Nasceu em Bragança, na freguesia da sé. Que recordações guarda da sua meninice e juventude?
Bom, as minhas recordações são, naturalmente, muito boas e são muito boas porque Bragança, quando eu era menino, era uma terra muito diferente daquilo que é hoje. Não digo que hoje seja pior, é diferente. Desenvolveu-se, cresceu, as relações entre todas as pessoas da cidade são naturalmente mais longínquas e naquela altura Bragança era uma terra pequena em que toda a gente era muito próxima e independentemente dos estratos sociais havia de facto uma vivência muito forte, de grande ligação entre as pessoas.
Eu tive a felicidade de viver sempre na Rua Direita, a Rua Direita era o centro de Bragança, era a rua mais comercial de Bragança. Vejam bem, nestes anos todos, a volta que isto tudo levou! E tinha outra característica que era a de ser o núcleo onde toda a população estudantil da cidade se encontrava. O Liceu era junto à Sé, ainda todos nos lembramos disso. Havia o Liceu dos rapazes, o Liceu das raparigas e a escola Industrial era a meio da Rua Direita na entrada para a Rua dos Gatos e, portanto, a população estudantil vivia e frequentava aqueles dois quarteirões da Rua Direita.
A Escola Industrial era onde é hoje o Instituto Português da Juventude?
Era onde é hoje o IPJ, exactamente, e era, exactamente, aí que eu vivia em frente àquela viela que vai para a antiga Praça do Mercado. Sempre foi aí a minha casa. Depois, era na Rua Direita que se localizavam todas as livrarias e papelarias da cidade e, portanto, era onde todos os estudantes confluíam. Havia a livraria do senhor Mário Péricles, junto da viela que hoje se chama a viela do senhor José Machado. Dizem-me que eu aprendi a andar no balcão, da livraria do senhor Mário Péricles. Era a livraria da viúva do Geral da Assunção, em frente à minha casa, onde é hoje a casa do Benfica; um bocadinho mais abaixo a gráfica Transmontana e já na entrada para a viela que vai para a antiga Escola Industrial, portanto para a Rua dos Gatos, era ainda uma outra livraria de um senhor simpatiquíssimo que como era conhecido cá por Antoninho testa a arder e era, efectivamente, ali, o núcleo da vivência da juventude e da população escolar, e toda a gente se conhecia naquele grande ponto de encontro e por isso a minha vida, enquanto na escola primária, vinha de manhã para a escola da estação, a escola da estação era já praticamente fora da cidade, já era uma longa caminhada…
Com que sentimento encara a perda de todos esses itens de que falou, existentes na Rua Direita?
Eu encaro com um sentimento de alguma nostalgia, mas encaro também com um sentimento de acompanhar as realidades da evolução do mundo e das cidades. Acho que apesar de tudo há condições para fazer viver os centros das cidades, os centros históricos que hoje estão bastante desertificados e essas condições passam por variadíssimas iniciativas. Ainda não perdi a esperança de que havemos de ver, com resolução de várias questões que têm sido inibidoras, refluir população aos antigos centros de maior animação, porque à semelhança do que se tem passado noutras cidades por essa Europa fora, uma reconstrução de qualidade tem transformado essas zonas em zonas residenciais de muito bom nível.
Pensa que na Rua Direita se poderá fazer o mesmo, visto que aquelas casas estão em ruínas, praticamente?
Penso que se poderá fazer e que se virá a fazer mas, como me fez a pergunta sobre as minhas memórias de infância, eu não queria deixar de lhe dizer, enfim… porque é uma nota que eu não posso deixar de sublinhar. Como lhe disse, frequentava a escola da estação na instrução primária e tinha como professora a dona Beatriz Monteiro que marcou muita gente, em termos positivos, para toda a vida e, ainda hoje, quando encontro colegas meus dessa altura, as nossas memórias são muito positivas. Eu tenho dúvidas de que hoje aconteça o mesmo com as populações estudantis, porque as condições são diferentes, há mais autonomia, mais independência e a nossa independência adquirida da nossa professora primária que, quando era preciso, não hesitava em utilizar alguns métodos, todos lhe agradecíamos ou hoje lhe agradecemos, e que hoje são banidos e com excesso de banimento do meu ponto de vista.
Era mais rígido o ensino?
Havia muita disciplina e muito carinho.
De que forma é que o facto de ter nascido nesta cidade, nesta região o marcou ao longo da sua vida?
Eu acho que me marcou muito profundamente. Eu sempre me considerei, desde que comecei a minha vida profissional, nos primeiros tempos tive que ter uma adaptação de forte conquista do meu espaço em termos profissionais. Isso durou três ou quatro anos e portanto nessa altura não vinha muito a Bragança, vinha três ou quatro vezes por ano, na Páscoa, no Natal, os meus pais estavam cá, mas nessa altura não vinha muito. Depois o meu sentimento de raízes transmontanas e que esteve sempre presente, levou-me a que me considerasse sempre e tivesse considerado um emigrante em Lisboa. Sempre trabalhei m Lisboa, mas sempre me considerei um emigrante em Lisboa, e durante anos e anos apesar das condições de deslocação serem muito piores do que hoje eu vinha a Bragança praticamente todos os fins-de-semana. Foi cerca de 1984, há sensivelmente vinte anos, a minha mulher veio trabalhar para Bragança porque tinha feito o mestrado em Bóston, e esse mestrado foi feito com a condição de vir para Bragança para a Escola Superior de Educação, que então tinha aberto.
Ficou uns catorze anos, também porque o meu filho veio para cá para a escola primária e nunca mais se quis ir embora, adoptou a cidade como sua, embrenhou-se em todas as actividades que aqui havia, era jogador de hóquei no Académico e a mim restava-me vir cá, e, para vir o que é que eu fazia: era muito difícil vir naquela altura, as estradas eram difíceis, aluguei uma garagem em Celorico da Beira, vinha de comboio de Lisboa até Celorico da Beira, pegava no carro tirava-o da garagem vinha para Bragança à sexta à noite e no Domingo à noite fazia o contrário. E foi assim que de facto durante esses anos todos, fiz esta ligação e não estou nada arrependido de o ter feito mas, deixe-me só dar-lhe mais uma nota relativamente a esta questão das vivências de juventude e das ligações à cidade e à maneira como aqui se vivia. Eu, como lhe disse, vivia na Rua Direita, a minha mãe era farmacêutica e tinha uma farmácia na Rua Direita, naquela esquina com a viela do Zé Machado e o meu pai era notário e tinha o escritório do outro lado da rua mas, na farmácia… as farmácias não eram bem como são hoje, eram um bocado centros de convívio e havia outras cá em Bragança do mesmo tipo, a farmácia Mariano na Praça da Sé era exactamente a mesma coisa, tinha uma entrada e depois tinha bancos, uns bancos corridos onde as pessoas se sentavam e sentavam-se os clientes e conversavam e contavam as suas mágoas e eram ajudados mas, também se faziam tertúlias; e na farmácia da minha mãe havia uma tertúlia giríssima com personagens daqui da cidade: o Dr. Raul Teixeira, por exemplo, antigo director do museu e um companheiro predilecto do Abade de Baçal, era um dos membros dessa tertúlia, o coronel Teófilo de Morais, o Dr. Sá Alves e era claramente um sítio onde, para além de se discutirem as coisas da cidade, e era uma má-língua, não sei se sim se não, era provável que sim, também havia uma vivência politica de discussão daquilo que eram os temas actuais e eu vivia com grande interesse sem poder participar porque ninguém me dava confiança para isso nessa altura, mas vivia aquilo que ali se ia passando e isso ajudou-me a perceber o mundo e ajudou-me a saber dar valor ao que é uma memória que sirva para validar as nossas atitudes na vida.
Respondendo à sua pergunta de que maneira as minhas raízes me influenciaram eu não podia deixar de fazer esta menção porque penso que esse período foi de facto um período decisivo na formação do meu carácter, com certeza, com defeitos, uma virtude ou outra, mas que me ajudou muito ao longo da vida.
Frequentou o antigo Liceu Nacional, a actual Escola Emídio Garcia, mas, não concluiu o ensino secundário. A mudança para Santo Tirso foi já uma preparação para a Universidade?
A minha educação era bastante rígida, eu era um óptimo aluno. Lembro-me que recebi um prémio, quem mo deu foi o Reitor da altura que era o Dr. Carrapatoso, e tive 20 a matemática. Eu era de facto um bom aluno mas, em contrapartida, na área das letras, não era assim tão brilhante e lembro-me que uma vez em minha casa houve um drama porque, de facto, havia uma grande exigência, fiz o exame com uma senhora que era professora célebre em Bragança, a Dr.ª Alice de português e tive doze e foi um drama mas, isto para dizer que não sei se terá havido alguma dúvida relativamente à aproximação de uma fase de adolescência, de transição para a idade mais adulta e de preparação para ir para a Universidade e também tenho a impressão que naquela altura era um bocado moda. Não sei, como hoje já se fala muito do ensino público e do ensino privado, se terá havido algum resquício nessa altura, e os meus pais tomaram a decisão de me mandar, no sexto ano do liceu, para Santo Tirso e foi a única razão, já na fase de conclusão. Eu não tenho dúvida nenhuma que, se tivesse ficado cá, teria feito da mesma maneira não tenho dúvidas quanto a isso. Eu estava habituado a uma vida familiar. O deixar de ter essa vida familiar todos os dias, porque naquela altura, mesmo sendo relativamente perto, eu só vinha a casa no Natal e na Páscoa e, até me lembro que me causava muita impressão todos os alunos receberem visitas dos pais, porque era frequentado, principalmente, por pessoas da zona do Porto, mas havia outros: alentejanos, etc., que como eu ficávamos ao fim-de-semana sem visitas de ninguém e lá vínhamos na Páscoa e no Natal e nas férias grandes, nada mais do que isso, o resto era, efectivamente, a estadia ali. A mim custou-me no princípio, depois, habituei-me. Nesses anos também já não era aquela vida de internato, de camarata… como éramos mais velhos tínhamos quartos individuais, o sexto e o sétimo ano tínhamos quartos individuais. De maneira que, enfim, era um misto de alguma autonomia que terminava em não poder sair dos muros. E eu julgo que não terá sido negativo.
A sua vida profissional está, obviamente, ligada à sua formação académica. Tem desenvolvido uma actividade multifacetada a nível profissional. Fale-nos do seu percurso.
O meu percurso… Formei-me e fui inscrever-me, por indicação de um amigo, que me disse que estavam a admitir engenheiros mecânicos numa grande empresa da altura, Construções Metalomecânicas MAGE, que fazia principalmente guindastes, não guindastes de construção civil, guindastes de construção naval, e centrais termoeléctricas e hidroeléctricas. Comecei pelo estirador como projectista, acho que estive no estirador uns três ou quatro meses e depois entregaram-me a assessoria na condução de uma grande obra em Lourenço Marques , a central térmica de Lourenço Marques. Eu, rapidamente, por um conjunto de circunstâncias e porque era uma altura que havia muito trabalho, caiu-me na mão, apesar de ser relativamente inexperiente, o ser o coordenador desse grande contrato em Lourenço marques. As coisas correram-me bem e eu talvez me tenha esforçado para isso e diverti-me muito porque ia muitas vezes a Lourenço Marques e vivia-se muito bem naquela altura em Moçambique, com certeza, com problemas que eu não sentia, porque não era vítima dos preconceitos que existiam do ponto de vista racial, mas, confesso que eu não os sentia porque estava do outro lado. As coisas correram-me bem e quando regressei tive a minha primeira posição de chefia como responsável dessa área de centrais térmicas isto, ao fim dos dois anos e meio que tinha levado a fazer aquele contrato. Rapidamente, a partir daí, como dedicava, e sempre tive grande interesse pela área económica, dedicava-me aos aspectos de gestão, de economicidade dos contratos e de negociação, tinha facilidade nos contratos internacionais, falava línguas, fazia conhecimentos com alguma facilidade e era aceite pelos interlocutores. Rapidamente percorri a escala de director comercial, depois fui o director geral da empresa, que era uma empresa com 2500 pessoas e depois integrei a administração.
Houve um conjunto de mudanças no país e na organização empresarial que levaram a que essa empresa, que tinha uma óptima condição financeira e económica viesse a tomar o controlo de outras grandes empresas no país. Mesmo ao pé de nós, e uma das obras a que eu estive ligado, foi a barragem do Pocinho por exemplo, assim como a de Baleira. Mas, dizia-lhe eu, tomou posições de controlo noutras empresas, uma das quais, das mais relevantes no sector da indústria, a Sorefama, de que fui presidente alguns anos. Essa dedicava-se a material ferroviário, basicamente, comboios e equipamento para barragens e nessa altura em que fui presidente da Sorefama, deixe-me só contar-lhe um pequeno episódio que ilustra um bocado a maneira como eu sempre encarei estas coisas: a Sorefama era o grande competidor da minha empresa e foi comprada por nós e punha-se a questão: como é que agora vamos mandar lá? E então sugeriam-me que arranjasse uma equipa para ir para lá e eu acabei por dizer: não arranjei equipa nenhuma… no dia em que isso acontecer, no dia seguinte, às oito da manhã, vou para lá. Eu sou o presidente e vou dizer aquela gente que quero trabalhar com eles; que de fora só vou eu. E foi assim, foi bem. Não é muito habitual ser assim. Podia ter corrido mal mas, correu bem. Talvez tenha sido alguma componente, se calhar de algum auto convencimento, mas não deu mau resultado.
Depois houve várias transformações. Estas actividades industriais acabaram por ser, como aconteceu com outras coisas, compradas por estrangeiros e o resultado dessas vendas, o grupo empresarial em que eu estava inserido e tenho estado sempre, tinha já outros interesses e entrou noutras áreas nomeadamente no turismo. Eu fui Vice-presidente dos hotéis Tivoli que é a maior cadeia portuguesa, durante vários anos, na área imobiliária e na área financeira e, portanto, a partir dai passei, digamos, a funcionar em termos profissionais, como responsável de uma holding de investimentos que actuou e tem actuado nos mais diversos campos.
Felizmente, de facto, não me posso queixar do meu trajecto profissional e tive a sorte de ter sucesso, podia não ter tido sendo exactamente a mesma pessoa que sou e é bom que as pessoas não se convençam das suas capacidades de forma exagerada. Acho que sendo exactamente a mesma pessoa que sou hoje, com a capacidade que tenho, muita ou pouca, o que me correu muito bem podia ter-me corrido menos bem, e não deixava de ter menos valor por isso, ou de ser visto de maneira diferente por isso, porque na vida e, principalmente, nos negócios o sucesso e o insucesso, a fronteira entre eles é ténue e são as circunstancias, são os momentos que fazem as situações penderem para um lado ou para o outro.
Depois do que nos contou, chegamos à conclusão que também é uma pessoa que se relaciona facilmente com os outros, que é um bom relações públicas. Talvez por isso não se ficou pela actividade profissional e foi também para o campo da política. Fale-nos dessa experiência.
Eu sempre tive interesse pelas preocupações da sociedade civil e de uma forma limitada, há muitos anos, tenho uma presença na Assembleia Municipal de Bragança mas que, obviamente, não me ocupava muito tempo, nem era de dedicação prioritária, embora fosse de interesse prioritário e sempre procurei dar o meu contributo. Sempre tinha dito e, porque levei sempre uma vida muito activa, muito cansativa, que quando chegasse aos sessenta anos ia parar. Isso era uma coisa que eu dizia desde os cinquenta e cinco: Eu, quando chegar aos sessenta anos, vou parar. E aproximava-me dos sessenta anos… não foi bem aos sessenta anos… como costumo dizer, tinha duas alternativas ou ia jogar golf e poderia fazê-lo, porque tinha atingido a minha independência económica e a realização profissional, tinha uma vida familiar estável, tinha todas as condições para isso, era uma alternativa, quando digo jogar golf é o jogar golf e todo o resto de actividades que fazem parte dessa panóplia, ou então, e porque há muito tempo me desafiavam para ter uma participação política, aceitar um envolvimento nessa área. Eu hesitei muito porque, eu não sabia muito bem como é que era mas…
Hesitou entre o golf e a política?
Hesitei muito em aceitar o envolver-me na actividade política mas, achei que poderia ser útil à minha terra e foi por isso que, numa altura em que efectivamente já estava a abrandar a minha actividade profissional, e venho sucessivamente abrandando, eu poderia conciliar de alguma maneira e pondo um bocado mais de lado a parte profissional, essa actividade como uma intervenção política e foi, na base de um convencimento pessoal de que poderia ter uma intervenção útil, que os meus conhecimentos pessoais poderiam ser úteis no desenvolvimento da minha terra, que aceitei, efectivamente, ter uma participação politica.
Foi deputado na Assembleia de República e foi Presidente da Comissão de Obras Públicas. Nessas funções fez o levantamento das necessidades rodoviárias da região. Sente que o seu trabalho foi valorizado.
Essa pergunta é difícil. Não sou eu a pessoa indicada para lhe responder se foi valorizado ou não foi. Eu acho que de alguma maneira dei uma contribuição para ajudar a identificar quais são os problemas e alguns caminhos para os resolver mas, para ajudar a identificar uma situação que me parece de um importância extrema Num ambiente e numa vivência em que a opinião pública é bombardeada constantemente com afirmações de grandes preocupações de equilíbrio no conjunto do país, de tomada de medidas para atenuar as assimetrias de desenvolvimento, de intenções de discriminação positiva para ajudar a desenvolver o interior em oposição ao litoral que se desenvolve por si. Porque há uma situação em que a economia e a sociedade… é um facto, que a actividade atrai a actividade, a riqueza atrai a riqueza; o desenvolvimento provoca o desenvolvimento e, se não se corrige esta tendência é evidente, que o que acontece é que as zonas mais desenvolvidas desenvolvem-se cada vez mais e as menos desenvolvidas ficam cada vez mais longe das mais desenvolvidas.
Eu tenho sempre insistido em que é vital que haja, nas políticas que têm sido seguidas, uma transformação porque, efectivamente, e os factos mostram que aquilo, as intenções de dizer, vamos fazer a correcção das assimetrias, fazer discriminação positiva do interior, o que na realidade se passa é exactamente o oposto porque as pressões populacionais; as pressões políticas; as pressões dos votos são de tal maneira fortes que não tem havido coragem para fazer face a isso e fazer o que é justo e não fazendo o que é justo o que tem acontecido é que os investimentos estão concentrados no litoral e nos grandes centros, nomeadamente no litoral e nas grandes áreas metropolitanas. E como Portugal é um país limitado, e vai sê-lo sempre mesmo que esteja numa época de desenvolvimento, aquilo que sobra para investir no interior é marginal, e enquanto isto não for invertido e o invertê-lo é uma questão de justiça e de equidade não vale a pena continuar a falar de correcções de assimetrias mas, também, não é esperável que as populações se conformem em terem tratados, aquilo a que eu costumo chamar os seus direitos de dignidade que são a saúde, a educação, a assistência na velhice e reconheço que têm sido feitas coisas muito positivas nestas áreas, mas aquilo que são as condições para um desenvolvimento efectivo e para poder ombrear as zonas que são mais desenvolvidas, muito pouco tem sido feito.
Comente de uma forma breve. Foi anunciado pelo primeiro-ministro uma auto-estrada que ligará Bragança ou Quintanilha até à A4 Amarante e daí surgiram declarações de alguns Presidentes de Câmara do distrito que achariam melhor fazer-se inicialmente IP5 e IP2 do que uma auto-estrada que ligaria o Porto a Bragança. Qual a sua opinião disto?
Acho que o tema é suficientemente importante para eu utilizar, com ele, algum tempo. As principais prioridades no distrito de Bragança, a rede de IPs e ICs e fazer as ligações das sedes de concelho a essas redes de IPs e ICs. Eu tive oportunidade, ainda recentemente, de demonstrar nos últimos seis anos e digo os últimos seis anos à vontade que é para ser em termos políticos, igual para todos os lados, nos últimos seis anos no que diz respeito a IPs e ICs , foram construídos por ano, uma média de sete quilómetros e meio e investidos quinze milhões de euros. Se continuássemos a este ritmo para estarem o IC5 e o IP2 prontos, demoraria entre vinte a trinta anos, isto dá uma nota clara de que não pode ser, isto é completamente insustentável e, portanto, acho que em termos de desenvolvimento harmónico a conclusão rápida desta malha IP4, IP2, IC5, quando digo IP2 digo com ligação a Rias Baixas, porque naturalmente se o princípio de desenvolvimento é o acesso a centros populacionais importantes e a centros industriais importantes, os centos populacionais importantes e os centros industriais importantes para o distrito de Bragança e, principalmente, para esta zona são a Galiza e as Astúrias e a Cantábria e o País Basco e as ligações internacionais e, portanto, isso tem que estar incluído mas, dizia eu, isso é uma prioridade. No entanto, acho positiva a construção da auto-estrada, porque sendo ela uma auto-estrada com portagens como devem ser todas e isso é outra questão, com certeza não vamos entrar por aí, mas eu defendi isso e tenho defendido sempre como devem ser, ela não vai ter pressão sobre o orçamento de Estado e não tendo pressão sobre o orçamento de Estado é evidente que não pode servir de desculpa para que as outras rede de IPs e ICs não sejam feitos com toda a rapidez. Aliás, se olharmos bem para os níveis de sinistralidade que têm acontecido no IP4, vemos que o tráfego já é relativamente intenso.
Já é justificável…
Eu não sei exactamente se só pelo tráfego, hoje mas, com o tempo que demora a fazer é, com certeza. O nível de sinistralidade e, dado que ela tem funcionamentos de risco que são importantes, acho uma medida positiva e, tanto mais positiva, quanto ela não vai efectivamente influenciar aquilo que será feito no resto da rede.
Continuando no Governo e na política… O governo insiste na ideia de uma só Universidade para esta região, a UTAD, a Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, ou o nome é um equívoco?
Eu não sei se o nome é um equívoco. A UTAD é uma instituição universitária sedimentada, com participações importantes em várias áreas, daquilo que eu conheço e até com bons níveis de ligação a actividades da sociedade civil e que levam a que seja efectivamente uma entidade de grande relevância no conjunto de Trás-os-Montes.
E o que pensa da passagem do Instituto Politécnico a Universidade?
Eu não gostaria de responder à sua pergunta directamente mas, gostaria, sobre essa matéria, de lhe dizer o seguinte: Penso que esta área do Nordeste Transmontano e todas as potencialidades que tem, muito tem a ganhar e seria do meu ponto de vista muitíssimo importante se houvesse em Bragança uma instituição de ensino universitário de grande qualidade e sublinho três vezes isto, que sirva de condutor para o conjunto do meio e da população em que se insira e que tenha, com certeza, uma componente de alguma especialização que a diferencie das outras, mas que tenha, também, uma componente com um aspecto que me parece essencial para o desenvolvimento desta região, que é a componente da cultura e do incentivo do espírito empresarial.
Nós temos, relativamente a outras regiões, há que o reconhecer, um défice de espírito empreendedor, por aquilo de que há bocado falámos, o empreendedorismo acontece onde já o há porque se cria essa cultura; criam-se esses hábitos; criam-se essas ligações e há casos no estrangeiro onde, efectivamente, há instituições que têm estes objectivos muito expressos e eu penso que, essa existência de uma entidade com essas características e muito embrenhada na sociedade civil e que sirva de motor e de exemplo respeitado, que seria muito positivo para a nossa região.
Podemos pensar num futuro risonho para o Nordeste Transmontano?
Eu acho que o Nordeste Transmontano tem muitas possibilidades, e tem muitas possibilidades desde logo, porque é uma região relativamente preservada. A exigência das pessoas vai, cada vez mais, nesse sentido: querer viver em sítios preservados. Por outro lado, já há centros urbanos com uma muito razoável qualidade de vida. Bragança é um caso que está à vista, que se mete pelos olhos dentro. As transformações que tem e a qualidade que, em grande parte, o tecido urbano tem, penso que uma vez ultrapassados aqueles constrangimentos das acessibilidades de que já falamos hoje e outros que continuam a existir, se houver uma discriminação, efectivamente, positiva e, dado que o desenvolvimento, hoje, muito mais que os recursos naturais, são recursos humanos qualificados, é qualidade de vida, é a atractibilidade ao investimento… acho que há condições se se ultrapassarem os constrangimentos que existem. Não tem havido políticas efectivas de discriminação positiva que contrariem a tendência de desertificação mas, mesmo assim, acho que tem futuro.
Acho que um exemplo que mostra isso é o sucesso que está a ter o aproveitamento turístico do Douro e, acho que, e sempre defendi isso, já há uns anos defendo isso, a extrapolação do que é a actividade turística para o conjunto da outra área do nordeste, não é difícil de fazer e que há uma lógica para o fazer, é preciso resolver, mais uma vez, problemas de acessibilidade rápidas e é preciso resolver problemas ambientais, valorizar ainda mais aquilo que existe de natureza de forma a haver uma oferta diferente. Hoje a oferta do sol e praia está a decair internacionalmente. O que é procurado é outro tipo de ofertas. O turismo é uma área óptima, os serviços também, em que a distancia já não representa grande obstáculo e as actividades económicas ligadas à energia e ao ambiente… julgo que existe aqui um terreno fértil e uma possibilidade de localização que pode ser até privilegiada.
Agora para terminar. Que personalidade ou personalidades mais o marcaram ao longo da sua vida?
Essa pergunta é difícil. Com certeza, antes de mais nada, os meus pais. Depois a minha professora primária, depois… vou-lhe dar um nome que, se calhar, causa alguma surpresa mas, de facto, porque é uma pessoa por quem eu tenho um carinho extremo e que acho que foi uma grande personalidade no distrito de Bragança, foi o Bispo Dom Abílio Augusto Vaz das Neves. Agora tinha que continuar, porque estes já são do passado. Fazer uma triagem e, com certeza, que iria, em cada período de cinco anos, encontrar uma pessoa. Marcou-me muito o meu primeiro empregador, que foi o senhor engenheiro Moniz da Maia, uma personalidade excepcional em Portugal, que foi o maior empresário na área da metalomecânica, foi o maior empresário na área da construção civil, grandes empresas como a SOMAGUE, foram feitas por ele e, a certa altura, quis demonstrar ao professor Salazar que se podia fazer e ganhar dinheiro a fazer agricultura em Portugal e transformou-se no maior agricultor português da altura. Efectivamente, era uma pessoa excepcional e marcou-me muito, principalmente a cultura que instalou, não tanto a ligação directa, que não era muito frequente, porque eu era muito novo na altura em que ele viveu, eu era muito novo na actividade.
Há, com certeza, muitas outras pessoas que têm tido influência mas, enfim, as minhas referências são mais no passado do que actualmente e eu sou um bocado um leitor compulsivo, enfim tenho sempre dois ou três livros em cima da mesinha de cabeceira, porque os vou misturando que é para não estar muito preso só a um tema e agora estou cheio de vontade de ler um livro que foi republicado mas que eu ainda não tenho, que são “As farpas” do Eça de Queirós e do Ramalho Urtigão, reescritas e coordenadas pela Dr.ª Maria Filomena Mónica porque acho que essas “farpas” vão-me dar razão a que as referências que me marcam são mais do passado do que do presente.
Foi com muito agrado que li esta entrevista, ficando a saber o trajeto profisional do nosso Ziza,que eu já não via desde o 6º Ano, pois no ano seguinte fui para Vila Real. Eu e a Mitó, devemos-te a gentileza de nos falares de todo o programa de História do 4ºAno na véspera do exame de 5ºAno, que em ti estava muito presente. A Zézinha,a nossa jóia como amiga, teve muitos problemas com a Mãe (Drª Alice de quem tu falas).Eu e a Mitó, encontramo-nos em Luanda nos anos de 1960, e agora cá nos vamos vendo na Farmácia. Sempre que vinha a Bragança, visitava a tua Mãe, a última vez já na rua do Sabor com a Tia. O Balé nunca mais vi. O teu irmão mais novo, que nasceu quando eu e a Mitó frequentavamos o 1º ano do Liceu, apenas estive uma vez no consultório com a Mãe de um colega de quem era muito amigo. Foi um prazer encontrar-te.
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