O
PONTO ALTO DO CARNAVAL DE SENDIM É QUEIMA DO ENTRUDO
O
Carnaval Trapalhão de Sendim, Miranda do Douro, leva a sátira social e política
à rua de forma espontânea, promovendo a boa disposição e folia em terras do
Planalto Mirandês, numa iniciativa que resiste ao despovoamento na região.
Pela
vila de Sendim, no distrito de Bragança, por esta altura, ainda ninguém pensou
nos adereços que vai utilizar no dia de Carnaval, muito menos na montagem dos
carros alegóricos que vão ser utilizados ou na banda sonora que vai ser tocada.
Mas há garantia que festa vai sair à rua, tal como acontece "há muitas
décadas".
"Há
20 ou 30 anos atrás, o Carnaval de Sendim era bem vivido. Havia crítica e
sátira social, sem ser ofensiva. Era uma realidade saudável, as coisas nasciam
de forma espontânea. Umas das principais características era que o Carnaval se
fazia de improviso e de forma trapalhona. Agora há pouca gente, mas ainda se
faz a festa", explicou à Lusa, Fernanda Chumbo, uma das habitantes de
Sendim.
Por
aquelas paragens trasmontanas, tudo surge de forma espontânea, todos os
utensílios caseiros e rurais são bons adereços e qualquer peça de pano ou
serapilheira dita as tendência da moda neste corso "trapalhão".
Vitorino
Martins, outro entusiasta do Carnaval de Sendim, prefere recuar uma pouco mais
no tempo e vai até aos anos 60 do século XX, referindo que as famílias se
juntavam em grupos para desfilar em representação das suas ruas, até a um
determinado ponto de encontro. Seguiam depois até largo da Igreja, onde toda a
gente se concentrava para dará início as brincadeiras e à folia.
"Toda
gente brincava no Carnaval, naquele tempo. Hoje, como há menos gente, vejo
menos participantes nestas brincadeiras. Todos os anos participo e gostava de
ver os mais novos a participar", frisou.
Os
foliões de Sendim, principalmente os que têm mais idade, referiram à Lusa que
"nesta festa não há 'brasileiradas' ou coisas semelhantes". Tudo é
feito com as coisas "mais mirabolantes" que são encontradas nas casas
agrícolas, armazéns ou palheiros.
"De
um simples pano de guarda-chuva depressa se improvisava uma saia",
observou o folião, residente na vila transmontana.
A
música sai das gaitas de fole, acordeões, caixas de guerra e bombos e outro
tipo de instrumentos musicais.
O
Carnaval Trapalhão é assim designado pelos sendineses porque surge de forma
espontânea, sem coordenação e onde todos dão asas à sua imaginação
carnavalesca, o que acaba por trazer centenas pessoas para ver as tropelias
provocadas pelo corso carnavalesco dos foliões.
Altino
Martins, um residente em Sendim que chegou à vila do Planalto Mirandês há mais
de 40 anos, diz: "Quando cheguei a Sendim há cerca de 40 anos, verifiquei
que a celebração do Carnaval era uma iniciativa muito interessante. Contudo,
havia brincadeiras algo perigosas como o lançamento de bombinhas, farinha ou
cinza. Isso acabou e criaram-se outras manifestações mais civilizadas e bem
mais engraçadas".
A
crítica social, recorda Altino Martins, era sempre o ponto alto do Carnaval
Trapalhão, o que atraia algumas centenas de pessoas dos quatro cantos do
Nordeste Trasmontano, mas não só.
"Esta
crítica social criou fama mas, com o tempo, fruto de alguma pressão, as coisas
tornaram-se mais suaves", recorda.
Outro
dos pontos alto do Carnaval de Sendim é queima do Entrudo, na noite de
terça-feira de carnaval, da responsabilidade da juventude local.
Mário
Correia, investigador da cultura mirandesa defende, que a vila de Sendim, tem
as suas "Entrudadas" cheias de espontaneidade, colorido e aparato
ruidoso, que permitem apreciar a cultura local "na sua génese", como
é caso da língua ou do teatro popular mirandês, e a sua sátira, bem ao jeito de
Gil Vicente.
"Em
Sendim, apesar do despovoamento, a população não desarma, sendo uma tradição
para manter, já que as pessoas sentem a necessidade de fazer esta festa",
concluiu.
Foto: Luis Teixeira
Retirado de www.diariodetrasosmontes.com
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