Embora este seja o inquietante risco da paz
global, tem exigência e sentido mostrar, e apreciar, tradições que ligam o
passado ao futuro reconduzindo ao equilíbrio e à paz, com interventores cujo
exemplo assegura, por exemplo, que as intervenções do Papa Francisco aparecem
gratificando a esperança de todo o género humano, independentemente da fé, da
etnia e da cultura identificadora. Entre essas culturas reapareceu a adesão à
importância da língua portuguesa com o sinal que foi dado com a reconstrução do
Museu da Língua Portuguesa na grande cidade de São Paulo, que não dispensou
esse símbolo ao lado das instituições académicas valiosas que possui. A
perceção do significado da reconstrução e da inauguração do museu foi
compreendido e sublinhado pela presença na cerimónia do professor Marcelo
Rebelo de Sousa, Presidente da República Portuguesa, num grupo em que se encontravam
o presidente de Cabo Verde, os ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso e
Michel Temer e a ministra da Cultura de Angola. No discurso do Presidente
português podemos destacar estas palavras que a imprensa recolheu: "Para
não esquecer as cinzas do passado mas a partir delas reconstruirmos o
futuro."
A multidão que assistiu à histórica
inauguração lembra o conceito que um dia veio da intervenção do então reitor da
Universidade de Brasília, que afirmou que assim como Dante foi indispensável
para a identidade de Itália, e Cervantes para a identidade de Espanha, Camões
para Portugal, Gilberto Freyre foi para o Brasil e para a unidade da CPLP. Em
Portugal, aconteceu na cidade de Bragança ser prestada homenagem, com a
atribuição de um prémio literário, a Fabiana Ballete de Cara Araujo, académica
de São Paulo, que pôde ser surpreendida pelo facto de ali estar em construção o
primeiro Museu da Língua Portuguesa no nosso território.
Tratando-se de consagrar também a intervenção
cultural que a riqueza da província deve ao antigo presidente da câmara Eng.
António Jorge Nunes e ao atual presidente, Dr. Hernâni Dias, não pude deixar de
lastimar, junto desses amigos, o impedimento que tenho para ir a Bragança, de
lhes enviar o sentimento que tive lembrado das numerosas e valiosas
instituições culturais que ali se encontram.
Mas o próprio nome do livro da homenageada
Fabiana Ballete de Cara Araujo sobre O Silêncio Guardado nas Horas desperta e
acompanha a persistência com que ali se cumprem os deveres de enfrentar os desafios
das crises que sofremos mas sem nunca dispensar as obrigações que hoje são
sobretudo referidas e pregadas pelo Papa Francisco. Voltando a colocar em vigor
o histórico movimento de Assis, seguros de que a sua importância acompanha o
que se passou em São Paulo, onde não faltou a intervenção do nosso Presidente
da República.
Recordei na carta as palavras do Papa
Francisco, que se articulam com as do secretário-geral da ONU e a mobilização
internacional portuguesa. Tudo lembra também a discutida relação entre passado,
presente e futuro, em que nem sempre pareceu que o passado não é recebido a
benefício de inventário, mas é o legado da geração que se segue que tenta o
legado do futuro da geração que se segue e com a qual não seremos conviventes.
O desafio é estar na criação do legado, sem ignorar que o risco é de não terem
sido eliminados erros.
No que toca à língua portuguesa, e ao
significado particular da reconstrução do Museu de São Paulo, e da construção
do Museu da Língua em Bragança, parece de admitir que não se trata de qualquer
valor imperial que se atribua, e que tem o relevo referente à avaliação e
adjetivação utilizada por Gilberto Freyre em discurso feito em Lisboa, ponto de
partida para o por si criado lusotropicalismo, suscitando livres divergências
intelectuais, que não rodearam ainda os restantes autores europeus citados pelo
reitor de Brasília. A língua não parece implicar conflitos legais, quando em
todos os países que a adotaram, e a nossa, aceitaram e criaram diferentes
inovações. Isto parece tornar mais aceitáveis os que admitem que a língua é
nossa, mas não é só nossa, e a liberdade de inovar é geral, o que é nosso é a
criação e difusão dos valores que permitiram criar a CPLP. O próprio
"credo dos valores" muda as exigências. Lembremos que todos os
membros da CPLP são marítimos, e a situação dos mares exige apoios.
Mas sobretudo é evidente que a guerra da
covid atinge todos os vivos, e os mais carentes necessitam de ajuda. Finalmente
lembremos que é necessário participar com o ensino dos jovens desses países,
que vêm formar-se entre nós, que o seu principal dever é regressar ao apoio dos
seus povos. A nossa solidariedade não é apenas da língua, é também de
humanismo.
Retirado de www.dn.pt
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