domingo, 20 de novembro de 2016

Arrendar casa em Bragança: à procura de uma agulha num palheiro




O aumento significativo da população estudantil do IPB, a recente ampliação da Faurecia, principal empregadora na região, e a falta de estabilidade no trabalho, que desencoraja a compra de habitação própria, fez disparar a procura de imóveis para arrendar. O mercado tenta dar resposta que, para já, fica aquém das necessidades, com os agentes imobiliários a reclamarem novas políticas fiscais para o sector. Enquanto isso, há brigantinos de gema e adoptivos a desesperarem à procura de casa.
António Guerra, agente imobiliário da “Predial Rua Nova” há mais de 20 anos, refere que se “nota uma grande procura no mercado de arrendamento”. Os apartamentos de tipologia T1 e T2 são os mais procurados entre os estudantes, mas para António Guerra, “neste momento existem apartamentos razoáveis para arrendar, até porque não se tem construído tanto e há pouca gente a investir para arrendar”, sublinha.
Há, contudo, a expectativa por parte dos profissionais do ramo imobiliário que esta nova realidade “traga um novo impulso ao mercado de construção” e que surjam novos investidores, à luz do que aconteceu no passado.
Mas mais construção, não significa mais apartamentos para arrendar. Os elevados custos que os senhorios têm de suportar ao colocarem os seus imóveis no mercado de arrendamento faz com que hesitem em tomar essa decisão. “A habitação é muito cara e os encargos com as finanças e condomínio são elevados, acabando por não compensar. Tem ainda que se pagar um seguro e quando os apartamentos são alugados com recheio, os encargos são ainda maiores. No final do ano vê-se que o lucro não é muito, ronda mais ou menos os 50 por cento”, constata Paula Lucas, da empresa familiar de construção “Albino Lucas, Lda”. A arquitecta revela que constrói para clientes “que procuram habitação própria ou, então, para férias, no caso dos emigrantes”, acrescentando que as pessoas raramente compram para alugar, já que os custos de apartamentos com acabamentos de boa qualidade e certificação energética faz com que as pessoas hesitem em entregá-los a qualquer pessoa”.
Cristina Lucas, administrativa na empresa, revela que, em 2013, a empresa começou a construir prédios, junto à rotunda do Caçador, no Bairro do Campelo, estando, nesta altura “a construir o quarto prédio” e esperando-se que, até 2017, estejam concluídos seis prédios, no total.

De acordo com esta construtora “as habitações de tipologia T3 continuam a ser as mais procuradas, principalmente, por famílias tradicionais, pese embora, “tenha havido um aumento da procura de T2, pois há hoje mais famílias mono parentais”.
Cristina Lucas nota ainda que houve uma “quebra” no sector imobiliário, notando que, “nos últimos seis meses se nota um novo impulso no crédito à habitação”.
Já Jorge Padrão, proprietário da imobiliária “Visão Geral”, sublinha que “tem havido oscilações no mercado imobiliário nos últimos 16 anos”, altura em que começou a trabalhar no sector. “Há mais procura no arrendamento, sobretudo, devido a dois polos que dinamizam o mercado, ou seja, o IPB e a Faurecia”, sublinha, tal como constatam muitos outros empresários do sector.
Mas, o vendedor de imóveis regista outras alterações que considera significativas. “O arrendamento hoje é muito mais sazonal e um contrato que consideramos normal é de um ano, enquanto que antigamente eram contratos por três e cinco anos”.
Jorge Padrão considera que tem de haver alterações à lei do arrendamento, de forma a “criar condições para que o cliente proprietário, por sua vez, crie confiança no sistema fiscal e no sistema judicial, que lhes permita pôr os apartamentos no mercado de arrendamento”, sublinhando que a política fiscal em vigor “é penalizadora” e a justiça “lenta a tomar decisões”, o que afasta os proprietários do mercado. Jorge Padrão, critica ainda “o facto de um proprietário com o seu imóvel arrendado pagar ao Estado 28 por cento em sede de IRS”, que considera exagerado.
Constatações comuns às dezenas de empresários do ramo imobiliário que têm a difícil tarefa de satisfazer clientes exigentes, que procuram, sobretudo, apartamentos com conforto e qualidade mas para alugar e não comprar, ao contrário das expectativas dos construtores que esperam essencialmente vender e dizem que os clientes se sentem pouco motivados a comprar para alugar.
Alexandra Santos, directora da agência “Decisões e Soluções” de Bragança, adianta que no mercado de arrendamento “o problema é que a procura é muito superior à oferta”, referindo que “os clientes preferem vender e evitar as preocupações que o arrendamento traz”, evitando gastos com a manutenção e preservação, principalmente, “quando se sabe que o mercado de arrendamento em Bragança é bastante explorado por estudantes e estes, muitas vezes, não preservam os imóveis”.
Também Arnaldo Afonso, da “Real Imonorte”, reconhece que este é um dos factores que “desencoraja quem já arrenda e futuros investidores”, explicando que “é frequente haver destruição de imóveis”. O empresário dá conta de que “cerca de 80 por cento desses imóveis, ao fim de um ano, necessitam de obras e, acompanhado pelos altos impostos, leva a que muitos investidores não queiram arrendar”, refere.
Com o aumento de procura, o arrendamento que havia praticamente esgotou. “De há um ano para cá estamos sempre esgotados. Quando um T1 fica livre já temos 100 clientes para ele”, assegura Arnaldo Afonso.
Uma escassez que se verifica em relação a casas mais pequenas, porque “só há dois ou três anos para cá é que os empreiteiros se têm virado para as tipologias T1 e T2, anteriormente o que se construía eram apartamentos maiores, que seriam para famílias e na zona do IPB para arrendamento para estudantes”, justifica Vítor Alves, que é dono da empresa que adquiriu o franchising da imobiliária “Era”, a mais recente neste ramo em Bragança. Só nesta imobiliária existe actualmente uma lista de 80 pessoas em espera para arrendar T1 e T2.
A carência está a fazer subir os preços das rendas nestes casos, garante ainda. A grande maioria deste tipo de apartamentos está arrendada “por valores ainda consideráveis”, já que, “em função da necessidade, a procura e a oferta ditam os valores de mercado e verifica-se que se estão a pagar arrendamentos por valores interessantes para os investidores, menos interessantes para quem arrenda”.
A abertura desta nova imobiliária prendeu-se com a melhoria do sector imobiliário em Bragança. “Achámos que era o momento oportuno, em função também da procura que havia para a aquisição e arrendamento de imóveis e a própria necessidade que a Faurecia veio criar em termos de procura de imóveis”, refere responsável da empresa.
Este empresário acredita que o cenário que actualmente o mercado atravessa na cidade pode ser uma oportunidade para investidores que apostem na compra de apartamentos para arrendar, uma tarefa que está mais facilitado face às actuais taxas de juro dos depósitos a prazo praticadas, que foram reduzidas. “Quem tem capacidade financeira vira-se claramente para o investimento no imobiliário, em função do retorno que consegue”, considera o empresário.
Os responsáveis da câmara Municipal garantem que estão atentos a esta falha no sector. “Com a ampliação da Faurecia, o município teve a preocupação de reunir com as imobiliárias da cidade para dar uma resposta à procura e necessidade crescentes de habitação na tipologia mais baixa. Há esta preocupação que foi demonstrada até junto dos empresários do sector no sentido de poderem passar a construir habitações de tipologia T0, T1 e T2”, refere Hernâni Dias.
O autarca reconhece que o problema se prende com o facto de muitas habitações estarem fechadas. Normalmente, nestes casos trata-se de habitações de particulares “que por vezes nem sequer têm conhecimento destas necessidades de arrendamento, o que não significa que através de uma sensibilização estas habitações possam estra disponíveis no mercado de arrendamento”. Hernâni Dias sugere ainda que “um programa de alojamento de estudantes em casa de habitantes locais” possa ser outra solução para ultrapassar o problema, podendo neste caso “os jovens fazer um acompanhamento da população”.
Presidente do IPB reclama “legalização” do mercado de arrendamento
Sobrinho Teixeira considera que da parte dos senhorios também há a necessidade de se adaptarem à nova realidade e que estes devem regularizar a sua situação perante as finanças e passar recibos aos alunos e pede uma maior colaboração dos brigantinos e também mirandelenses na integração dos estudantes.
As residências universitárias servem exclusivamente alunos nacionais do IPB e contabilizam, neste momento, 400 camas que estão destinadas a estudantes bolseiros portugueses. Contudo, Sobrinho Teixeira refere que “a maior parte dos estudantes internacionais não estão alojados em residências nem é esse o caminho que deve ser seguido, pois mais do que construir edifícios, o que tem de se fazer é injecção de dinheiro na economia da cidade e da região”, considerando que deve ser o sector privado, como todos os benefícios daí inerentes para a economia local, a dar resposta à necessidade de alojamento.
Associação académica
recebe pedidos de ajuda
para encontrar casa
O presidente da Associação de Académica do IPB, considera que este é um problema que reclama solução urgente, uma vez que já é necessário que os alunos se desloquem “para zonas muito distantes do campus universitário, nomeadamente, para a zona de Vale d’Álvaro”.
Ricardo Pinto adianta que esta situação vai motivar “o envio de um documento à câmara municipal para propor, uma vez que há esta deslocação para outros pontos da cidade, que se crie uma linha dos Serviços de Transporte Urbanos de Bragança (STUB) só para fazer o transporte de estudantes”, considerando que as linhas existentes “já não se adequam à nova realidade”. O presidente do município promete “avaliar convenientemente este pedido” quando ele chegar à autarquia.

Escrito por: Jornalistas Sara Geraldes / Olga Telo Cordeiro / Hélder Pereira

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