miranda do Douro e presidente da direcção da Comunidade Intermunicipal Terras de Trás-os-Montes que não quis prestar declarações. 
Uma nota importante a destacar é que o coordenador da Unidade de Missão para a Valorização do Interior, João Paulo Catarino, esteve em Bragança, mas não esteve presente na conferência pelo interior. 

T E S T E M U N H O S :

Jorge Nunes – Vogal da Comissão Directiva do Programa Operacional Regional do Norte
Jorge Nunes saudou o Movimento pelo Interior e caracterizou-o como um movimento positivo que implica obrigações de cidadania e que se encontram sintonizadas com problemas centrais. No entanto, referiu que “não podemos descurar dos problemas que vivemos: os problemas de demografia, de despovoamento, problemas de economia e do abandono do território”. Relativamente às críticas proferidas nas intervenções, relativas aos fundos comunitários, explicou que no respeito aos fundos públicos da União Europeia mobilizados por entidades públicas, consegue-se fazer um equilíbrio na atribuição de fundos, porque este este exercício está no domínio da decisão política. No entanto, no que diz respeito, aos incentivos às empresas, a atribuição de fundos é um processo mais difícil de realizar. Porque, prossegue, “esse equilíbrio, é fruto das próprias empresas que concorrem a estes incentivos. Há muita fragilidade das empresas uma vez que o maior dinamismo das empresas, da capacidade económica, das assessorias, estão concentradas no litoral, existindo algumas lacunas e portanto a questão está no território”. Destacou ainda que “não podemos colocar o foco nos fundos comunitários, como o elemento chave para a resolução dos problemas do interior. Os fundos estruturais não são capazes, por si só, de resolver os problemas de interioridade, eles podem dar um contributo, há medidas de natureza política pública de outro alcance”. Jorge Nunes defende que medidas de descentralização, desconcentração de população, questões de cooperação transfronteiriça, fiscalidade às empresas, no fortalecimento do centros superiores e dos centros de competência científicos, tecnológicos e de interface para actividade económica são questões a ter em conta.

Berta Nunes - Presidente da Câmara de Alfândega da Fé
Berta Nunes saudou a iniciativa do movimento, mas alertou que por vezes existe é uma política de “não sair do mesmo sítio, dá-se um passo à frente, com a incrementação de algumas políticas, mas o governo muda e as políticas são alteradas e dá-se um passo atrás”. Para a autarca, o movimento não será o salvador para o interior, é mais um contributo mas que não poderá actuar de forma isolada e poderá ser constituído como um impulso forte porque tem as condições para sejam tomadas medidas consensuais. A autarca também chamou a atenção para a Unidade de Missão para a Valorização do Interior (UMVI) cuja acção não foi objecto da devida avaliação das 164 medidas apresentadas e que nunca mais “se ouviu falar do assunto”. Aconselhou na sua intervenção que as medidas que sejam tomadas deveriam ser reflectidas na Constituição da República Portuguesa. 

Jorge Fidalgo - Presidente da Câmara de Vimioso
Jorge Fidalgo destacou que “ainda há muitos portugais esquecidos” e destacou o insucesso da Unidade de Missão – UMVI. Ressalva que estes dois movimentos são complementares. Um dos aspectos importantes que salientou foi a questão do modelo de governação, uma vez que o centralismo é uma questão grave e que o Estado deveria dotar os municípios de mais poder no que diz respeito à tomada de decisões. No que respeita às desigualdades entre o litoral e o interior destacou “sabendo que é uma luta desigual quando temos de trabalhar com armas diferentes”, referindo-se aos fundos comunitários que são canalizados em maior volume para o litoral. 

Escrito por: Jornalista Maria João Canadas

Sem comentários:

Enviar um comentário