domingo, 10 de abril de 2016

O planeta dos macacos (Editorial do Jornal Nordeste)



Vamos na segunda década do século e parece-nos que, afinal, a história se repete, porque no dealbar de cada novo século, a humanidade tem conhecido tragédias impensáveis.
Definitivamente, a história não se repete. O que acontece é que a natureza humana não muda muito enquanto o tempo corre, longo que seja, à vista, sempre limitada, do observador individual da humana espécie, uma simples derivação do grande tronco dos símios.
Quando era jovem, na verdura dos quase dezassete anos, pelo Inverno de 1972, peguei num blusão verde tropa e escrevi, eu próprio, no pano de costas, a seguinte mensagem: “Homo Sapiens, quando deixas de ser macaco?” Fiz furor nas ruas desta minha cidade.
Eram deambulações de um fim de adolescência, quando se acredita que não há razão para que o mundo não mude, já que os humanos só não se aproximam dos deuses se não quiserem.
Passados mais de 44 anos, os dias nascem sobre um imenso pântano fétido, onde se rebolam perfeitos macacos, espalhando lama imunda em redor, à mistura com guinchos ameaçadores, dentuça arreganhada, como que a prefigurar as portadas infernais.
De facto, este país continua a ser a choldra profetizada pelo José Maria, o tal Eça de Queiroz, claro, onde a venalidade tem parido sucessivos escândalos de corrupção e a nossa terrinha ocupa lugar de honra no ranking da podridão.
Olhando para o rasto civilizacional portuga, o tropicalíssimo Brasil, faz-nos corar de vergonha. Outro produto da nossa vocação universal, a grande Angola, também não nos dá motivos de tranquilidade. Em Moçambique perfilam-se, de novo, os senhores da guerra prontos para a festa do sangue e, na Guiné, as bolanhas cheiram a carne e a cocaína.
Ainda por cima, percebemos, agora, estupefactos, que até o nosso Sabor, o rio que nos passa aqui à porta, também poderá ter sido empurrado para uma global embrulhada, com cheiro a macacada.
Pelos vistos, as obras da barragem, construída junto à foz deste nosso rio, também terão tido contactos com os vírus da corrupção, onde brasileiros e portugueses, carinhosos irmãos, não se abstiveram do deboche.
Entretanto, um consórcio internacional de jornalistas divulgou notícias sobre comportamentos miseráveis, mesmo de políticos que se arvoraram em paladinos da dignidade e da integridade. Ficamos com a sensação de que, na realidade, isto continua a ser um verdadeiro planeta de macacos, sem pudor, sempre prontos a fazer valer os seus instintos mais básicos, sem pinga da vergonha que a condição humana teria trazido, pensávamos nós, para o terceiro calhau a partir do Sol.
Não valem a pena os lamentos. Por mais que nos pareça estranho, a indignidade alastra de forma indiscriminada, chamando-nos à razão sobre as fragilidades perigosas dos humanos, que mudaram pouco no que respeita ao egoísmos, à rapacidade e à vertigem do verdadeiro pecado que é o desprezo ostensivo pelos outros, apesar dos dois mil anos que passaram sobre o legado de um rabi da Palestina, que é símbolo fundamental para meio mundo.

Por Teófilo Vaz (Diretor do Jornal Nordeste)

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