Serafim, que criatura
interessante. De corpo direito, aprumado até, com cara longa e perfeitamente
frontal e paralela à nossa, embora disforme, quando nos mirava de olhos bem
abertos numa beatitude desconcertante incutia em nós um misto de empatia e
algum receio também em comunicar. Porém era possível essa comunicação. Dizem
que num nível quase de criança, uma criança grande. Não sei porquê a mim sempre
que ouvi e fotografei parecia-me uma espécie de anjo que conseguia incutir uma
vibração positiva, uma paz também que é pouco comum com a maioria dos
congéneres humanos. Uma simplicidade que não impelia ao dichote, ao desprezo,
ou ao sorriso de rejeição. Por isso não há notícia de alguém o ter molestado
como a outros personagens da nossa vivência comum em Bragança como aconteceu
com o "Leribau" e outros, até com o "Carlinhos da Sé".
Serafim era um ser alegre, que gostava de ir a festas e, se possível, composto
na indumentária se o que possuía o permitisse.
Fotografei-o com o seu transístor
na festa do S. Lázaro quando esta era apenas popular e ainda pouco conhecida;
também frente ao famoso teixo de mais de 500 anos que existe em Bragança no
recinto do antigo albergue distrital aonde lhe davam guarida e proteção. Nasceu
em Vila Flor e faleceu em Bragança em 2019, aonde passou grande parte da sua
vida adulta. Também viveu algum tempo em Benlhevai aonde foi muito acarinhado.
Quem quiser saber mais sobre a história e vida do Serafim consulte o bonito
texto de José Maria Sousa Fernandes no blogue:
https://www.benlhevai.net/benl
Justamente Artur José de Sousa
Fernandes, ligado a Benlhevai, escreveu no mesmo blogue, aquando da sua morte
em 2019, o seguinte: "A grande paixão do Serafim era a sua terra do
coração, Benlhevai. Vivia o ano inteiro a pensar naquelas duas semanas de
felicidade, em Agosto, que passava connosco. Todos queríamos que fosse almoçar
ou jantar a nossa casa, tínhamos que organizar uma lista". Fica a memória,
Serafim, e o mês de Agosto já não vai ser mais o mesmo. Fica a memória dele,
porém, gravada num banco de granito finamente elaborado e mandado fazer por
essa gente de Benlhevai e que fica justamente situado no largo da aldeia aonde
se costumava sentar nessas tardes quentes de confraternização e proteção.
Jorge Morais (Fotografias e texto)