Um amigo e reputadíssimo cientista dizia-me, recentemente:
“Zé Mário, isto de sermos o pior país do mundo em número de casos e em mortes
não é por maldição, mas por pura incompetência das autoridades.” No meu
entender, o Princípio de Peter no que toca à progressão de categoria até
atingir a incompetência, obtém a sua maior eficácia e realização, na classe
política. Qualquer sucesso, casuístico ou natural, é imediatamente apropriado
para benefício e glória própria, para a autopromoção e para, lamentavelmente, o
desleixo subsequente, resultante do autoconvencimento de uma suposta
genialidade natural e inata. Há pouco tempo a ministra da Saúde referiu, e bem,
as dificuldades na cooperação europeia para atender os doentes, em rede
internacional, por causa da situação geográfica portuguesa, na “cara da
Europa”. Não seria natural ver e perceber que o tal “milagre” português, o da
primeira vaga pandémica, também é devido, em muito, à geografia? A
autossatisfação do “acerto” dos decisores políticos dessa altura está na origem
deste cenário dramático, agora que a pandemia piorou a sério, por todo o lado,
caiu-nos em cima de forma desastrosa e com os deploráveis resultados,
sobejamente reconhecidos. Não se entende que, na situação excecional de
emergência, se tenha adiado, até ao limite do absurdo, a cooperação com a
componente privada do sistema nacional de saúde. Queiram ou não, a procura e
obtenção de lucro, não é crime, nem tão pouco imoral. Criminoso é condenar à
morte centenas de cidadãos em nome de dogmas ideológicos, anacrónicos,
estúpidos e inconsequentes. Se o lema “a saúde não é negócio” fosse levado até
ao limite (como no caso do recurso aos hospitais privados, infelizmente,
aconteceu) estaríamos agora afastados dos planos europeus de vacina, pois as
farmacêuticas vão, naturalmente, registar lucros fabulosos com esta pandemia.
Se uma parte significativa desses proventos for reinvestida em investigação e
desenvolvimento, como é natural, então é muito bom que sejam gordos. Se o governo
andou mal, muito mal, deixando-se manietar pelas peias ideológicas da extrema
esquerda, o principal partido da oposição não andou melhor pois, em plena crise
pandémica, empurrou o governo para esse beco (que o próprio procurou,
reconheça-se) sem qualquer razoabilidade. Rui Rio que em coisas comezinhas e
miudinhas, inexplicavelmente, se colou a António Costa, para diminuir a
democraticidade parlamentar, reduzindo a frequência da prestação de contas do
Governo, não precisava de perder a face pois podia ter-se abstido, permitindo
uma negociação à esquerda descomplexada e sem pressões inultrapassáveis. A
cegueira ideológica do PC e do Bloco, neste assunto em concreto é inexplicável.
O diabolizado lucro numa das mais nobres atividades profissionais, é aceite com
normalidade se resultar da atividade legítima, da realização da Festa do
Avante. E o mesmo Bloco que não aceita, de forma nenhuma a remuneração natural
do capital investido nos Hospitais Privados, defendeu, até ao limite do
razoável, a legitimidade do lucro fabuloso e obsceno obtido pelo seu vereador
na Câmara de Lisboa, Ricardo Robles, com um edifício da Segurança Social cuja
aquisição por valor tão baixo deveria ser devidamente investigada. De pouco
adianta andarem à procura de explicações para a ultrapassagem que a
extrema-direita lhes está a fazer. A causa não está só nas quimeras vendidas
pelos populistas, reside também na incapacidade de autoanálise e respetiva
correção dos chamados partidos do sistema.
Sem comentários:
Enviar um comentário