MC: Estudou em Bragança. Fez engenharia na Universidade do Porto. Porque engenharia? Fale-nos um pouco do seu percurso estudantil.
ENG. JN: Desde muito pequeno tive que ajudar nas tarefas da agricultura… tínhamos que fazer tudo o que era necessário, trabalhar nas hortas, nos campos, guardar os animais, trabalhos que se faziam como há séculos. Desde jovem apercebi-me que muitas das dificuldades inerentes a alguns trabalhos deviam ser superadas… isso despertou-me para a necessidade de alguma modernidade, algum engenho que beneficiasse as actividades que era preciso desenvolver. Essa perspetiva, mais tarde o facto de ainda enquanto estudante no Liceu e até concluir o curso de engenharia, trabalhar com máquinas agrícolas, trator, ceifeira e malhadeira, fazendo a campanha das ceifas e das malhas em aldeias como Nogueira, Carrazedo, Ousilhão e Refoios, acompanhado de um empregado com mais um bom par de anos do que eu, trabalhos que fazia em férias, todos os anos, até concluir os estudos de engenharia. A malhadeira está guardada e parada em Refoios, há cerca de 40 anos. Os meus pais sabiam da arte da lavoura, não sabiam orientar-me nos estudos a seguir. Talvez essa curiosidade inicial tenha sido o início do caminho que me levou ao curso de engenharia. Fui o único irmão que estudou. Éramos quatro. Não havia recursos para todos o poderem fazer.
ENG. JN: Quando nasceu o irmão mais velho, a vida já
era difícil. Os meus pais colocaram-no no seminário em Vinhais, o que faziam
muitas famílias que, com as dificuldades para criar os filhos, iam pela
perspectiva da igreja para encontrar um novo caminho, uma mão estendida para
poder aliviar o encargo da família, mas ele, passados dois ou três meses fugiu
a pé de Vinhais para a aldeia e não se perdeu no caminho. (Risos) Tentei ajudar
nos estudos o irmão mais novo, que acabou por abandonar o Liceu nos primeiros
anos. O irmão mais novo, em particular o mais velho, são pessoas reconhecidas
pelo trabalho que tem feito, contribuem muito, como poucos, para o desenvolvimento
da economia rural.
Enquanto frequentei o Liceu, ao escolher a alínea de
ciências, acabei por consolidar a opção de seguir engenharia. Como as
dificuldades da família para que pudéssemos estudar eram grandes, dirigi-me à
Academia Militar, onde pensava poder estudar sem pagar.
Viajei sozinho para Lisboa, onde nunca tinha ido. Fui
de comboio. Foi uma viagem de muitas horas. Cheguei a Lisboa e, na estação de
Santa Apolónia, perguntei onde ficava a Academia Militar. E… bom… Não conhecia
absolutamente nada. Lá fui perguntando e fui andando a pé, pensando que era
coisa de poucos metros, pouco mais do que ir da minha casa até à igreja, no
fundo da aldeia. Lá fui andando, andando, pensava que era perto, até que
cheguei. Quem me atendeu foi o militar de sentinela. Perguntou-me o que
pretendia, respondi-lhe que queria inscrever-me na Academia Militar para tirar
o curso de engenharia. Ele perguntou-me se tinha algum familiar no exército que
me recomendasse. Disse-lhe que não tinha ninguém. “Então está despachado!” (Risos)
E assim foi. Restou-me a alternativa de me inscrever na Faculdade de Engenharia
do Porto.
Tirei o curso nos cinco anos previstos e trabalhei,
para ajudar ao esforço dos meus pais, que hoje considero ter sido enorme face
às circunstâncias de vida, aos poucos recursos que a agricultura proporcionava.
Fiz um pouco de tudo, desde vender livros do Círculo de Leitores, na cidade do
Porto; trabalhei num gabinete de arquitetura e engenharia na altura em que
estavam a desenvolver projetos de reabilitação dos bairros degradados. As
ilhas, era assim que se chamavam. Fiz levantamentos gráficos numa área da
cidade. Já dominava conceitos de topografia e outros conhecimentos que me
permitiam fazer trabalhos básicos de engenharia. Trabalhei no Bairro Parceria
Antunes, onde hoje está o Centro Materno-Infantil do Norte. A vida não foi fácil,
mas eu queria tirar engenharia e assim foi no ano de 1978.
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