Diminuir
assimetrias entre o interior e o litoral através de 6 medidas, este é o
objectivo do Movimento pelo Interior que realizou um debate em Bragança, na
passada sexta-feira. Estão previstos mais cinco debates noutros territórios do
interior.
O
auditório Paulo Quintela não ficou repleto de participantes, mas foram muitos
os que não quiseram faltar a uma discussão que teve de tudo, no que toca à
esperança de um interior mais desenvolvido e com maior qualidade de vida. Não
faltaram também críticas às políticas desenvolvidas, em governos anteriores, no
âmbito desta temática. Uma participação activa onde não faltaram personalidades
políticas do distrito de Bragança e um público interventivo, no que diz
respeito a uma cidadania atenta ao destino do interior do país.
Os
problemas do interior, que no debate foram evidenciados e que assolam no
momento o país serão os problemas da demografia, do despovoamento, do abandono
do espaço rural, do pouco número de postos de trabalho e o cada vez mais
acentuado abandono da actividade económica.
É
importante destacar factos. Segundo o Instituto Nacional de Estatística 50% da
população concentra-se em 33 municípios da faixa litoral, representando 11% do
total dos municípios portugueses. Juntando a este facto, em 2014, segundo dados
do Banco Mundial, Portugal registou a quinta maior perda populacional do mundo.
Já de acordo com as projecções do Instituto Nacional de Estatística, a
população residente em Portugal tenderá a diminuir até 2080, passando dos
actuais 10,3 para 7,5 milhões de habitantes, ficando abaixo do limiar dos 10
milhões em 2031.
Este
é ponto de partida para que sete personalidades políticas se tenham unido no
Movimento pelo Interior e tenham solicitado o alto patrocínio do Presidente da
República. O Movimento junta dois presidentes de Câmaras de cidades do
interior, da Guarda e de Vila Real, Álvaro Amaro e Rui Santos. Álvaro Amaro,
para além de ser o autarca do município da Guarda também é o presidente dos
autarcas social-democratas e Rui Santos é presidente dos autarcas socialistas.
Outras duas personalidades que se uniram a este movimento estão ligadas ao
ensino superior e técnico (António Fontainhas Fernandes, reitor da Universidade
de Trás-os-Montes e Alto Douro, e presidente do Conselho de Reitores das
Universidades Portuguesas e Nuno Mangas, presidente do Instituto Politécnico de
Leiria e presidente do Conselho Coordenador dos Institutos Politécnicos de
Portugal). Do sector empresarial, Rui Nabeiro, fundador do Grupo Delta, une-se
ao movimento. Fernando Nunes, presidente do Grupo Visabeira, também se
constitui como proponente deste movimento. Por fim, a sétima personalidade
política que se uniu a este movimento cívico foi José Silva Peneda,
ex-presidente do Conselho Económico e Social e ex-deputado no parlamento
europeu. O Movimento pelo Interior é uma causa que pretende recolher e
reflectir contributos de todos os interessados para apresentar 6 medidas
concretas numa última sessão, a decorrer em Lisboa, com a presença do
Presidente da República, primeiro-ministro e todos os líderes partidários. O
objectivo é apresentar 6 políticas públicas para implementar e alcançar no
espaço de 12 anos, ou seja, 3 legislaturas, objectivos a cumprir, que possam
ter a sua aplicação no terreno de forma a reverter a situação do interior.
Na
sessão do Movimento pelo Interior, em Bragança, no auditório Paulo Quintela,
esteve presente Álvaro Amaro, que apresentou o Movimento, o presidente da
Câmara de Bragança, Hernâni Dias, Sobrinho Teixeira, presidente do Instituto
Politécnico de Bragança e ainda Miguel Pinto, director-geral da Kathrien
Automotive, uma empresa sediada em Vila Real. Estes últimos três foram os
oradores da conferência.
Na
apresentação do movimento, o autarca da Guarda referiu que tem de se apresentar
ao governo “medidas radicais e até mesmo violentas” porque a situação é de um
forte desequilíbrio. Para sustentar esta perspectiva, Álvaro Amaro, referiu que
é necessário “conseguir que todos dispam qualquer fato político-partidário e
vestir o fato do equilíbrio do país, é esse o motivo que nos move”. Para o
autarca da Guarda, o Movimento pelo Interior é um desafio para todo o espectro
partidário e destacou a “importância deste movimento, como um desafio para todo
o sistema político.”
As
propostas irão assentar em três eixos fundamentais: o educativo, o fiscal e da
descentralização de serviços do estado para zonas menos desenvolvidas. Como
coordenadores destes três pilares, foram nomeados coordenadores da maior
importância política, como Miguel Cadilhe, que ficará responsável na área
fiscal, Jorge Coelho, responsável pela ocupação do espaço pelo Estado, sendo
que a questão educativa ficará a cargo de Pedro Lottie.
Hernâni
Dias, anfitrião da iniciativa, reivindica como propostas concretas a atribuição
de um estatuto jurídico de interioridade aos territórios menos desenvolvidos,
em que se possa “tratar uma parte do interior do pais, como se tratou ao longo
dos últimos 40 anos, o processo da insularidade, com a atribuição de um
estatuto jurídico de interioridade a estes territórios e ao mesmo tempo, que
esses territórios pudessem vir a beneficiar de medidas fiscais radicais, como
por exemplo, a nível empresarial, do IRC zero, que poderia ser gradual, à
medida que o tempo ia passando, mas também uma redução do IRS para os cidadãos
que se fixem no interior e a questão da aplicação da derramas, às empresas”.
Outro
argumento que o autarca da capital de distrito apresentou foi a “redução de 50%
nos 95 % que o Estado arrecada para si próprio, relativo àquilo que é o rendimento
dos cidadãos, seria extremamente benéfico porque poderíamos ter aqui a
possibilidade de deixar aqui, anu-almente, 15 milhões de euros nos cidadãos de
Bragança”. Um dos convidados a orador da conferência foi Sobrinho Teixeira que
defende que “Bragança é o ponto do país mais próximo da Europa” e refere que o
factor proximidade é uma vantagem para se definir como um pontos estratégicos
para a dinamização do interior.
Na
sua intervenção defende que é necessário dar continuidade na aposta do sector
primário, mas sobretudo é muito importante fomentar o sector secundário.
Sobrinho Teixeira considerou que Bragança já se encontra num patamar avançado
de desenvolvimento, exemplo disso, é o IPB desenvolver um trabalho de “geração
de conhecimento” através do CIMO – Centro de Investigação da Montanha, que
considera como a “jóia da coroa”. O CIMO não se encontra só virado para a
agricultura, mas também para a tecnologia alimentar. O Presidente do Instituto
Politécnico de Bragança apresenta a criação de um Laboratório de Inovação
Industrial, que já foi candidato e vai se especializar em inovação industrial
de forma a potenciar o desenvolvimento e a economia numa região de baixa
densidade. Acrescenta que “gostava que fosse uma referência a nível ibérico e
europeu”.
Outro
factor importante, ressalvado pelo presidente desta instituição de ensino
superior, é a aprovação do projecto de seis laboratórios colaborativos, para as
regiões de montanha, projecto desenvolvido em parceria com o Instituto
Politécnico da Guarda. O Centro de Inovação Industrial é uma das novidades que
apresenta, de forma a potenciar o desenvolvimento e economia numa região de
baixa densidade. Na sua comunicação, também criticou a CCDRN afirmando que os
fluxos financeiros não estão a ser canalizados para o interior, porque não
existe majoração para as regiões de baixa densidade. Neste aspecto, até deu um
exemplo, em que não existe uma empresa que seja capaz de candidatar um
projecto, no valor de um milhão e quinhentos mil euros, porque as empresas
instaladas no interior não têm essa capacidade financeira.
Já
Manuel Pinto, da empresa vila-realense, como gestor de uma empresa do interior
queixou-se relativamente ao facto de o IRC ser elevado, que terá de diminuir e
é necessário que seja adaptado às necessidades destas empresas do interior. Na
sua intervenção, afirmou “é uma questão que me preocupa, porque o meu maior
concorrente é a China”.
José
Silva Peneda, na sua defesa do movimento, referiu “que nunca é tarde, para
contrariar esta tendência de despovoamento e de desequilíbrio, ainda vamos a
tempo e a prova é esta reunião, porque vi aqui pessoas com cepticismo e com
vontade de contrariar estas tendências”.
O
Jornal Nordeste tentou obter a reacção de Artur Nunes, presidente do município
de Miranda do Douro e presidente da direcção da Comunidade Intermunicipal
Terras de Trás-os-Montes que não quis prestar declarações.
Uma
nota importante a destacar é que o coordenador da Unidade de Missão para a
Valorização do Interior, João Paulo Catarino, esteve em Bragança, mas não
esteve presente na conferência pelo interior.
T
E S T E M U N H O S :
Jorge
Nunes – Vogal da Comissão Directiva do Programa Operacional
Regional do Norte
Jorge
Nunes saudou o Movimento pelo Interior e caracterizou-o como um movimento positivo
que implica obrigações de cidadania e que se encontram sintonizadas com
problemas centrais. No entanto, referiu que “não podemos descurar dos
problemas que vivemos: os problemas de demografia, de despovoamento, problemas
de economia e do abandono do território”. Relativamente às críticas
proferidas nas intervenções, relativas aos fundos comunitários, explicou que no
respeito aos fundos públicos da União Europeia mobilizados por entidades
públicas, consegue-se fazer um equilíbrio na atribuição de fundos, porque este
este exercício está no domínio da decisão política. No entanto, no que diz
respeito, aos incentivos às empresas, a atribuição de fundos é um processo mais
difícil de realizar. Porque, prossegue, “esse equilíbrio, é fruto das
próprias empresas que concorrem a estes incentivos. Há muita fragilidade das
empresas uma vez que o maior dinamismo das empresas, da capacidade económica,
das assessorias, estão concentradas no litoral, existindo algumas lacunas e
portanto a questão está no território”. Destacou ainda que “não
podemos colocar o foco nos fundos comunitários, como o elemento chave para a
resolução dos problemas do interior. Os fundos estruturais não são capazes, por
si só, de resolver os problemas de interioridade, eles podem dar um contributo,
há medidas de natureza política pública de outro alcance”. Jorge Nunes
defende que medidas de descentralização, desconcentração de população, questões
de cooperação transfronteiriça, fiscalidade às empresas, no fortalecimento do
centros superiores e dos centros de competência científicos, tecnológicos e de
interface para actividade económica são questões a ter em conta.
Berta
Nunes - Presidente da Câmara de Alfândega da Fé
Berta
Nunes saudou a iniciativa do movimento, mas alertou que por vezes existe é uma
política de “não sair do mesmo sítio, dá-se um passo à frente, com a
incrementação de algumas políticas, mas o governo muda e as políticas são
alteradas e dá-se um passo atrás”. Para a autarca, o movimento não será o
salvador para o interior, é mais um contributo mas que não poderá actuar de
forma isolada e poderá ser constituído como um impulso forte porque tem as
condições para sejam tomadas medidas consensuais. A autarca também chamou a
atenção para a Unidade de Missão para a Valorização do Interior (UMVI) cuja
acção não foi objecto da devida avaliação das 164 medidas apresentadas e que
nunca mais “se ouviu falar do assunto”. Aconselhou na sua
intervenção que as medidas que sejam tomadas deveriam ser reflectidas na
Constituição da República Portuguesa.
Jorge
Fidalgo - Presidente da Câmara de Vimioso
Jorge
Fidalgo destacou que “ainda há muitos portugais esquecidos” e
destacou o insucesso da Unidade de Missão – UMVI. Ressalva que estes dois
movimentos são complementares. Um dos aspectos importantes que salientou foi a
questão do modelo de governação, uma vez que o centralismo é uma questão grave
e que o Estado deveria dotar os municípios de mais poder no que diz respeito à
tomada de decisões. No que respeita às desigualdades entre o litoral e o
interior destacou “sabendo que é uma luta desigual quando temos de
trabalhar com armas diferentes”, referindo-se aos fundos comunitários que
são canalizados em maior volume para o litoral.
Escrito
por: Jornalista Maria
João Canadas
Retirado de www.jornalnordeste.com
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