domingo, 9 de março de 2025

Continuação da entrevista realizada ao Doutor Fernando Calado

(F.C.): Vinte contos era uma fortuna!

(M.C.): Uma fortuna!

(F.C.): Nós ficámos com o cheque, mas ninguém acreditou que aquilo tivesse algum valor. Só quando vimos o dinheiro na mão é que acreditámos. Portanto, foi, de facto, a raridade. Portanto, em Trás-os-Montes não havia tantos grupos de teatro assim, o que significava que era uma raridade. E, portanto, foi um património importante na aldeia. Ainda hoje, os mais idosos falam no teatro e na saudade que têm desse tempo do teatro.

Hoje, com o progresso que temos, com as possibilidades que há, não seria possível manter um grupo de teatro em vez de uma cadeia? Na altura era uma pequena fortuna. Mas é pena que não haja quem pegue outra vez na ideia. Aliás, há um organismo que capitulou e teve uma importância enorme na divulgação do teatro e da cultura em Trás-os-Montes, que foi o FAOJ (Fundo de Apoio aos Organismos Juvenis). E o FAOJ foi, de facto, um organismo que criou muitos grupos de teatro, muitos grupos folclóricos, muitos grupos de leitura, mas não só. Hoje, praticamente, a dimensão cultural, a divulgação cultural é inexistente nas nossas aldeias.

O que é que existe? Uma casa do povo, com um bar, com umas festanças, com umas jantaradas, com um pouco mais do que isso. 

(M.C.): Faz-se a festa dos santos que são os oragos e mais nada.  

(F.C.): O aspecto cultural, praticamente, é inexistente.

(M.C.): O que é uma pena. Era bom que alguém lhe pegasse novamente.

(F.C.): Que lhe incutisse uma dimensão cultural, uma política de dimensão cultural… Não há. É uma pena. 

(M.C.): Continuando. Enveredou pela Filosofia, como já disse. O que o levou a seguir esse caminho, veio do Seminário? 

(F.C.): Sim, sim. Aliás, o seminário tinha três secções. Quando se entrava para o seminário, fazia-se o curso de humanidades. No sexto ano passava-se para a secção de filosofia. Portanto, sexto, sétimo, filosofia. Depois, oitavo, nono, décimo segundo, filosofia. Portanto, embora a filosofia que se ensinava nos seminários, embora fosse uma filosofia tomista, ou seja, a filosofia de São Tomás de Aquino, na tradição aristotélica, mas era levada muito a sério. E não há dúvida nenhuma que, embora a filosofia fosse inspirada na filosofia grega, mas dava muita bagagem em termos de formação filosófica. E, portanto, para mim, era mais do que natural tendo eu o sétimo ano do seminário, que a saída natural seria ir para a Faculdade de Filosofia de Braga, onde fiz o primeiro ano. Com a bagagem que eu levava do seminário, consegui fazer num ano, em Braga, dez cadeiras. O que significa que no segundo ano pedi transferência para o Porto e a grande maioria das cadeiras da Faculdade de Filosofia do Porto já as tinha feitas, o que significa que depois passei mais quatro anos no Porto e vim fazendo umas cadeiras ou seminários, etc.

Mas a minha formação verdadeira foi o Seminário e a Faculdade Filosofia de Braga dos Jesuítas, que é onde se aprende Filosofia.

(M.C.): Também os jesuítas. Ora, muito nos ensinou já. Permita-me que passe à próxima pergunta. A sua vida profissional está profundamente ligada ao ensino e à coordenação de órgãos diretivos relacionados com a sua formação académica, mas não só. Fale-nos do seu riquíssimo percurso. 

(F.C.): Eu terminei o curso na Faculdade de Filosofia do Porto. Entretanto, interrompi para ir fazer o Serviço Militar e quando saí do Serviço Militar, ainda me faltava uma cadeira ou duas para ter a licenciatura. Já tinha o bacharelado. Portanto, fui terminar a licenciatura e foi curioso como comecei a minha vida profissional. Estava no Porto a terminar o curso e apareceu lá o Padre Marcelino, o Diretor do Ciclo Preparatório que não era capaz de arranjar um professor de música.


CONTINUA

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