terça-feira, 5 de dezembro de 2023

ESPEREI POR TI



Esperei por ti

Horas imensas

Buscando noites

Luas suspensas


As noites passaram

Em horas incertas

Dores cruzaram

Ilhas desertas

 

Eu aqui,

Imersa em mim,

Caminho por ti

Serenando desejos

Semeando ensejos

Vivendo tristezas

Dirimindo certezas

Acumulando horas

Fingindo demoras

 

Noites e dias

De mim fugia

Sonos e sonhos

Por vezes medonhos

A dor vem tardia,

Segura e atuante

finge melodia.


Maria Cepeda

 

sábado, 21 de outubro de 2023

A IDENTIDADE REGIONAL DO INTERIOR NORTE (Ernesto Rodrigues)


A descentralização «nunca estará acabada», afirmou o primeiro-ministro em 30 de Setembro de 2023, no Seixal, na abertura do XXVI Congresso da Associação Nacional de Municípios Portugueses. António Costa nunca fala de regionalização, como pretendem os autarcas – e, em especial, os de uma região que constitui um sétimo do poder camarário no Continente.

Há uma «identidade do lugar» que a História e a Geografia definem como fronteiras, marcando «a noção de território e da diferença», segundo José Mattoso (Portugal – O Sabor da Terra. Trás-os-Montes, Lisboa, 1997: 7). Marão, Alvão, Cabreira e Gerês separam do Minho; o rio Douro, das Beiras. No curso internacional deste e da serra de Montesinho à do Larouco (com o Gerês, as de maior altitude no Continente, após a serra da Estrela) correm as comunidades de Castela e Leão e da Galiza.

A designação geral ‘Trás-os-Montes’, de uso mais comum a partir do séc. XIII, ainda se dividia, no séc. XII, por Leão, sob influência de Zamora e dos Templários, a par da dos cistercienses galegos sobre Pitões das Júnias, até à Vilariça, do influxo de Moreruela sobre Miranda, e, até aqui e Vinhais, dos beneditinos de Castro de Avelãs, em cujo mosteiro está sepultado Nuno Martins de Chacim (finais do séc. XIV), o último braganção, avô materno de Inês de Castro. O arcebispado de Braga influía até Barroso, vales do Tâmega e Corgo. Os Bragançãos (ou Braganções) inclinam-se para D. Afonso Henriques e tornam-se decisivos até

D. Dinis.

Em tempo de D. Manuel, Trás-os-Montes é uma das seis comarcas do reino, percebida, pois, como sui generis, até hoje. A política de forais, póvoas e ‘vilas novas’ organiza e sedentariza populações; os castelos vão passando de mãos numa fronteira fluida. Alheios à guerra, galegos e portugueses misturam-se em Ruivães, Vilar de Perdizes, Rio de Onor, etc., conforme os numeramentos de 1530 e o tombo da demarcação fronteiriça de 1538. Propõe-se a divisão do couto misto da raia de Montalegre somente em 1859.

A violência dos elementos – terra dura (salvo nas veigas: Chaves e trechos da Terra Quente nordestina), clima contrastante –, é «pacificada pelo trabalho imperceptível e incansável do tempo», de que resulta o «carácter intocado, “natural”, da paisagem». Em síntese de Mattoso: «Trás-os-Montes é, pois, simultaneamente, a terra da natureza intacta, das grandes violências, da energia acumulada e do “tempo longo”.» (p. 7)

As dificuldades, que outras províncias ibéricas do século V também conheceram – o bispo Idácio de Chaves conta na sua Crónica, finda em 469, como a razia das invasões bárbaras, com os Vândalos dominando a Galiza, foi acompanhada de pestes e fome, dos humanos fazendo antropófagos –, criaram formas de resistência e solidariedade, além de variedades de uso comunitário agora extintas: o boi e forno do povo, coutos e vezeira (guarda do gado por todos).

A riqueza aurífera dos séculos I e II foi desaparecendo, e só a exploração do volfrâmio reanimou com a Segunda Guerra Mundial; outros minérios valem menos do que os cereais, o vinho, o azeite, a amêndoa, a castanha, os enchidos, as águas minerais, insuficientes para atrair ou reter populações, como não retiveram as indústrias da seda e linho, em Setecentos, nem as termas hispano-romanas e oitocentistas, e as muitas barragens do Douro (que sacrificaram povoações, além dos trabalhadores: ver as condições de vida destes, nos anos 50, em Telmo Ferraz, O Lodo e as Estrelas, 1960). A oliveira das baixas de Mirandela, a par de Freixo de Espada à Cinta (também com pão e vinho), é já memorada na Geografia d’Entre Douro e Minho e Trallosmontes (c. 1549), do Doutor João de Barros.

Entendemos melhor a região de Trallosmontes à luz das três condições na definição de cultura, segundo T. S. Eliot (Notas para a Definição de Cultura, Rio de Janeiro, 1965: 16): uma «estrutura orgânica» assente em classes sociais e transmissão hereditária; a especificidade geográfica, ou «regionalismo», desembocando em «culturais locais»; a religião, com seus cultos e devoções. «O principal canal de transmissão de cultura» (p. 43) é a família, conceito que salta facilmente as paredes de um lar para formas colectivas. Assim se explicam estudos continuados sobre o romanceiro; sobre a oratura em prosa; o teatro popular; sem esquecer o disperso cancioneiro de redondilha maior, a pedir balanço, confrontadas as quinhentas densas páginas do Cancioneiro Popular Transmontano e Alto-Duriense (1966), de Guilherme Felgueiras.

Sirva-nos o índice geral deste para entendermos, numa Europa que se pretende de regiões, esta pequena parcela. O quotidiano é de relação: com a múltipla natureza, os mundos animal e vegetal, entre galanteios e requebros, arrufos, chacota, «penas de amor», relação que fundamos em três núcleos essenciais: vida social e moral, incluindo-se, aqui, os costumes; vida material; linguagem.

Na vida social e moral, convergem bodas, baptizados, ritos fúnebres, demandas, entre outros eventos; com datas fixas, há cerimónias religiosas, festas, Entrudo, e houve o Galo do professor; constantes, não raro conjugando-se, são, por exemplo, a má-língua e o serão. Este associa transmissão em família e região. Estamos no seio da cultura intersocial.

Esta acrescenta uma componente instrumental, um saber-fazer, na passagem à vida material: além da cultura da terra (sentido literal de cultura) e suas técnicas, além de ofícios ou indústrias caseiras, somem-se adornos e trajes, alimentação, iluminação, etc. De tudo isto dá conta, miudamente, a leva de etnólogos, sociólogos e historiadores (também das mentalidades, da cultura, da comida). O estado de conservação seduz, para lá de paredes que ecoam “Entre quem é!”. Não menos actua a literatura, alargando o leque das potencialidades. Estas residem na linguagem, parcial repositório do que acabei de enumerar.

O que, no tocante às línguas – entidade donde manam linguagens (lá iremos) –, tem a região de diversidade, tem de unidade em matéria de religião. Responde ao voto final de Eliot, pois, «sem uma fé comum, todos os esforços para unir mais as nações, em cultura, não poderão produzir mais do que uma ilusão de unidade» (p. 82). Esta visão medieval vazou-se em catolicismo apostólico romano, jamais imune ao paganismo de rituais festejados pelos mais crentes, a par de crendices e bruxedos, de medicina popular combatida pela Igreja e Universidade desde o século XIII, de pactos com o Diabo e tentações da carne que arrepiam serafins. Veja-se como o cónego Ochoa, que dá título (2007) a A. M. Pires Cabral, desonra a filha do feitor Querubim, Gervásia. Aproveito a personagem Herculano para dizer como se reforça a palavra da rua, a atmosfera de merenda à lareira, e, por breves histórias interpoladas, se oferece um quadro aldeão disputado entre igreja e taberna. Citei quatro lugares de eleição, em que a igreja não tem primazia.

É extraordinário, entretanto, ver reunidas família, região e religião em dois núcleos: nos santuários, ermidas e ex-votos que pontuam a geografia; e na figura do padre-escritor, quase sempre obscuros abades vivendo do seu passal ou da côngrua. Novos tempos alteraram este imaginário oitocentesco.

Santuários, ermidas e nichos devotos vêm do tempo de Panóias romanizada, coetâneos de pontes e vias romanas – reformadas em finais de Setecentos, com o provimento de fontes e novas estradas reais –, antes de chegarem os caminhos de Santiago, com que a região se transladava em romarias, feiras francas (de um ou dois dias por mês, quando não de três, na dos Santos, em Torre de Dona Chama; eram, sobretudo, de gado), e se ligava à Europa. O comboio, hesitante, veio e foi-se entre 1906 e 1992. Modernas vias, por ar e terra, não fixam gente.

Entretanto, outros cultos primitivos sobrevêm, documentados nos berrões/berroas, associados ao pelourinho. Seria preciso estudar castros, antas, dólmenes, etc., face ao êxito das antigas festas do solstício de Inverno, agora recuperadas – na antropologia, na geografia, na engenharia e arquitectura, no cinema, no documentário, na ficção, nas artes plásticas, na caricatura, na fotografia. Padres houve que foram além de curas de almas e melhor organizam um imaginário, em que o santo-e-senha é Francisco Manuel Alves: se os 11 volumes (desde 2002, com um décimo segundo de índices) das Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança (1909-1947) realçam, no título, Arqueologia e História, não esquecem Bibliografia, Toponímia e demais domínios da investigação local, incluindo um par em que a região a todas sobreleva – na Língua e suas falas, e na Literatura Oral e Tradicional.

Onde buscar, entretanto, o peso ou o sentido de região à luz do estrato cultural que é a literatura, cujo universo referencial fugidiamente descrevi? Na linguagem. Terra de duas línguas oficiais, português e mirandês, tem registados, quando não pronunciados, os falares barrosão, sendinês, guadramilês e rionorês, ou riodonorense. Quer-se mais diversidade linguística?

Ora, é face à regra e sua reversão, à pronúncia oblíqua e seu registo, ao novidoso vocábulo, servindo um olhar de alturas e abismos a verter, que esteticamente se perfila e transmite um conjunto particular de imagens em que nos solidarizamos, seja neste chão ou nas comunidades deslocadas. O nosso mundo é «em qualquer Brasil», disse Torga, em conferência de 1948 sobre “Teixeira de Pascoaes”: «Nascemos aqui, mas nascemos desterrados, reais ou potenciais, e sempre com parte do sangue no exílio. Todos temos um irmão, um filho, um primo ou a família inteira em qualquer Brasil.» Nessa conferência, “Trás-os-Montes no Brasil”, lida no Centro Transmontano de São Paulo e no do Rio, em 14 e 16-VIII-1954 – onde surge o célebre «O universal é o local sem paredes» –, é um paradoxo notável afirmar que a «realidade sem muros», que eu traduzo em região da cultura (e, nela, de uma literatura peculiar), realidade paralela a «qualquer Brasil», era a região com mais muros e muretes: Trás-os-Montes...

História, Geografia e uma singular Cultura sobreviva (nos idiomas e suas variações, numa antropologia de quotidiano resistente e solidário) trazem identidade a um território que se prova voltado para o mundo e, desde logo, para Espanha. A emigração dos anos 60 foi uma tábua de salvação; mas quase 50 anos de democracia são mais do que 48 de Estado Novo e as estatísticas mostram que, entre 1960 e 2021, os 34 concelhos de Trás-os-Montes e Alto Douro (na desejada regionalização, falaremos em 40) passaram de 692 029 habitantes para 384 410, seja, de 7, 82% para 3, 74% do todo nacional, quando representam mais de dez por cento dos municípios. Nas eleições legislativas de 1976, Bragança elegeu cinco deputados; agora, elege três; Vila Real veio de sete para cinco. Seja, perderam-se quatro deputados, e as respectivas distritais não parecem preocupadas.

Deixando de lado a ladainha dos serviços públicos extintos ou subtraídos; considerada, histórica e culturalmente, a singularidade de uma região objectivamente abandonada pelos sucessivos poderes e suas promessas ocas, é sensato concluir que as médias cidades da região provaram já uma invejável capacidade de governo, desde o ensino superior à segurança e qualidade de vida sustentável, em que Bragança é modelar, em termos europeus.

Dói, todavia, que os responsáveis adiem o cumprimento da Constituição, e que a Assembleia da República, de posse de um documento fundamental do IPPS-ICTE (2019) sobre a organização do Estado e as competências dos municípios, não leia sabiamente os resultados: «A maioria dos autarcas quer a regionalização e órgãos diretamente eleitos nas regiões e áreas metropolitanas, mas não nas CIM». Percentagens: criar regiões no curto prazo defendem 77 por cento dos municípios; regiões administrativas com órgãos próprios eleitos directamente: 84 por cento. «A regionalização é uma ambição transpartidária», com 100 por cento de votos da CDU, 85 por cento do PS, 67 por cento do PSD e CDS. À pergunta se as regiões devem ser criadas no curto prazo, o litoral diz que sim (75 por cento) e o interior sobe aos 80 por cento. Perante este quadro, não se avança porquê?

Fiz-me leitor constante, ultimamente, do programa eleitoral do PS para 2022-2026. Na 3.ª parte, “Desafio estratégico: desigualdades”, o capítulo V, “Coesão territorial”, promete: «Tornar o território mais coeso, mais inclusivo e mais competitivo; Corrigir as assimetrias territoriais; Atrair investimento para o interior; Diversificar e qualificar o tecido produtivo; […]; Promover a fixação de pessoas nos territórios do interior; Afirmar os territórios fronteiriços; Assegurar serviços de proximidade.» Reconhecido um «estatuto especial», garante «infraestruturas rodoviárias de proximidade, nomeadamente no âmbito do PRR», e promove «a mobilidade transfronteiriça» com «serviços de transporte a pedido», sem jamais falar da indispensável ferrovia. Não se vê como coadunar isto com a seguinte entrada: «Implementar com Espanha a Estratégia Comum de Desenvolvimento Transfronteiriço, no âmbito do próximo Quadro Financeiro Plurianual, reposicionando o interior de Portugal como espaço de uma nova centralidade ibérica.» Face às perdas em 49 anos de democracia, como reposicionar o Interior Norte enquanto centralidade ibérica sem a experiência da regionalização, que maiorias tão claras defendem? Porquê tresler a Constituição e travestir a regionalização em descentralização sem fim à vista?

 

*Universidade de Lisboa. Escritor.

quarta-feira, 18 de outubro de 2023

Anúncio e Entrega do Prémio Literário da Lusofonia Professor Adriano Moreira – 3.ª edição (Academia de Letras de Trás-os-Montes)

Decorreu no dia 13 de outubro, pelas 18:00 horas, na Sala de Atos do Teatro Municipal de Bragança, o anúncio do vencedor do Prémio Literário da Lusofonia Professor Adriano Moreira – 3.ª edição, modalidade poesia. O premiado é o poeta algarvio e advogado Fernando Cabrita, com a obra inédita “Língua Portuguesa”, apresentada a concurso sob o pseudónimo de Pierre Vidal. O Prémio consiste numa obra do escultor António Nobre, de um diploma e, este ano, do valor pecuniário de cinco mil euros, da responsabilidade da Câmara Municipal de Bragança.

Dando início à cerimónia, o Presidente da Câmara de Bragança, Hernâni Dias, além dos agradecimentos a todos os intervenientes no processo e alusões à relevância do Prémio, referiu a importância da língua e da comunidade lusófona, aliando-a à construção do Museu da Língua, em Bragança.

Na intervenção, que se seguiu, o Presidente do Conselho de Curadores da Biblioteca Adriano Moreira, António Jorge Nunes, fez um breve historial do Prémio, das várias edições e seus premiados, destacando a proeminência do patrono do Prémio Literário, Adriano Moreira.

Intervindo em nome de todos os elementos, o membro do júri, António Bárbolo Alves, na sua breve preleção, elogiou o trabalho vencedor e dedicou particular atenção à poesia, e ao processo de seleção dos vários trabalhos recebidos.

Finalmente, teve a palavra o premiado, Fernando Cabrita, que deu a conhecer um pouco do seu percurso literário, as suas referências, as razões de ter concorrido a este prémio e a honra de receber este prestigiado galardão.

O júri, constituído pelo jornalista Luís Osório, pelo Doutor António Bártolo Alves (ALTM), Doutor Henrique Manuel Pereira (Diocese Bragança-Miranda), Doutor Carlos Manuel da Costa Teixeira (IPB) e Doutor João dos Santos Cabrita da Encarnação (CMB), avaliou, com total empenho, disponibilidade e rigor, num curto espaço de tempo, o elevado número de trabalhos candidatados, sacrificando outros compromissos profissionais e pessoais, tarefa que merece ser notada e reconhecida.

Inserida na programação do LUSOCONF 2023– V Encontro Internacional e Língua Portuguesa e Relações Lusófonas, que incluiu um recital de poesia pelo ator André Gago, acompanhado, na harpa, por Manuela Nicoli, marcaram presença na cerimónia o Presidente da Câmara Municipal de Bragança, Hernâni Dias, o executivo camarário, o Presidente do Conselho de Curadores da Biblioteca Adriano Moreira, António Jorge Nunes, a Presidente da Academia de Letras de Trás os Montes, Assunção Anes Morais, o Presidente do IPB, Orlando Rodrigues, o representante da Diocese Bragança-Miranda, o Bispo Dom Nuno Almeida, os membros do júri, Carlos Teixeira, António Bárbolo e João Cabrita, associados da ALTM e público em geral, a título pessoal ou em representação de instituições civis e militares.

A entidade promotora deste prémio é o Conselho de Curadores da Biblioteca Adriano Moreira, sendo a Academia de Letras de Trás-os-Montes a entidade dinamizadora, em colaboração com o Município de Bragança, a Diocese de Bragança-Miranda e o Instituto Politécnico de Bragança.



 BREVE CURRÍCULO

Fernando Manuel da Cruz Cabrita é natural de Olhão, onde reside. Entre poesia, crítica literária e ensaio, tem publicados mais de quarenta títulos em Portugal, Espanha, França, Porto Rico, Rússia, Turquia e Marrocos, além de publicações em vários revistas nacionais e internacionais e poesia musicada pela cantora Viviane, pelos “Entre Aspas” e pelo Projeto Camaleão Azul. Está traduzido para castelhano, francês, russo, turco, polaco. A sua obra já recebeu oito Prémio Literários, entre os quais o Prémio Nacional Silex, em 1980; Prémio Cidade de Olhão, em 1987; Prémio João de Deus, em 1995 e 1997; Prémio Mário Viegas, em 2008; Prémio Internacional de Poesia Palabra Ibérica, em 2011.

Tem sido conferencista convidado em colóquios internacionais sobre temas literários e históricos, referentes a temas sobre civilização tartéssica, vivência sefardita e literatura atual algarvia e andaluza. Desde 2015, é o organizador do Festival Internacional “Poesia a Sul”, e tem sido convidado a representar a Poesia portuguesa contemporânea em Encontros e Festivais Internacionais em Espanha, Franca, Irlanda, Porto Rico, Marrocos, Bélgica e Turquia.

Entre os vários títulos publicados, destacam-se: “O Portão das Colinas do Nada” (Poesia), Sintra, 1988; “Noites de Sevilha” (Poesia), Portugal, 1995; “Um cão que engoliu uma bola de golfe” (crónicas), Portimão, 2008; “O Livro da Casa” (Poesia), Santarém, 2008; “Ode à Liberdade” (Poesia), Portugal/Espanha, 2011; “O que dizem os poetas algarvios e andaluzes de agora” (Crítica literária); Portugal, 2015; “O livro da casa” (Poesia); Moscovo, 2020; “Alguma Poesia Espanhola Contemporânea” (Crítica literária), Portugal/Espanha, 2020;”Caderno de Istambul” (Poesia), Turquia, 2023. 









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segunda-feira, 11 de setembro de 2023

SEM SOMBRA

Não me posso esconder

Mar ao largo

Não o posso ter

Se fosse gaivota

Talvez voasse

Talvez gritasse o aperto que trago

enclausurado no peito

Talvez em sombra me transformasse

Se a luz me enjeitasse.


 Maria Cepeda

quinta-feira, 6 de julho de 2023

“TEMOS QUE LUTAR PARA QUE A FERROVIA VOLTE A PREENCHER ESTE VAZIO QUE FICOU NO TERRITÓRIO” ((27/06/2023) Retirado de www.jornalnordeste.com)


Jorge Nunes, presidente da Câmara Municipal de Bragança, de 1998 a 2013, apresenta, na próxima semana, o livro a “Ferrovia em Trás-os-Montes, memória do passado, luta do presente”. O ex-autarca, Comendador da Ordem do Infante D. Henrique, é um dos maiores defensores do regresso do comboio à região. Em entrevista ao Jornal Nordeste esclareceu defender que o que verdadeiramente interessa ao território é uma via com ligação internacional, de alta velocidade, de transporte misto, de bitola europeia, para servir o futuro, o desenvolvimento, a coesão e a competitividade da região.

Apresenta, na quarta- -feira, dia 5, em Bragança, o livro “Ferrovia em Trás-os-Montes - Memória do passado, luta do presente”. Comecemos por falar do passado, a chegada do comboio a Trás-os-Montes representou uma revolução no transporte de pessoas e de mercadorias. Como foi, para a região quando tudo isto se perde, sendo que Bragança foi a última localidade a ter ferrovia e a primeira perdê- -la? Naquela altura, a ferrovia já não era competitiva, mas levá-la, de todo, embora foi a melhor opção?

A luta dos transmontanos para poderem aceder ao comboio, foi muito persistente. Lisboa teve o primeiro troço de ferrovia inaugurado em 1856 e ao concelho de Miranda do Douro chegou 85 anos depois de se ter iniciado a sua construção no país. A província, constituída pelos distritos de Bragança e de Vila Real, foi a última a aceder à designada viação acelerada, que na via estreita atingia a média de 20 km/h. Ainda assim, comparativamente ao que era o transporte por tração animal, de mercadorias e de pessoas, era uma grande revolução, para o desenvolvimento da economia do país. Trás-os-Montes, sendo o último território a dispor do acesso ao comboio, foi ficando para trás e perdendo oportunidades de desenvolvimento. A ferrovia em Trás-os-Montes, estando já construída no resto país, veio a concretizar- -se num período extremamente difícil, em termos políticos e económicos. Apanhou a crise de 1890, agravada com o Ultimato Inglês, decorreu uma década para que o país conseguisse negociar um plano de financiamento com credores estrangeiros. De seguida veio a queda da monarquia, a instalação da 1ª República, a Grande Guerra, o fim da 1ª República, a instalação da Ditadura Militar e o Estado Novo. É já durante o Estado Novo, em 1938, no início da Segunda Grande Guerra que termina a construção do plano ferroviário em Trás-os-Montes, com a inauguração da Estação de Duas Igrejas. A construção lenta e em via estreita, com características geométricas de traçado que não permitiam velocidades elevadas e diminuíam a segurança, atrasavam o processo de transporte que, na década 30, estava já num processo de competição com a introdução do automóvel no país, adicionando o facto de as três linhas em Trás-os-Montes terem ficado como linhas terminais, sem ligação à rede ibérica. Tudo isso contribuiu para que a ferrovia acumulasse prejuízos, de ano para ano, não servindo, de todo, o desenvolvimento futuro desta região. Mesmo assim, a ferrovia rompeu com a interioridade e criou uma oportunidade enorme, como o território nunca tinha tido. O comboio serviu, durante décadas, para o transporte de pessoas e de mercadorias. À volta ferrovia foram construídas infraestruturas relevantes de apoio à atividade económica, como sendo no armazenamento e escoamento de cereais, construção de silos, de armazéns, de infraestruturas para o escoamento de batata e de ferro das minas de Torre de Moncorvo, de onde saíram milhares e milhares de vagões de minério. A estação de Carvalhal foi a mais rentável da província. Dali foi feito muito transporte, até ao Pocinho, onde o minério era baldeado para vagões da via larga. Mais um erro que acumulou na decisão de não construir uma via larga na linha do Sabor, que também foi o meio de transporte para milhares de operários e muitas dezenas de milhares de toneladas de materiais para a construção das barragens do Douro Internacional. A ferrovia para melhorar resultados e competir com o automóvel, necessitava de modernização de traçado e do material circulante. Isso não ocorreu, e entrou num processo de declínio até ao seu encerramento. O processo de encerramento iniciou na década de 70, com a realização de estudos sobre a rede em via estreita, tendo em vista ou a modernização ou o encerramento, com substituição de transporte para autocarros. Este processo foi suspenso com o 25 de Abril e foi retoma-do em 1980, numa tentativa de transferir encargos financeiros para os municípios. Em 1984 foi decretado o regime simplificado de exploração ferroviária na via estreita, e a situação agravou-se. Este plano previa o encerramento de 180 estações e apeadeiros e de algumas linhas. O processo acelerou a partir de 1988, com o plano de modernização da rede ferroviária, a nível nacional, apostando na via larga, é decidido o encerramento da via estreita. A região empenhou-se contra o encerramento, particularmente na linha do Sabor e do Tua. As populações manifestaram-se, barricaram estradas e bloquearam autocarros, mas todo este processo de contestação não resistiu a uma situação política que tinha sido em parte negociada com responsáveis políticos a nível regional. O pretexto foi erradamente marcado pelo déficit de exploração na via estreita, insignificante face ao déficit global da CP e pelas reformas exigidas em prejuízo do Interior, numa atitude de injustiça com os transmontanos. A região foi fraca em poder reivindicativo, colaborou com uma decisão de encerramento a pretexto de melhorias na rede rodoviária. Poderia ter sido exigida a modernização da ferrovia em Trás-os-Montes ou até a construção de linhas modernas, capazes de ajudar a região a progredir para o futuro e não, condená-la a um processo de isolamento, mais incentivador do despovoamento. Ou seja, o encerramento da ferrovia foi uma má decisão para a região.

Porque é que decidiram simplesmente acabar com isto e não modernizar. Porque é que se esqueceram de nós?

Esqueceram-se de nós na ferrovia como se têm esquecido em muitas outras situações. Os efeitos negativos do centralismo não são recentes. Na década de 1980 e seguintes, com problemas financeiros, e a exigências de reformas impostas por credores externos, o país tomou um conjunto de decisões, de racionalização de vários serviços, não só da ferrovia, atingindo sempre de forma negativa o Interior, esvaziando-o de serviços, reforçando o centralismo. Trata-se de uma questão política que tem por base a racionalidade dos números e não uma exigência de coesão e presença soberana do Estado no território.

O regresso da ferrovia a Trás-os-Montes deve contemplar o que?

Em cada momento devemos defender o que nos compete e o que é viável. Compete-nos defender o regresso da ferrovia com uma rede moderna, que se integre com a rede europeia, nomeadamente uma nova linha ferroviária ligação à rede espanhola, por Bragança-Vila Real-Porto, mas também na ligação pelo Interior, ligando Macedo-Pocinho-Vila Franca das Naves, justificável na perspetiva de ligação longitudinal entre dois corredores ferroviários internacionais: Porto-Vila Real-Bragança- -Valladolid e o corredor da Beira Alta. Justifica-se que a linha do Douro, que fechou já há um bom par de anos, entre o Pocinho e Barca d’Alva, seja requalificada e eletrificada, tal como a linha do Corgo. O que nos compete fazer neste momento é lutar pela inclusão de Trás-os-Montes no novo mapa de rede ferroviária 2030, sem esquecer que, em fase posterior, será necessário lutar pela sua concretização. E ter presente que há infraestruturas rodoviárias que são essenciais e não estão concretizadas. O mesmo acontece a nível aeroportuário. A ligação Bragança-Puebla de Sanabria, que muito tarda em ser concretizada, é essencial para desencravar e dar permeabilidade ao território do Nordeste. Bem como a melhoria da ligação Bragança-Vimioso e Bragança-Vinhais. São reivindicações que têm anos. Também não podemos esquecer a urgência de continuação da autoestrada A4 de Quintanilha a Zamora. Esta é a nossa luta, neste momento, visando o crescimento da economia e o combate ao despovoamento.

Considera que vamos ganhar este processo?

des tendências, como o caso das alterações climáticas, que influenciam grandes decisões de política pública. A Europa aposta na descarbonização da economia. Isso significa, entre outras decisões, utilizar meios de transporte de pessoas e de mercadorias menos poluentes, com menos emissões de dióxido de carbono para a atmosfera. Sendo a ferrovia um meio de transporte de grande escala, seguro e amigo do ambiente, será uma boa solução, necessária para este território, para nos colocar no bom caminho da descarbonização da economia, tornando-nos mais competitivos, e mais atrativos para a fixação de atividade económica e de empregos qualificados, neste que é o território ambientalmente mais qualificado no país. É uma luta essencial e, sendo alinhada por decisões prioritárias da União Europeia, acredito que haverá condições de vontade política para a poder vir a incluir no mapa ferroviário e, em fase posterior, iniciar um processo de calendarização, tendo em vista a sua construção.

Em Fevereiro, de passagem por Bragança, o secretário de Estado das Infraestruturas disse que a associação Vale d’Ouro mostrou que é possível voltar a trazer o comboio para Trás- -os-Montes, de forma viável, mas para não se ter ilusões de que isso iria acontecer já amanhã. Questionado sobre o facto de se poder começar o plano nacional por aqui, disse que primeiro é preciso estruturar a espinha dorsal do país. Portanto, os distritos de Bragança e Vila Real foram os últimos a beneficiar da viação acelerada e agora podem voltar a ficar nessa posição. Como vê a situação?

Trata-se de um investimento elevado, não se concretiza de um momento para o outro. O tempo passa muito rápido e se nós conseguíssemos ter a ferrovia de regresso a Trás-os- -Montes dentro de duas décadas seria bom. Não penso que seja uma decisão desfasada no tempo, o facto de o secretário de Estado dizer que não é para amanhã. Mas para amanhã, no meu ponto de vista, é a exigência da inclusão no mapa ferroviário nacional, com ligação internacional e não como fim de linha. Essa é a primeira grande conquista que temos de alcançar. A segunda começar a lutar pela calendarização do investimento. Compreendo as prioridades definidas no país, as que servem mais economia e população, sendo que a ligação Porto- -Vila Real-Bragança-Valladolid é inquestionavelmente estruturante para o Norte de Portugal, em termos económicos e de mobilidade da população, que serve de forma mais significativa a competitividade global da região Norte, mesmo em relação a outras alternativas previstas. A primeira proposta que foi feita ao Governo da Monarquia, em 1845, por parte de uma empresa francesa que, na altura, era concessionária e explorava a linha de Madrid a Valladolid, foi de uma ligação internacional ferroviária de Lisboa às capitais europeias, com um traçado que previa a saída de Lisboa e seguiria Porto-Bragança-Valladolid. A nossa perspetiva não é uma reflexão nova. Vai fazer dois séculos. Mas ainda aqui estamos, com entusiasmo, a lutar por esta ligação e por justiça para o Nordeste Transmontano. Há três décadas que Trás-os- -Montes está excluído do mapa ferroviário do país e temos de lutar para que a ferrovia volte a preencher este vazio erradamente criado neste território.

No Conselho Raiano, na semana passada, em Bragança, falou-se muito de pressão. Pressão defendeu-a o presidente da Associação Vale d’Ouro e o deputado socialista eleito por Bragança. É da mesma opinião? Quem deve fazer essa pressão? Que meios têm os cidadãos para o fazer?

Antes de mais, o processo tem vindo a evoluir. A primeira versão de discussão da ferrovia 2030 trazia uma linha por Trás-os-Montes com um grande ponto de interrogação. A segunda e última versão já trazia uma ligação sem ponto de interrogação e um tracejado na ligação até à fronteira. Acho que a versão definitiva tem de contemplar esta ligação como uma ligação internacional. É preciso manter pressão como em qualquer reivindicação que se faz. Compete aos deputados eleitos pela região, deputados, autarcas e instituições de ensino superior, IBP, UTAD e associações comerciais e empresariais, estarem envolvidos neste processo para tentar acelerar a concretização da ferrovia em Trás-os-Montes. Compete também os cidadãos, através das suas associações representativas e de cidadania, manter de pé esta luta.

E se Bragança for o fim de linha. O que nos acontece?

Uma linha ferroviária, via larga, só até Bragança perde um pouco do sentido. Já noutros tempos, a via estreita, estava condenada ao insucesso, pelo facto de ter ficado como fim de linha. Na atualidade os ventos sopram a favor da ferrovia devido à premência do estado de emergência climática, é necessário reduzir emissão de dióxido de carbono, o transporte de pessoas e mercadorias representa muito em termos de emissões, sendo necessário transferir muito do transporte individual para transporte coletivo não poluente, assim como transferir parte do transporte de mercadorias feito por camiões em estrada para a ferrovia. O que verdadeiramente interessa é uma via com ligação internacional, de alta velocidade, de transporte misto, de bitola europeia, para servir o futuro, o desenvolvimento, a coesão e a competitividade do território. O fim de linha é uma dificuldade. Temos de recusar essa solução. Temos de pressionar o Governo e os políticos para que nas cimeiras ibéricas seja garantida pelos dois governos o necessário empenho em novas ligações transfronteiriças.

Jornalista: Carina Alves

CRIAÇÃO DE MANUAIS PARA APRENDER MIRANDÊS PODE ESTAR PARA BREVE

         Já há protótipos para a criação dos livros escolares, mas aguarda abertura de candidatura para avançar com projecto

Jornalista Ângela Pais

Estão criadas as maquetes para a elaboração de dois manuais escolares para aprender mirandês.

Este é o resultado de um estudo feito pelo agrupamento de escolas de Miranda do Douro em parceria com a Associação da Língua e Cultura Mirandesa, no âmbito do Plano Integrado e Inovador de Combate ao Insucesso Escolar da Comunidade Intermunicipal das Terras de Trás-os-Montes (CIM-TTM).

De acordo com a técnica da CIM-TTM, Elisabete Afonso, vai ser criado um manual para o primeiro e segundo ano de escolaridade e outro para os terceiro e quatro anos. Os manuais vão designar-se “Cachapim”. “O nome foi inspirado numa ave que se encontra nas Terras de Miranda e que se caracteriza por ser curiosa e irrequieta tal como as crianças”, explicou.

O mirandês foi considerado a segunda língua oficial portuguesa em 1999, mas não tem manuais escolares. Um problema que há muito tempo era apontado pela associação e pelo agrupamento de escolas, onde 70% dos alunos matriculados estão a aprender a língua, leccionada apenas por dois professores.

“Claro que o ideal seria aumentar este número de professores, seria criar um grupo docente da língua mirandesa, que não temos. O ideal seria equipará-la ao ensino das outras línguas e especificar o ensino por ciclos, que é algo que não temos”, realçou o director do agrupamento de escolas de Miranda do Douro. António Santos acrescentou ainda que aguardam a oficialização de uma formação da língua mirandesa para professores, num protocolo que foi criado entre o Ministério da Educação, a Universidade de Coimbra, o município de Miranda e o agrupamento de escolas.

O Plano Integrado e Inovador de Combate ao Insucesso Escolar da CIM-TTM acabou a 20 de Junho. Agora a Comunidade Intermunicipal das Terras de Trás-os-Montes aguarda a abertura de candidaturas da Comissão de Coordenação de Desenvolvimento Regional do Norte para avançar com a realização dos manuais.

O Mirandês aguarda ainda a ratificação da Carta das Línguas Minoritárias, uma convenção que visa promover e proteger línguas regionais ou minoritárias da Europa. Para o presidente da Associação da Língua e Cultura Mirandesa, Alfredo Cameirão, a validação da carta pode pôr em prática muitas das medidas que estão definidas, nomeadamente no que toca à educação.

“Nalguns anos pode passar a ser uma disciplina curricular, poderia não só aprender-se mirandês, com matemática em mirandês, e por exemplo num curso profissional o mirandês funcionar como uma das línguas a serem ministradas, um curso profissional na área do turismo, que seja dado em Miranda do Douro, faz todo o sentido que uma das línguas dadas seja o mirandês”, explicou.

Alfredo Cameirão compreende que há um longo caminho a percorrer, mas a ratificação pode mudar a imagem que se tem do Mirandês, “de uma visão pouco séria, para uma língua séria e que possa estar ao lado de qualquer outra língua que se estuda na escola”.

Recentemente um estudo da Universidade de Vigo concluiu que se nada for feito a língua mirandesa pode desaparecer dentro de 20 anos. 

Retirado de www.jornalnordeste.com


segunda-feira, 3 de julho de 2023

IMPROVISO


Andava um pouco perdida 
a procurar o improviso
que por falta de siso 
não conseguia encontrar.

Tudo se arrastava
indeterminado
neste meu triste deambular
neste mundo esquecido
que não posso sonhar.

Sou um rio sem água
de tantas lágrimas chorar.
Se de improviso
continuo a tentar...
Que triste sorriso
te posso mostrar?


Maria Cepeda