quinta-feira, 21 de julho de 2011

Entrevista com Augusto J. Monteiro

Não posso deixar de começar por aqui, na sequência da sua opinião sobre o III Congresso de Trás-os-Montes, publicada na revista Brigantia, “vai-se à terra à procura do osso que aí deixamos guardado, enterrado”. Neste reino que será talvez maravilho que osso vem procurar sempre que a Bragança se desloca?

Antes de responder à sua pergunta, queria deixar um grande abraço para o Marcolino Cepeda e para a Mara, a companheira dos trabalhos e dos dias. Eles são bem a alma pater e a alma mater de todas estas iniciativas.

Quanto ao osso de que fala, a expressão não é minha. É, segundo penso, do escritor Lobo Antunes. De facto venho à procura do osso que deixei enterrado. Um osso que pode ter uma semântica riquíssima, que pode ter significados vários, é um osso apelativo. Vem-se aqui à procura dos amigos, à procura de vivências, à procura de recordações… 


É como uma busca de sentimentos perdidos?

Vem-se à procura de momentos, de um cheiro, de um sabor... Vem-se à procura das raízes, das origens. Jorge Luís Borges dizia que é um mau costume ter pátria, mas que é um costume necessário. Se onde se lê pátria lermos mátria, a expressão faz mais sentido. É que a terra onde nascemos acaba por ser o ninho mátrio, em especial, quando as recordações são boas (porque há quem as não tenha...)


E mais tarde vai querer voltar? 

Costumo dizer que quero passar aqui o resto da eternidade. Depois de me reformar (estou praticamente às portas da reforma) penso regressar. Pelo menos vir mais e com mais tempo... 


De que forma e o facto de ter nascido nesta cidade ou nesta região o marcou? 

Marcou-me muito. Talvez venha a propósito lembrar que ocorre uma homenagem, em Moncorvo e no Felgar, ao Afonso Praça, um homem com um roteiro de vida notável: jornalista e escritor. Quando as pessoas lhe diziam que era do norte, ele retorquia: “Eu não sou do norte, sou transmontano”. Marcou-me esta terra com todas as suas circunstâncias. Ainda bem que me calhou esta. Não é perfeita, mas é a minha. Marcaram-me estas gentes e marcou-me a ruralidade de toda esta região. Acresce que fiz a escola primária numa aldeia perto de Bragança. Sou ainda do tempo em que era muito marcante uma rica civilização da oralidade: as pessoas viviam muito do ouvir dizer e do ver fazer. Aliás, algumas das coisas que escrevo tem que ver com a aprendizagem que fiz nessa civilização da oralidade. Marcou-me esta Bragança, ainda harmoniosa, dos anos 50 e dos anos 60, que era uma cidade sonolenta e pacata, com facetas rurais. Dava a impressão de que as muralhas, que cercavam a vila, tinham vindo por ali abaixo e que cercavam toda a urbe. Era um espaço fechado: pouco entrava e pouco saía... (É a sensação que agora tenho). Mas a cidade acabava por funcionar como um espaço securizante, em que nos sentíamos bem. Gostávamos de nos perder e de nos encontrar na cidade (e nos arredores). Na pequena Bragança, toda a gente se conhecia. Dava-nos a impressão de que as pessoas que aqui viviam tinham um coração muito grande... 

Mas há uma diferença enorme desde que partiu até hoje? 

Há... Mas eu tenho vindo a acompanhar a evolução de Bragança. O seu progresso e o seu crescimento, os seus encantos e os seus desencantos... Venho aqui regularmente. Tenho participado de alguma maneira na vida da cidade. 


Na altura, quando saiu de Bragança, foi para um meio que era maior? 

Fui estudar para Lisboa... 


Foi uma diferença, ou um choque? 

As duas coisas. Foi um grande salto. Não me arrependi: tenho duas terras: tenho especialmente Bragança e tenho Lisboa (onde, agora, vou pouco). Costuma-se dizer que se pode amar uma cidade ou um sítio como se ama uma mulher... O meu amor maior vai para Bragança.
Em relação a Coimbra: estou lá há muitos anos. Gosto muito da cidade, tenho lá grandes amizades, mas nunca criei verdadeiramente raízes; sempre pensei que estava de passagem, mas o certo é que fui ficando... 


Que vivências recorda e o obrigam a escapar, como disse, “ao excesso de outros lugares”? Ao excesso de Coimbra? 

Escrevi, de facto, nesse artigo sobre o III Congresso, que para escapar ao excesso de outros lugares tem que se vir à terra de origem... Agora, à medida que vou para velho e que, como costumo dizer, começo a sofrer de doença do chão (a gente vai-se inclinando natural e progressivamente para a terra), é natural que procure mais a terra onde nasci... Aliás, nunca deixei verdadeiramente Bragança. Estive aqui, de 83 a 87, na instalação da Escola Superior de Educação. Fui-me embora não propriamente porque tivesse algo contra a cidade. Acontece que o projecto que eu tinha idealizado não se tornou exequível (por culpa das instâncias superiores). E surgiu uma proposta de trabalho, na Faculdade de Letras de Coimbra, que me agradou muito... 


Foi uma estadia de três ou quatro anos? 

Foi e foi uma estadia particularmente gratificante... 


Serviu como uma aprendizagem, mais uma? 

É óbvio que serviu como mais uma aprendizagem. Foi um dos poucos momentos em que tive verdadeiramente grandes responsabilidades. Procurei ser o mais responsável e o mais eficiente possível. Mas eu sou essencialmente professor e o que gosto mesmo é de “brincar” aos professores. (Veja a seriedade com que as crianças levam a brincadeira…) Modestamente: acho que é o que sei fazer melhor. De maneira que não há nada, para mim, como brincar aos professores...
Estava eu a dizer que fomos feitos aqui em Bragança... Há muitas recordações, até recordações gastronómicas... que não me parecem ser menos importantes.

  
Essas também são importantes… 

São... Nós fomos feitos no bom salpicão, na boa vitela, no bom presunto e nesses mimos todos. Evidentemente, como alguém dizia, tudo isso tem que ver com os bons sentimentos. Porque as pessoas que não têm estes consolos, dificilmente poderão ter bons sentimentos!.. 


Um dia que a terra o traga de regresso, mesmo que seja na reforma, não vai querer ficar parado, vai sempre trazer a sua experiência… 

Ficar parado, nada fazer, não intervir, é difícil... Embora eu tenha jeito para nada fazer. Considero que as pessoas que têm imaginação e criatividade acabam por ter jeito para não trabalhar. (Recordo que no paraíso não se trabalhava...O mito edénico inclui a ausência de trabalho...) Isto de nada fazer, pode ser “estudar” o jornal no café e conversar com os amigos, que são actividades lúdicas importantes... Se não me estragar da cabeça, há muita coisa que gostaria de fazer, nomeadamente no domínio da criação. É um tique que tenho. Não sou propriamente obcecado pela criação, mas tenho alguma necessidade de ir pensando e, sobretudo, de ir escrevendo. 


Mas há sempre outro tipo de vivências, que trazemos de outros sítios, que podem ser úteis quando nos deslocamos para a nossa terra… 

É óbvio. O facto de ter estado muitos anos fora, provoca um certo distanciamento que, bem aproveitado, dá jeito para uma análise um pouco mais lúcida, um pouco mais distanciada. Contudo, devo dizer que me irritam as pessoas que estão fora, e que pouco ou nada ligam à cidade... mas depois, quando chegam aqui, em visita turística, vêm cheias de ideias, dizem muitas coisas e dão muitos palpites... Entendamo-nos: os problemas da cidade e da região têm que ser resolvidos, fundamentalmente e essencialmente, pelas pessoas que aqui estão e que aqui vivem... 


Tem a nível da escrita desenvolvido grande actividade em diversas áreas desde a ficção à investigação, passando pela pedagogia. Como investigador é autor de vários trabalhos sobre o património histórico e arquitectónico de Bragança, por exemplo, o castelo, a domus e que mais? Que outros trabalhos? 

Num artigo intitulado Por Bragança: no reino do património, escrito em 85, já fazia algumas propostas que acabaram por ser concretizadas. Nalguns casos, felizmente, até se foi mais longe. Noutros, provavelmente, foi-se longe de mais. Em relação a Bragança, tenho algumas coisas no domínio da ficção. Escrevi há pouco tempo uns contos que intitulei “Contos baldios”. Foram publicados na obra “Contos de pousar”.  Estou na companhia de alguns bons escritores, nomeadamente da Inês Pedrosa. São contos que têm que ver com a realidade – os factos e as pessoas são reais -, sobretudo com a realidade rural. É uma espécie de homenagem a este povo anónimo que foi fazendo estes mundos e estas paisagens belíssimas e harmoniosas que ainda hoje em dia podemos desfrutar... (Não será, provavelmente, por muito tempo). 


Engraçado que quando se escreve qualquer coisa, volta-se sempre à terra…

Nalguns casos volta-se, noutros não. Pessoalmente, é com grande prazer que volto às raízes. Esses contos têm que ver com a Lombada, onde há ainda grandes conversadores, conversadores superlativos, encantadores de palavras. Como noutros meios rurais...  Uma das histórias, “A árvore dos espanhóis” é um pouco sombria... Há uma amoreira que vive num cemitério de uma aldeia; chama-se a árvore dos espanhóis, porque acabou por sugar a carne de alguns republicanos que, na guerra civil de Espanha, fugiram para estas terras para tentar salvar a vida. Alguns desses, que acabaram por ser assassinados pelas autoridades portuguesas - numa conivência sórdida e facinorosa entre Salazar e Franco -, foram enterrados à sombra da amoreira...


Acha que o desenvolvimento e que o crescimento da região vai levar ao desaparecimento daquilo que era verdadeiramente natural? 

Paisagens verdadeiramente naturais não existem. Esta paisagem harmoniosa (falo neste caso da da Terra Fria), o melhor que temos para ofertar, é profundamente humanizada. É fruto de muita história e do trabalho de muitos homens. O que acontece é que o despovoamento acarreta inevitavelmente o fim destas construções harmoniosas. Se não há homens, a paisagem não pode continuar a ser mantida... Provavelmente, se se criassem mais e melhores condições às pessoas, elas continuariam a viver nos meios rurais e as paisagens e as aldeias, de que tanto gostamos, continuariam a existir. Mas, como se vai fazer isso? As esperanças são poucas. O abandono parece-me inexorável. Nem sei se são possíveis políticas que invertam o fenómeno... Era bom que as descobrissem e as aplicassem... De qualquer maneira, é preciso pensá-las e aplicá-las... Sem gente, vai ser difícil criar condições para o turismo cultural e ambiental, que se quer para estas nossas terras e de que tanto se fala...
Voltando a Bragança e ao património, é sobretudo a zona antiga, a que se chama propriamente a zona histórica, que faz de Bragança uma cidade especial. Que a individualiza. Ninguém de bom gosto vem a Bragança ver a Sá Carneiro...


Não lhe parece que mesmo bela, para nós que gostamos dela, está um pouco degradada? 

Eu diria que o que está degradado na zona histórica - e agora notam-se mais, depois das grandes intervenções de requalificação, as mazelas - é o parque habitacional. Tenho a impressão de que terá que haver, nessa área, um investimento sério. Só que não sei bem como...


Quem é que falha aí? Serão um pouco as pessoas que cá moram também?

As pessoas que cá moram terão alguma responsabilidade no que está a acontecer, até porque as pessoas podem funcionar sempre como um elemento pressionante. A opinião pública pode ter essa função. Tenho a impressão de que é um problema para o qual as autoridades e as entidades locais estão atentas e que irão procurar resolver, ou atenuar, no futuro. Mediante projectos bem pensados, aproveitando outras experiências, com a concessão de subsídios e com apoios técnicos. Com auxílio do poder central. Não vai ser fácil... mas começa a ser urgente... O património é dos bragançanos, dos portugueses e da humanidade.


É um facto que o choca como um brigantino ausente quando regressa e ver uma imagem degradada de uma zona tão linda?

Choca-me... Mas também convém não dramatizar, porque não pode ser feito tudo ao mesmo tempo. Há muitas intervenções que têm sido feitas. Intervenções de grande fôlego, sobretudo no âmbito do programa polis, que tem requalificado e valorizado muitíssimo a zona histórica. (Talvez haja ainda tempo para discutir alguns aspectos mais infelizes...) As intervenções, necessárias para evitar a continuação da degradação, não devem estar esquecidas. Muito mais será preciso fazer. Evidentemente que isto pode passar também por tomadas de posição política mais profundas... com uma maior vivificação da zona histórica, trazer mais gente para esta zona...


Mas não será preciso primeiro dar-lhe um jeito e depois fazer a promoção da zona histórica?

Acho que pode ser feito concomitantemente. Por exemplo, quando estive aqui, na Escola Superior de Educação, tínhamos um projecto para trazer alguns lares de estudantes para a zona histórica...


Dava-lhe uma vivacidade diferente.

Acho que sim, a existência de residências oficiais de estudantes poderia dar mais vida a esta zona. A existência de mais serviços públicos na zona histórica também podia ajudar. Há muitos edifícios que podem ser recuperados... Alguns, aliás, já foram recuperados... Outros se lhes poderão juntar. Não é fácil revitalizar um coração velho que nós queremos que continue a pulsar... Há muitas coisas que poderão ser feitas com êxito e algumas delas não serão muito dispendiosas. Imaginação e criatividade precisam-se... Como costumo dizer: dão “prémios-nobel”...


Mas havia essas instituições públicas que ao longo do tempo se foram mudando...

Foram-se mudando, nalguns casos, por razões ponderosas. Mas, como já sugerimos, alguns serviços poderiam ter ficado... E, provavelmente, alguns deles, como por exemplo certos serviços administrativos do Politécnico e da Câmara, poderão regressar ao casco histórico. Eu penso que os problemas das chamadas zonas históricas, antigas e consolidadas, apesar das suas especificidades, são problemas gerais. Houve, em quase todas elas, um vandalismo de fundo, quase sempre oficial, que podia ter sido evitado. Adiante... Esses problemas dizem respeito a quase todo o país, porque o que aconteceu foi que houve uma excessiva “terciarização”, na maior parte dos casos, dessas zonas. As pessoas que as habitavam, abandonaram-nas... Mas agora, nalguns sítios, mesmo os serviços e as actividades comerciais também estão a desaparecer dessas áreas. Aumenta, por isso, a sensação de abandono...


As zonas históricas ficaram para terceiro plano?

Não diria isso... Ou são dormitórios de velhos, ou, nalguns casos, começaram por ser mal e excessivamente intervencionadas; em muitos casos, continuam sobredensificadas durante oito horas e depois durante dezasseis não têm vida, ficam desertas...


Já na vizinha Espanha é diferente?

Na vizinha Espanha é diferente, porque há, porventura, mais investimentos. Há, sobretudo, mais animação. Os meios urbanos têm maiores dimensões. Há outras formas de vida. Há as movidas... Estava a falar das movidas?


Não. Estou a falar de como eles conseguem captar turismo para as zonas históricas, a forma como eles o fazem, a revitalização do património histórico que nós não temos...

Aqui, no campo da revitalização do património histórico, parece-me que está a haver uma obra louvável. Onde de facto as coisas ainda falham é, como disse, no que respeita ao património que tem que ver com as habitações. Estou convencido de que tem que se encontrar, independentemente das soluções locais, uma solução eficaz de âmbito nacional. Passa por políticas de fundo que resultem. Até agora o que tem existido, com algumas excepções, parecem ser programas paliativos.


Se pudesse dizer alguma coisa, se tivesse voto nessa matéria, o que é que faria?

Já se fizeram algumas sugestões. Não sei exactamente quais são os fundos e as linhas de crédito, os organismos e as instituições e mesmo os subsídios, de âmbito comunitário ou outro, que existem para a recuperação de imóveis. Por aquilo que julgo saber, as autoridades locais estão atentas a estes problemas. Não faz sentido, depois das grandes intervenções do Procom e da Polis, que não se tentem recuperar, na medida do possível, as habitações degradadas e que não se resolva o problema das que ameaçam ruir... Existe mais um problema que normalmente não é equacionado: uma pessoa que seja proprietária de uma casa degradada, dados os elevados preços a que chegaram os terrenos e aquilo que é hoje em dia a política urbana de solos, pode atirar com ela abaixo e fazer dinheiro com o terreno. Quem tem uma casa que precisa de ser conservada e que, por razões de ordem histórica (porque é um monumento classificado ou um monumento qualificado) não pode ser mexida, tem que a manter e a sustentar. Podemos dizer, tentando fazer humor, que vai ser “penalizado” por ter tido antepassados de bom gosto...


Deveria haver portanto um apoio a essa gente?

Parece-me que tem de se ir por aí... Para recuperar o que tem que ser recuperado tem que haver forçosamente políticas que contemplem também linhas de apoio. É preciso, o que é de grande importância, definir com clareza o que é para ficar e o que não é para ficar. (Sublinho o que acabo de dizer). Opções difíceis, eu sei, mas que têm de ser tomadas. É preciso, ainda, definir com clareza, como se deve “mexer” no que vai ficar. As autoridades responsáveis têm que ter uma acção pedagógica... A comunidade tem que suportar estes encargos. O património histórico é, em Bragança, a nossa maior riqueza. Valorize-se sem imobilismos...


Porque por fora tem que ficar exactamente como estavam...

Sim... Entrou-se, por vezes, por aquilo que se chama uma política de fachadismo e esqueceu-se que havia edifícios cujo interior era importante ter sido preservado... Continuo a achar que se mexeu excessivamente no Museu. Independentemente da sua modernização e actualização, que ninguém punha isso em causa, houve intervenções desmesuradas e desaconselhadas, no interior, que destruíram muito da sua história...


Guarda-se só a parte de fora, não é?

 De qualquer maneira é importante que se mexa por dentro. Refiro-me, fundamentalmente, às habitações. É natural e compreensível: as pessoas se não tiverem condições de habitabilidade, não hão-de querer residir nas zonas antigas. As pessoas têm direito a casa de banho, a uma boa cozinha, a essas coisas todas… Recuperar, melhorar, valorizar e construir de novo... Nada tenho, aliás, contra uma “boa convivência de estilos”, contra obras bem pensadas para as zonas históricas e inequivocamente modernas, que marquem bem a nossa época. Todas estas frentes têm que ser articuladas. É um trabalho que tem que ser prosseguido com alguma agressividade... Há, por exemplo, na rua Alexandre Herculano, alguns bons exemplos do que pode ser feito. São muitos os caminhos...


Antes que seja tarde demais?

Pois... Às vezes, por querer acudir a tudo, acaba por se degradar tudo. Tem que se definir bem, como já sugeri, o que tem que ficar e aquilo que não vai ficar, porque já não oferece as mínimas condições, ou porque não tem interesse do ponto de vista patrimonial, do ponto de vista histórico. Eu sei que os critérios são dolorosos... E, como já disse, nada tenho contra o que é dos nossos dias, desde que tenha qualidade e que se respeitem determinadas normas... Tenho bem mais medo do pastiche e de alguma “parolice”, muita dela de importação e de imitação, que por aí vai...


Concorda que se deveria fazer um estudo para uma separação daquilo que ainda se aproveita e é reciclável e aquilo que já não tem a mínima hipótese?

Parece-me que é forçoso ir por aí. Preservem-se conjuntos. Se pudermos preservar conjuntos tanto melhor. Nós temos ainda alguns conjuntos de muita valia. A polis acaba de valorizar e de requalificar alguns... Mas, agora, estou a pensar, por exemplo, naquilo que me parece ser a intervenção já projectada para a Av. da Estação. Além de desmesurada e, porventura, desnecessária, lá se vai muito dinheiro que nos há-de fazer falta... Depois, não se pode voltar atrás. Há naquele conjunto muito da história da cidade. Também há que dizer que, infelizmente, uma boa fatia da parte antiga ficou um pouco assombrada, à falta de melhor palavra, pela construção da Sá Carneiro... Andaram a atirar com os muros de Berlim para os refazer na Sá Carneiro... Um hino descomunal, deslocado e despropositado, ao cimento... Um Mostrengo assustador...


Foi uma avenida que, como se diz, cresceu para cima!

O problema não é ter crescido para cima. É ter crescido ali onde está e ter crescido como cresceu. Não tenho nada contra o facto dos prédios e das casas crescerem na vertical, até porque isso permite que mais pessoas vivam no sítio em que querem viver e que estejam mais próximas das coisas que para elas são importantes. Havia muitos sítios para construir uma avenida com aquelas características, para já não falar dos milhões que se têm gasto em grandes remendos. Acresce ainda que é má a qualidade de muitos dos prédios... Há mesmo alguns que não deveriam ter sido feitos. Sobretudo os do lado oriental, aqueles que vieram “esmagar” parte da Alexandre Herculano... Depois, se virmos a cidade de qualquer lado, de qualquer ângulo, há sempre Sá Carneiro a mais...


Quem passa na Sá Carneiro não vê, por exemplo o Castelo.

Sim, os corredores visuais, embora haja um ou outro, também deveriam ter sido mais acautelados. O problema é bem mais a Sá Carneiro que se vê do Castelo e de todos os lados... Mas agora a Avenida já está lá. Vai ser muito difícil implodir edifícios... Também convivemos com pessoas de família das quais não gostamos. Acontece-nos o mesmo com a cidade: temos que conviver com esta e de viver nesta...


Não perdeu o sotaque nordestino, como no livro “Três estórias (pouco) doces”, ou ainda nos “Contos de pousar”. Nota-se aí que existe Trás-os-Montes?

Já falei nos Contos de pousar. Três estórias (pouco) doces é um livro que tem que ver com a ficção histórica, com heróis anónimos e com a alimentação... Foi um livrinho que escrevi, como costumo dizer, para um público juveno-adultil e que acabou por ganhar um prémio nacional (da Associação Portuguesa de Escritores...)


Partindo daqui: histórias de um homem de Guadramil, histórias de um escravo, histórias de uma pastora que se encontrou com a rainha… Quando vem a história do José Monteiro?

A história do José Monteiro não vem. Vai-se fazendo todos os dias, como aliás todas as histórias de todos os homens; vai-se fazendo e desfazendo... O que sou e o que penso está forçosamente no que escrevo e no que digo...


Vai ser transcrita?

Nem pensar. Não me quero imortalizar. De maneira nenhuma... O que quero mesmo, e tão somente, é ter alguma paz e alguma tranquilidade e pouco mais para além disso... Ir respondendo a alguns reptos que me são postos por obrigações cívicas, de cidadania. Quero continuar a ser interventivo, quero continuar a não ter amos, quero continuar a ser uma pessoa livre. E, se puder, quero continuar a rir e a sorrir, embora os tempos não vão muito de feição...
                 

Voltando ao III Congresso e à cultura que por cá se faz ou não se faz, o que é que tem a dizer?

Em relação à cultura que por cá se faz, acho que vai havendo bastante oferta. Há muitas instituições locais a produzirem cultura, desde as instituições universitárias, passando pelo Arquivo, pelo Museu, pela Câmara. A actividade cultural dos estudantes e das escolas também significa cultura. Há a imprensa local, há rádios, há espaços de sociabilidade e de convivialidade, há associações culturais e recreativas diversas... Há bibliotecas e mais vai haver...


Toda a cultura fica pobre quando se perde alguma coisa, estou a falar do Teatro em Movimento, por exemplo.

Temos que pensar que há perdas que não são irreparáveis. Outras instituições virão. Aliás, hoje em dia, nota-se algum investimento na área da cultura: há obras que parecem ser de excelência, que vão ser criadas e que, em princípio, vão ter importância como centros produtores de cultura. Estou a pensar, por exemplo, no Centro de Arte Contemporânea que me parece ser um projecto importante (aliás, o próprio projecto arquitectónico é do Arquitecto Souto Moura). Como é sabido, há uma candidatura conjunta ao Interreg com Zamora e os dois parceiros são a Fundação de Serralves e o museu da Rainha Sofia. Em princípio, poderemos ter em Bragança excelentes mostras, para além dos programas do Centro de Arte Contemporânea e das colecções próprias. O teatro municipal também é uma obra emblemática... A tão apregoada Sé Catedral, que acabou por se transformar, com a conivência dos arquitectos, no projecto do bispo Rafael, poderia ter significado muito para Bragança e para o país. Significa muito pouco. É uma obra frustrante. Continua a ser, mas agora com dimensões faraónicas, a sécristia de Miranda...O que poderia ter sido – bastaria ter respeitado o projecto dos anos 60 – e o que não é... (Foi pena não se ter construído a catedral no século XVIII...) Não me lembro, o que é muito sintomático, de ter visto uma única opinião favorável vinda dos meios artísticos, de arquitectos, dos homens das artes...


Sendo a obra que é o teatro, uma obra fantástica, não seria bom ter uma companhia de teatro residente, porque o mesmo vai acontecer no teatro de Vila Real, com o Filandorra.

Não sei se há possibilidade ou não de ter aqui uma companhia residente. No futuro acho que seria de ter, se fosse possível, uma companhia residente que poderia potenciar a actividade cultural que o teatro pode oferecer. Até porque, uma companhia dessas seria, em princípio, para circular pelo distrito... Aí está também a Casa da Cultura que vai ter uma Biblioteca Municipal e acho que um Conservatório, salas de exposição, actividades culturais, um núcleo museológico. Tudo depende do dinamismo de todas estas instituições e unidades e do investimento que vai ser feito. Há, ainda, pequenas instituições, ligadas especialmente à Polis, que podem ter um importante papel cultural. Fala-se no centro de indústria da seda que ficará sedeado num moinho que vai ser recuperado. Há o museu da máscara que, por aquilo que julgo saber, vai ser criado na vila. Evidentemente que é importante criar aí, na vila, pequenos núcleos museológicos, porque hoje em dia a vila atrai, se os números que me deram não são excessivos, mais de 50 mil pessoas. O museu militar é visitado anualmente por mais de 50 mil pessoas. Isto significa que muito mais gente vai à vila... Há algumas casas, dentro das muralhas que são pertença do município. Nelas poderão ser criados pequenos núcleos museológicos. Aqui fica a sugestão... Relacionados com a fotografia, com a etnografia, com a antropologia. Falta, o que é indesculpável, numa zona com as características de Bragança, um dinâmico museu etnográfico. Não há tempo a perder... Também me parece que seria possível, agora que já não temos comboio, pensar, eventualmente, na musealização dos materiais, que ainda existem, relacionados com o caminho de ferro... (Para que a memória não se perca e para atrair gente…)


Ou seja, juntar fragmentos?

Exacto, porque há alguns investimentos que não são muito dispendiosos e que podem ser rendibilizados. Também se fala no parque de lazer da Trajinha, onde me parece que a componente ambiental vai ser muito importante. As coisas estão a mexer. Há projectos. Estão a ser executados. Depois é preciso que haja pessoas. O fundamental e o essencial são os homens, porque as pedras e as obras não vivem sem os homens. Relacionada com a oferta, há uma actividade muito importante que, normalmente, se esquece: a informação e, à falta de melhor palavra, a propaganda. Entendendo por informação e propaganda a arte de atrair e a arte de criar fascínios.


A terra sem ser trabalhada dá ervas daninhas!..

 As coisas são feitas, mas, como sabe, os órgãos de comunicação têm um papel decisivo: só acontecem quando são devidamente divulgadas e devidamente trabalhadas. Há que ter grande cuidado em especial no que respeita à promoção (que me parece importantíssima) da região de Trás-os-Montes. Há um investimento a fazer nos campos da informação e da divulgação, porque nesta sociedade, sobredensificada de informação, quer se queira quer não, a atenção já começa a ser um dos recursos mais escassos.


Falou-se há pouco tempo de um divisionismo da região de Trás-os-Montes em comunidades urbanas. Na polémica que envolve a nossa região, acha que a região se devia unir ou pelo contrário, devia dividir-se, distrito de Vila Real para um lado, distrito de Bragança para o outro?

Acho que a região se devia unir ainda mais... Mesmo unida não será fácil resolver muitos dos seus problemas. Há algumas tendências divisionistas que me parece que não foram criadas propriamente pelas autoridades de Bragança. De maneira que, se calhar, a essa pergunta quem deveria responder deviam ser as pessoas que neste momento apostam no divisionismo. Outro dia esteve aí o Primeiro-ministro e, pelo que julgo saber, lançou um repto no sentido de não se perder a unidade de Trás-os-Montes e Alto Douro. Evidentemente que Bragança, no caso de se perder a unidade de toda a região, corre o risco de perder alguns concelhos do sul do distrito. Mas, o que me parece mais grave é que, nos dias de hoje, não se vai a lado nenhum com o minifúndio institucional. Há problemas de gestão e de administração de bens, de equipamentos e de serviços que interessam a todos e que se resolverão bem melhor se a região tiver dimensão. Trás-os-Montes não é uno, não é homogéneo. Trás-os-Montes e Alto Douro constituem, felizmente, uma região heterogénea. Com uma rica variedade. Essa diversidade e essa complementaridade podem ser muito importantes: o Alto Trás-os-Montes, o Baixo Trás-os-Montes… a Terra Quente, a Terra Fria... Devo acentuar que, para os decisores, as regiões muito pequenas deixam de ter interesse. Trás-os-Montes e Alto Douro, considerados globalmente, não têm uma dimensão excessiva.


Mas o próprio distrito de Bragança está dividido em três parcelas: a Terra Quente, a Terra Fria e o Douro.

O distrito de Bragança, se calhar, ainda está dividido em mais parcelas. Mas não vejo em que é que isso possa justificar uma divisão. Há problemas comuns às diferentes zonas e se forem resolvidos em comum serão mais bem resolvidos, com menos custos. Repare: Vila Real tem uma universidade que se chama Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro; se se concretizar a cisão deverá passar a chamar-se Universidade do Alto Douro. A região tem uma história. A província, apesar dos bairrismos (mais ou menos pelintras que não levam a lado nenhum...), tem um passado comum... As pessoas que vivem em Freixo de Espada à Cinta e em Carrazeda de Ansiães têm a sua história ligada a Bragança... Hoje em dia o Douro viu-se promovido e ganhou estatuto de património mundial...Tem que ser o Douro a promover o Nordeste e o Nordeste a promover o Douro. Toda a gente ganhará... Montezinho pode remeter para o Alvão, o Marão pode enviar para Nogueira... Há o Tâmega e as montanhas. A região de Montalegre e o Tua, o planalto mirandês e a Vilariça...  


Têm que ser actividades interligadas?

É óbvio. Os organismos, as entidades, as associações (oficiais e não oficiais) todos os responsáveis pelo desenvolvimento e pela gestão, pelas actividades de promoção, pelas actividades de turismo, terão que se encontrar, terão que dialogar, definir, decidir... É preciso que saibam o que querem para saber o que fazer e os meios que são necessários e que podem e devem ser exigidos. E depois é preciso ver como e quem o vai fazer... Tentar ver os caminhos do futuro... De facto, parece-me que a região só tem a ganhar com a diversidade que neste momento tem e com as múltiplas ofertas de que pode dispor se forem valorizadas. A diversidade é, como nos ensina a própria biologia, uma riqueza inestimável, um património a revalorizar...


Partindo de tudo isto qual é o futuro que prevê para o Nordeste Transmontano?

O futuro que prevejo para o Nordeste Transmontano é que se estiver integrado em zonas mais vastas, as coisas poderão melhorar. E não falo só de Trás-os-Montes, falo de associações e de parcerias com outras zonas de maior dimensão, mesmo transfronteiriças (o que aliás, já está a acontecer...) O progresso e o desenvolvimento passam essencialmente pelas actividades económicas... Se me perguntar qual é o futuro quer da região, quer do país digo-lhe que não sei responder... Quero recordar que, ao contrário do que as pessoas pensam (porque falta a muito boa gente “idade média” e conhecimentos históricos), esta região de Bragança já conheceu tempos em que não foi tão subalterna do ponto de vista económico como é hoje em dia. Por exemplo, no século XVIII, apesar da falta de acessibilidades (como agora se diz em linguagem tecnocrática), e apesar de vários parâmetros lhe conferiram um certo isolamento, foi possível criar riqueza nesta região. Estou a pensar, nomeadamente, para além de outras indústrias, na da seda que, no século XVIII, teve uma expressão económica muito importante na zona. Nos fins deste século, numa população que andaria por volta dos cinco mil habitantes, as pessoas ligadas à seda, só na urbe, eram perto de mil... Vimos da melancolia - até porque este ano de 2003 foi um ano horribilis -, mas temos que caminhar para a alegria. Embora não se veja bem como, o futuro há-de prosseguir... Há alguns caminhos que, pelo que se sabe, são melhores do que outros...


Os nossos recursos estarão a ser mal explorados?

Pode ser que, de futuro, haja hipóteses que não estamos a ver bem. Temos, apesar de pobres, recursos variados. No III Congresso, falou-se muito em eixos estruturantes de desenvolvimento... É fundamental melhorar as vias de comunicação e atrair investimentos económicos. Mas também há alguns produtos tradicionais (até quase me atrevia a falar em produtos pós-modernos) que já têm nome feito. Estou a pensar por exemplo em alguns produtos gastronómicos... Eis alguns factos significativos... O Presidente da República, quando esteve há pouco tempo, acho que no ano de 2000, em Paris, num importante acontecimento cultural que foi o salão do livro português, ofereceu um cálice de vinho do Porto e levou os Pauliteiros de Miranda. Foi a melhor maneira que achou para promover Portugal... Há outros exemplos que me parecem paradigmáticos. Nesta deslocação do Presidente da República à Noruega um dos pratos oferecidos aos convivas, pelo governo português, eram alheiras de caça... O Dr. Emídio Peres dizia que o pão é um dos produtos que tem pior qualidade. O que é que fazia para fugir ao mau pão? Só consumia pão de Bragança que comprava no Porto. Grande autoridade no campo da alimentação, escreveu que são mais nocivas à saúde as bolachas do que propriamente os salpicões se estes forem de qualidade. Há que promover estes e muitos outros produtos... Temos uma grande riqueza patrimonial (paisagística, patrimonial, cultural). Mas só podemos oferecer e vender turismo rural, turismo ambiental, turismo cultural... se houver por aqui pessoas, que tratem das terras, das aldeias, da riqueza patrimonial. Os patrimónios ricos e variados, materiais e imateriais, continuam a ser a nossa maior riqueza.


É um puxão de orelhas às pessoas também?

Não sei bem como é que se resolvem estes e outros problemas. Alguns terão que ser resolvidos para bem da região, outros se calhar não vão ser resolvidos. Novas soluções surgirão... Tudo isto passa por apostas estratégicas que têm que ser devidamente pensadas.
Em relação à cultura, há um fundo cultural riquíssimo que tem que se aproveitado. Há, para além disso, grandes vultos que são de Trás-os-Montes e Alto Douro, figuras paradigmáticas da cultura portuguesa e até da cultura universal, estou a pensar em Bento da Cruz, em João de Araújo Correia, em Torga; estou a pensar no nosso Abade de Baçal. Foram homens que se serviram da “transmontaneidade”, que se serviram da “nordestinidade” mas que lhe deram um estatuto de universalidade...


O transmontano é algo diferente do nordestino?

As diferenças acabam por ser complementares. Um homem do sul do distrito gosta de presunto de Vinhais, um homem de Bragança gosta de vinho do Douro (seja fino, ou de mesa...). A gastronomia é também uma grande arte... Se tivermos sensibilidade, temos que ser apaixonados pelo Douro, uma das paisagens mais humanizadas e mais fabulosas do mundo... Douro, que diga-se de passagem, está a passar por maus momentos. Há, em Trás-os-Montes, monumentos, sítios, lugares, produtos, manifestações culturais, patrimónios que podem ser promovidos globalmente. A diversidade e a heterogeneidade, que fazem e marcam a identidade de toda esta região, só podem ser apelativas...


No final, e porque já temos pouco tempo, qual é a personalidade ou as personalidades que o marcaram mais ao longo da sua vida?

Ainda antes de falar das personalidades que me marcaram, gostaria de deixar duas ou três notas acerca de Bragança. Ao longo dos tempos foram construídas várias braganças. Temos uma cidade feita de várias braganças (do que delas foi ficando...). Há uma zona histórica que apenas referimos, mais ou menos consolidada. Havia uma zona muito despenteada, que se despenteou fundamentalmente a partir dos anos 60 e não, ao contrário do que de se diz, depois do 25 de Abril de 74. A cidade já vinha a despentear-se, porque cresceu muito a partir dos anos 60 e, muitas vezes, não cresceu como devia. (Já falámos, por exemplo, da Av. Sá Carneiro... Há bairros periféricos de muito fraca qualidade urbanística; há zonas residenciais de manifesto mau planeamento... Tudo isto é bem visível). Par além de um crescimento, que pode ser discutível, mas que agora é mais pensado, há ainda esforços para consolidar e melhorar (compor?) essa Bragança que cresceu mal... Apenas uma pergunta: não podem acabar com as “obras de arte” (instalações, peças escultóricas…) nas dispendiosas e terceiro-mundistas rotundas que enxameiam Bragança e que povoam o país de norte a sul? Bragança poderia ganhar mais identidade e originalidade e distinguir-se melhor dos restantes meios se transferissem muitas dessas obras para outros espaços urbanos. Nas rotundas bastam umas arvorezitas e uns jardinzitos... A bragança que mais me interessa referir tem que ver, sobretudo, com a vila e com o castelo (e ainda com o coração velho da urbe…) Em Portugal, o melhor que temos para oferecer, do ponto de vista turístico, são os nossos castelos... Ora, o Castelo de Bragança é exemplar e está muito bem conservado... Parece-me que seria de avançar com uma proposta de candidatura a património mundial para esta monumental bragança. Evidentemente que isso implicava também uma recuperação ainda mais exigente das zonas envolventes... Seria de começar a pensar seriamente, e com tranquilidade, nesta candidatura. 


Que traria ainda algumas vantagens…

Acho que sim. Ainda por cima, este conjunto de excepcional valia, guarda, entre outros, monumentos notáveis: a Domus e a torre de menagem, uma torre gótica belíssima. São construções já do século XV (tardo-medievais) que constituem um património valioso.
Não esqueci a pergunta que me pôs: tinha que ver com as figuras que mais me marcaram. É uma boa pergunta. Foram alguns amigos e algumas amigas, alguns professores, algumas pessoas de família. Mas não é esta a resposta que quer. Pela negativa, poderia escolher, talvez, Oliveira Salazar. Pela positiva, eu que sou um pouco dado às letras e às literaturas, talvez me sentisse tentado a falar de vários e diversos criadores literários: pelo que me têm dado e pelo que me têm ensinado. Acho que não vou individualizar nenhum... São muitos... (Mesmo assim, no momento que passa, destacaria, por variadíssimas razões, Raul Brandão)


E no Nordeste Transmontano há alguma personalidade que o marcou?

Fui um leitor atento de Torga... E sou um leitor, ainda agora, muito atento - infelizmente há poucos - de João Araújo Correia. Há que reeditar a obra deste grande escritor duriense. Aí está um projecto em que todo o Trás-os-Montes se poderia envolver... Sem demagogias, marcaram-me e marcam-me estas gentes anónimas fazedoras e guardiãs deste Trás-os-Montes que conhecemos... De que muito gostamos e que, por isso, muito gostaríamos de ver salvaguardado e valorizado... Obrigado pela honra de me terem convidado para iniciar este conjunto de entrevistas. Poderiam ter sido mais felizes na escolha... Peço a melhor compreensão para o que disse e, sobretudo, para o que ficou por dizer...
                                           
 (Texto corrigido pelo entrevistado...)

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