Convento de Balsamão já acolheu cerca de 140 refugiados e migrantes de várias partes do mundo, sendo uma ponte para uma vida melhor
As curvas e contracurvas para conseguir chegar ao topo Convento de Balsamão, no concelho de Macedo de Cavaleiros, podem simbolizar o caminho vertiginoso de quem agora ali mora. São cerca de 40 refugiados e migrantes que se viram obrigados a deixar o seu país à procura de uma vida melhor ou até para fugir à guerra. Tudo começou em Abril de 2022, quando o convento abriu portas para acolher um grupo de refugiados. O padre Eduardo Novo, diretor do espaço, estendeu os braços àquele que depois se veio a tornar uma estrutura de acolhimento temporário. Já passaram por ali cerca de 140 pessoas de várias partes do mundo, como Nigéria, Marrocos, Nepal, Índia, Argélia, Paquistão, Bangladesh. Ali já chegou a nascer um bebé, de uma família que é agora independente, mas que não esquece a ajuda. O Convento de Balsamão pode ser assim visto como um ponto de viragem na vida de muitos, como é o caso de Adeleke Abesin. É um dos refugiados que vive na estrutura. Tem 29 anos e é da Nigéria. No entanto, estava a estudar na Ucrânia quando o país entrou em guerra e foi obrigado a abandoná-lo. Conta que antes de chegar a Portugal, há seis meses, ainda esteve na Polónia. Com os amigos chegou a Balsamão, onde continua a ter aulas online para acabar o curso de Medicina. "O futuro aqui parece-me bem. Estou a estudar medicina e agora aguardo para fazer o exame final", disse. O objectivo é ficar por Portugal, onde quer ser médico. Aqui disse ter encontrado pessoas "muito boas" e comida também. Comunica com os restantes em inglês, embora um pouco difícil de entender, mas já sabe dizer algumas palavras em português, como "obrigada" e "comida". Já Lúcia Alves é migrante. Natural de Timor-Leste, veio com o marido à procura de uma vida melhor. "Vim para Portugal porque preciso de arranjar trabalho para sustentar a minha família", contou. Tem 23 anos e um problema de saúde impossibilita- -a de trabalhar, uma vez que está a fazer um tratamento. Ainda assim, realçou estar a gostar de viver no convento. "Estou muito contente e tenho muito orgulho, porque eu aprendo muito aqui. Aprendi a fazer comida portuguesa, aprendi português e história de Portugal", disse. Já vive ali há oito meses e confessa que é difícil não ter emprego, mas comida "não falta" e Balsamão também já é a sua "casa".
Acolhimento,
integração e independência
O Padre Eduardo Novo explicou que o processo de acolhimento
passa por várias fazes, desde o receber, proporcionando "bem-estar",
"carinho" e "afecto", à oferta de formação, na
"execução das tarefas, responsabilização e compromisso", mas também
na aprendizagem do português e depois na procura de emprego e no acompanhamento
depois de saírem dali. "Tem sido uma experiência muito interessante,
sobretudo de dar oportunidade, de ajudar a transformar vidas, vidas que vêm à
procura de melhores condições de vida e que nós aqui queremos ser este foco,
que possamos ajudar a acolher", frisou. Por ali passam pessoas de
diferentes países e, inevitavelmente, também diferentes culturas e religiões.
Sendo ministro da Igreja Católica, Eduardo Novo admitiu que o contacto com
diferentes religiões é "interessantíssimo". "É interessante este
conjugar de vidas, com o mesmo olhar, de felicidade, que todos buscamos e é
isso que Deus quer. Temos acolhido desde muçulmanos, a hindus, a cristãos.
Obviamente que há diferenças culturais que se manifestam. Temos também essa
sensibilidade. Por exemplo, um hindu não como carne de vaca às terças-feiras,
um muçulmano não come porco, portanto, houve também a necessidade de nos
adaptarmos a estas realidades", contou, acrescentando que a adaptação foi
fácil e que a missão é formar "uma só família", para um "mundo
cada vez melhor". Mas nem tudo é perfeito. Uma das grandes dificuldades é
a comunicação. Poucos ou nenhuns sabem falar português, por isso, o inglês e o
francês são a salvação. Ainda assim, aos poucos vão aprendendo a língua de
Camões, uma vez que têm aulas de português todos os dias, mas também de
História e Geografia. A coordenadora desta estrutura temporária
de acolhimento reconhece que todos os dias é um "desafio constante",
até porque ali se cruzam pessoas de variadíssimas culturas. Além do obstáculo
da língua, Susana Magalhães conta que nem sempre é fácil "educar e formar
pessoas" adultas. As regras são transmitidas "repetidamente". A
responsável contou que muitos não sabiam usar os talheres, nem fazer a cama.
Coisas básicas na cultura portuguesa, que são difíceis de assimilar para quem
vem de fora. "Não sabiam usar um aspirador, não sabiam que o detergente da
louça é diferente do que usa para limpar o pó, também não sabiam como fazer uma
cama", disse. Outro dos problemas passa pela saúde. Susana Magalhães
adiantou que há problemas de saúde oral, falta de vacinas e uso indevido de
medicamento. A documentação é também um entrave. "Para os refugiados a
documentação é muito ágil, a tramitação é muito mais fácil, mas nos migrantes
tem sido um sacrifício enorme, porque os agendamentos com o antigo SEF estão
super atrasados, há documentação que não chega", adiantou. A juntar-se a
todas estas dificuldades está a de arranjar emprego. "É muito difícil
arranjar trabalho para estas pessoas, pelo estigma que já se tem. Tivemos o
caso de dois jovens marroquinos que tentaram encontrar em Bragança uma casa e
pediram-lhe seis meses de caução. Isto significa que as pessoas não querem
alugar a imigrantes". Assim, está já na calha um projeto para a criação de
uma empresa que dê trabalho remunerado a estas pessoas, por exemplo, na limpeza
das ruas ou até na criação de uma gelataria no Azibo.
Jornalista: Ângela Pais
Retirado
de: www.jornalnordeste.com
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