terça-feira, 16 de dezembro de 2014

Natal

O Natal não demora.
Não me sinto diferente. Respiro o mesmo ar, vejo as mesmas pessoas, sofro sofrimentos novos e velhos, vivo a vida de igual forma...
Não. Nada está distinto por ser Natal.
Talvez se nevasse e tudo branquejasse em tons de pureza...
Mas quando nela pisasse alguém que por ali passasse, que seria da brancura imaculada, tão fria, tão rotundamente gelada, que nela descalços, não podemos pisar?
Se chovesse numa cadência plangente, noite e dia, que tristeza me daria!
Se em plena madrugada, camada grossa cobrisse de geada, o pequeno tanque do meu jardim e ali pousasse pequeno pisco, muito perto do jasmim, com menos perfume mas sempre perfumado... e a noite fria convidasse a corpos entrelaçados, nesses entrelaçamentos ancestrais e primitivos de pura ânsia, de pura magia, talvez vislumbrasse o Natal.
Não luzem as luzes no pinheirinho que fui buscar à câmara municipal, nem mesmo o Menino, em palhas deitado, espera por mim.
Que hei-de fazer, se esta angústia sem fim não consigo abater?
De que vale comprar o polvo e o bacalhau se tantas vezes, ao longo do ano, os tive à mesa?
Onde está o símbolo?
Onde está a lareira pujante, os risos libertos, a alegria cantante?
Onde perdi, sem me aperceber, a capacidade de ver para além do rosto triste que reflete o espelho que tenho no quarto?
As mães continuam a labuta culinária como se nada fosse e o amanhã acabasse com o dia de hoje.
Fritam as filhoses, rabanadas e afins, recheiam os sonhos dos sonhos que têm e comem-nos com vontade de mais... sonhos que teimam em sonhar porque é Natal e o homem é bom, fraterno e leal, apenas um breve momento num breve Natal.

Maria Cepeda

  

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