terça-feira, 31 de dezembro de 2019

Feliz Ano Novo!


Esperamos que este novo ano,

que agora vai chegando,
traga consigo desejos cumpridos
sonhos realizados,
amores resolvidos,
muita paz e muita luz...



Excelentes entradas!
Feliz Ano 2020!

São os votos de Maria e Marcolino Cepeda


segunda-feira, 23 de dezembro de 2019

FELIZ NATAL!


Que o seu Natal seja vivido com muita alegria, repleto de amor e rodeado de paz!
São os nossos sinceros votos de um Feliz Natal!

Maria e Marcolino Cepeda 

sexta-feira, 20 de dezembro de 2019

Imaterial fundamental - Editorial do Jornal Nordeste de 17-12-2019


No estado actual do nos­so conhecimento, construí­do à custa da razão, não é possível conceber o mundo e a humanidade sem os inte­grar nessa estrutura radical, cósmica, essencial, a maté­ria, secularmente demoniza­da, pretendida refugo incó­modo, dispensável na eterni­dade, notável fantasia de de­siludidos, empenhados em sacudir as escórias da vida.
Naturalmente a mate­rialidade não é assimilá­vel à existência que, no ca­so dos seres vivos, aparece com componentes que reco­nhecemos como emanações de processos materiais, mas não podem ser simplesmen­te reduzidas à expressão dos equilíbrios, desequilíbrios ou reequilíbrios molecula­res, antes devem ser entendi­das como realidades empol­gantes, embora efémeras no tempo cósmico, que podem ser engolidas num qualquer buraco negro, possibilidade indescartável que nos con­duz à angústia do confron­to com o absurdo do defini­tivo nada.
Entretanto, sendo a hu­manidade um produto do que emana da matéria, tam­bém constitui uma realida­de diferente, com a caracte­rística singular de dispor de condições para se subtrair aos desígnios estritamente físicos, até de os condicio­nar, deixando marcas notó­rias nos ritmos do universo.
Embora reféns desta trá­gica condição, os humanos geraram realidades inefáveis como as emoções, os senti­mentos, as linguagens, afi­nal a cultura, que parecem li­bertar-nos do determinismo natural, pelo menos é o que gostávamos que acontecesse, porque queremos acreditar que a memória terá o con­dão de permanecer mesmo sobre as cinzas, o pó a que estamos condenados
Assim nos vamos alimen­tando das esperanças, tal­vez vãs, mas reconfortantes, de dar algum sentido às vi­das de todos os dias, mobili­zando o legado dos que nos precederam. Por isso valori­zamos vestígios, sinais, ruí­nas, tradições dedicando-lhe afectos e mobilizando esfor­ços para os manter como re­ferências. São a nossa alma.
O reconhecimento dos caretos de Podence como pa­trimónio imaterial da huma­nidade pela Unesco é uma palpitação global ao mesmo ritmo, uma forma de parti­lhar o destino.
As festas de Inverno que sobrevivem no território am­plo do Noroeste Peninsular têm agora mais condições para atrair gente, com tudo o que isso significa ao nível do dinamismo económico, mas também no contacto com a magia do que está além do vi­sível e do quantificável, o tal imaterial que nos acompanha na passagem pelo planeta.
Talvez tivesse sido pos­sível conjugar esforços pa­ra promover uma candida­tura de todas as festas com máscaras do distrito e do la­do espanhol, mas as coisas são como são e os méritos fi­cam para quem os conquista, com trabalho, coragem e de­terminação.
O reconhecimento dos outros é um alento e as vidas fazem-se desses prazeres de nos encontrarmos nas ale­grias, nas festas, no espan­to de nos sentirmos profun­damente próximos dos con­temporâneos e dos que por cá passaram há mais ou me­nos tempo.
Apesar de nos gastarmos todos os dias a garantir o su­porte material da vida, sen­timos que fundamental para sermos o que somos é o ima­terial, que geramos perma­nentemente sem saber como nem porquê.

Escrito por Teófilo Vaz, Diretor do Jornal Nordeste

quinta-feira, 12 de dezembro de 2019

ENTREVISTA PROFESSOR ADRIANO MOREIRA (4º Excerto)


Entrev.: É verdade. Também é nossa. 

Prof. Doutor A.M.: Chamei a atenção, chamei ontem… não percebo esta guerra civil da língua: quando olhamos para o site das Nações Unidas, estão lá oito línguas só. Está lá a nossa.

Entrev.: É a quinta língua mais falada do mundo. Não é qualquer coisa. É uma grande coisa.

Prof. Doutor A.M.: E mesmo para a literatura… Sabe qual foi a grande invenção do inglês para se expandir? O inglês básico. E o criador do livrinho, um professor, disse: “Isto é que vai conquistar o mundo.”

Entrev.: E conquistou. É isso. Senhor Professor, já estamos quase a acabar e eu não quero cansá-lo mais. Que leitura faz da região de Trás-os-Montes de hoje?

Prof. Doutor A.M.: Bom, eu não tenho hoje a mesma intimidade. Porque já venho menos vezes, já não tenho parentes na aldeia. Não há crianças. Mas eu mantenho este sentimento… No sítio onde nós vivíamos não havia igreja, lá em Lisboa. …  havia muitas, mas longe. E dinheiro, para o transporte e tempo livre não havia. Portanto a minha mestra foi a minha mãe. E até morreu um amigo meu, franciscano, muito sábio, era da Academia das Ciências, e acaba o livro, o último que escreveu, com estas palavras: “Deus existe.” E eu: “A minha mãe já me tinha dito.” E, portanto, a crise desafiante da Igreja é geral, e a resposta não está a ser uniforme. Está a pagar glórias, está a pagar porque foi uma responsável pela ocidentalização do mundo. Mas aquela história que eu contei… não contei… Recordo-me do sueco Dag Hammarskjöld, Secretário Geral das Nações Unidas, sendo eu um dos representantes de Portugal… Nós éramos muito novos, os delegados. Íamos para a pandega no fim-de-semana: qualquer hora que chegássemos, (estávamos num hotel muito pobre de africanos, porque naquele tempo o estado não era rico nas ajudas de custo), a janela dele estava iluminada. Estava a trabalhar. Tínhamos tal admiração por ele, que eu a primeira vez que fui à Suécia, fui ao cemitério para REVERENCIAR  a sepultura dele. Fez na ONU uma salinha, do tamanho deste espaço onde estamos, com bancos de madeira e um altar de mármore ao meio, e uma luz que vinha do alto sobre a pedra, impressionante! “Sala de meditação de todas as religiões.” Ele percebeu que tinham que se por de acordo. Veja bem! Ele foi assassinado, no Congo. A mim dizem-me, não, não está provado. Eu digo, pois não. Deitaram-lhe só o avião abaixo. Bom. Morreu muito novo. Eu tinha esta admiração que disse. Já agora, conto uma pequena anedota: eu cheguei a ser presidente de uma coisa que se chamava Centro Europeu de Informação e Documentação. Foi fundado pelo Arquiduque de Habsburgo, de quem eu fui muito amigo. Tínhamos delegação em catorze países e ainda cheguei a ser o Presidente. Uma vez tivemos uma reunião na Suécia. Ficámos num Château e no domingo de manhã foram bater aos quartos “Há missa na sala de jantar.” Porque o arquiduque tinha o privilégio de lhe dizerem a missa onde estivesse. E ele tinha um altar portátil. Portanto, levava-o com ele. Onde chegasse, instalavam-no e diziam a missa. Quem disse a missa foi um alemão. Ninguém sabia alemão senão os alemães e depois estava o padre Aguiar que era o nosso e lá traduzia as coisas como podia. A certa altura, desata tudo à gargalhada na missa que estaria no fim. “Ó padre Aguiar, o que é isto?” É que o padre, como era a primeira missa que se dizia na Suécia desde o tempo do Lutero, achou que devia haver uma música. Então encontrou uma senhora de idade que tocaria a música. Sabe o que era? O hino do Lutero, na primeira missa católica desde a reforma.

Entrev.: (Risos) O hino do Lutero! Ora, então, realmente. Que engraçado.

Prof. Doutor A.M.: (Risos) É uma coincidência. O hino do Lutero. Era o que ela sabia tocar. É interessante. Há um padre chamado Kung, alemão. Conhece o nome? Tem uma fundação e teve umas questões com o Papa Emérito. Era amigo dele, mas proibiu-o de dar aulas. A pregação dele no mundo, é que as religiões se entendam.

Entrev.: Era bom era!

Prof. Doutor A.M.: Olhe, ainda outro dia, há pouco tempo, li um livro do líder do Tibete. Como é que ele se chama?

Entrev.: O Dalai Lama.

Prof. Doutor A.M.: Apresentei o Dalai Lama na Universidade de Lisboa há mais de 30 anos. Apresentei-o, veio cá. É impressionante o seu recente livrinho. Ele diz, “Eu fui invadido, destruíram o meu país, mataram muita gente, estou exilado há 50 anos, e não tenho ódio a ninguém. Acho que a paz é fundamental. E o Papa Francisco tem razão.” É impressionante, é animador para o Papa que tem pouca saúde.

Entrev.: Tem uma saúde muito frágil.

Prof. Doutor A.M.: Falta-lhe um pulmão. E já caiu duas vezes. Mau sinal. Há um problema com ele que eu acho que esta gente não avalia; dos cardeais, bispos vivos, é o que sabe mais da América Latina.

Entrev.: – Sem dúvida nenhuma!

Prof. Doutor A.M.: E, portanto, ele sabe o drama da América Latina. Eu escrevi um artigo que vai sair no Diário de Notícias. Eu ando um bocadinho preocupado com essa gente. E acabei o artigo assim: “O problema não é a soberania do Brasil, que não é o único soberano; o problema, quando se diz a importância da Amazónia, é o valor para o Globo.

Entrev.: Ai, sem dúvida nenhuma!

Prof. Doutor A.M.: Esse valor está antes. Com esta conversa que estão a ter em relação aos nativos e que implica com o inquérito do Papa. Lembrei-me, por umas passagens, do livro sobre a democracia na américa”, que é um livro muito célebre de Toqueville, em que se conta o encontro dos Iroqueses com o Presidente dos Estados Unidos. Vale a pena ler isto, porque disseram o seguinte: “Quando os senhores chegaram aqui, vinham carentes. Recebemo-los ajudando-os. Os senhores destruíram o nosso território. Éramos os componentes da nação mais importante. Estamos aqui os últimos da nossa raça. Vimos-lhe perguntar se temos de morrer.” Eu concluo: “Vejam se evitam uma repetição deste acontecimento com esta história da Amazónia.”

Entrev.: Esperemos que sim.

Prof. Doutor A-M.: Eu acho que é comparável.

Entrev.: É comparável sem dúvida. Olhe, Senhor Professor, para concluirmos isto, porque eu vejo que já está muito cansado, … o que pergunta o meu marido é se o senhor professor não se importaria que a sua obra toda, a sua biblioteca toda, fosse colocada online, em suporte digital?

Prof. Doutor A.M.: Isso tem de perguntar. Eu, por mim, não me importo. Tem que perguntar ao nosso Presidente da Câmara. Ela está para vir, o resto. Isto aqui é uma parte.

Entrev.: Eu sei, eu sei.

Prof. Doutor A.M.: Já viu, não viu?

Entrev.: Sim, já vi e sou frequentadora da sua biblioteca.

Prof. Doutor A.M.: Eu, uma das coisas que digo à minha mulher, é isto: “A ti, depois de eu morrer, vai-te custar, porque a casa, sem os livros, vai ficar vazia. Eu Graças a Deus tenho uma casa grande. E fui favorecido por Deus, que eu nunca tive grandes empregos, mas tinha a educação transmontana. Nada de inutilidades, etc. E a minha casa é muito acolhedora. Eu vivo ali há 50 e tal anos, veja bem. Mas é um tempo em que o Restelo chamava-se o Bairro das mulheres arrependidas. Sabe porquê? Acabou o açúcar. Onde é que se compra açúcar? Não havia um sítio onde comprar. Agora não, agora há tudo. Bom, a casa é a mesma. Vá lá e cabem lá os catorze netos. De vez em quando juntam-se todos lá. E estou a reparar numa coisa. Os que andam na universidade vão para lá estudar.

Entrev.: Ora vê! Risos de ambos.

Prof. Doutor A.M.: É uma coisa engraçadíssima!

Entrev.: É porque sabem que têm um avô e uma avó que os podem receber e sabem que podem contar com eles. Senhor professor o prémio da lusofonia?

Prof. Doutor A.M.: Disse ontem. Disse ontem. Se não fosse o meu pai, não estava ali. Enfim, se não fossem o meu pai e a minha mãe, não estava ali. Estou sempre a lembrar isso.

Entrev.: E o prémio devia ter o nome do seu pai…

Prof. Doutor A. M.: E até aqui há tempos, já há muito tempo, mais de um ano, talvez quase dois, o Comandante Geral da Polícia, penso que agora não tem esse título, mas equivale a general, aconteceu eu falar com ele num almoço em que fiquei ao seu lado. Ele disse-me assim: “Olhe uma coisa senhor professor, o seu pai não foi ajudante do Ferreira do Amaral?” Eu disse: “Foi”. Ainda conheci o Ferreira do Amaral, porque eu era pequenino, mas o meu pai achou que eu devia ir ver o seu comandante. E gostava tanto dele, que o meu pai, já com 80 anos, naquele tempo, era um tempo em que estava em Grijó e ia a Lisboa de propósito à missa anual pelo seu comandante. Veja bem. Ele foi vítima num atentado. Iam-no matado a tiro e safou-se. E diz-me o comandante: “O senhor podia dar-me um retrato do seu pai?” “Com certeza! Até lho posso dar já que tenho na carteira.” “Não, eu quero um mais apropriado, para pôr ao pé do “Ferreira do Amaral”.

Entrev.: Muito bem. Que maravilha! Obrigada, Senhor Professor. Foi um enorme prazer e uma grande honra ter-nos concedido esta entrevista. Não temos palavras para agradecer a sua disponibilidade e amabilidade. Pedimos desculpa por se ter tornado tão longa. Bem-haja. 

Entrevista realizada por Maria e Marcolino Cepeda e Lídia Machado dos Santos

terça-feira, 10 de dezembro de 2019

OUTONO (4-12-2019)

Beleza e melancolia,
efeitos do coração
que as árvores,
só por magia
expressam solidão.






Fotos e texto de Maria Cepeda

A VIDA NÃO TIRA FÉRIAS (2-12-2019)


É outono, quase inverno.
É hora de ser quem somos,
Sem medos, sem abandonos
que a vida não tira férias.

Não deixamos de ter beleza.
Basta o momento, o instrumento,
o olhar e a vontade de o usar.




Fotos e texto de Maria Cepeda

No seu olhar me perdi

Veja-se este céu!
Tão único
Tão nosso
Tão meu.

Não sei o que diz.
Intriga-me,
Impacienta-me,
Interessa-me.

No meu olhar se perde.
No seu olhar me perdi.



Fotos e texto de Maria Cepeda

Estamos a ficar com os azeites (Editorial do Jornal Nordeste, 10-12-2019)


A oliveira, o seu fruto e o azeite que dele se extrai são referências fundamentais das civilizações mediterrânicas, associadas a confortos de di­vindades e às aspirações hu­manas na partilha das essên­cias do que consideram as delícias da imortalidade. 
Associamos o azeite à luz que nos guia nas trevas, à purificação do corpo, à ce­lebração da vida, apesar de também conhecermos ditos jocosos que o relegam para realidades enjoativas, ranço­sas e escorregadias, fruto de modas em tempos de idola­tria do sintético, do proces­sado, do adulterado, aparen­temente cómodo, eficaz, rá­pido, com consequências que se hão-de ver, se calhar.
O Nordeste Transmon­tano tem sofrido os efeitos nefastos do isolamento que a história lhe foi impondo, abafando-lhe o alento e es­vaziando-lhe a alma. Mesmo assim, quando olhado com olhos de ver, pressentia-se não haver razão para lhe as­sacar a condição de verda­deiro degredo.
Talvez se tenha chegado tarde ao reconhecimento de potencialidades únicas, ape­sar da aventura notável que foi o empreendimento do Ca­chão há mais de meio século, que se perdeu nas noites do desleixo acomodado às mi­ragens de prosperidade que haveria de cá chegar, mais cedo ou mais tarde, porque sobraria de prometido mila­gre nacional, abençoado por todos os santos da Europa.
Mesmo assim, ainda foi possível identificar produ­tos que teriam futuro no sec­tor agroalimentar, nomeada­mente as carnes, o azeite, os frutos secos ou o vinho. Não faltaram proclamações e ac­ções de sensibilização para a aposta na especificidade, na qualidade, na produção tra­dicional, porque por aí se chegaria a mercados com al­to poder de compra, refina­dos, com garantias de conti­nuidade.
O reconhecimento das produções da região foi apa­recendo: vinhos, azeites, car­nes certificadas foram pre­miados a nível internacional, mas a generalidade dos pro­dutores viu-se confrontada com a exiguidade do univer­so de consumidores, reinsta­lando-se o instinto de sobre­vivência, quando não aconte­ceu o abandono por falta de rentabilidade ou exaustão de quem gastara a vida a lutar contra o destino. Assim se ex­plica a redução vertiginosa de cabeças de gado bovino e dos efectivos de ovinos e capri­nos, estes com as perdas co­nexas de outro produto para palatos exigentes, os queijos com carácter muito próprio.
Enquanto a castanha e a amêndoa parecem ter, no horizonte imediato, garan­tias de rendimentos inte­ressantes e o vinho também continua a fazer caminho, o azeite da região está, desde há três anos, a confrontar-se com um problema que pode comprometer-lhe o futuro.
O preço pago aos pro­dutores de azeitona está em queda e os transformadores já recusam o próprio fruto, porque não colocam o azei­te no mercado com renta­bilidades aceitáveis. Por is­so, um número significati­vo de pequenos produtores poderão conhecer sérias di­ficuldades para manter a ac­tividade ou sujeitar-se a ficar com os azeites. Aqui nos con­frontamos, mais uma vez, com o absurdo: a qualida­de afinal serve-nos de pouco.
Ficar com os azeites tam­bém é expressão idiomática que utilizamos para referir irritação, mau humor ou fú­ria, sentimentos que tendem a não se arredar das nossas vidas.

Escrito por Teófilo Vaz, Diretor do Jornal Nordeste

domingo, 8 de dezembro de 2019

ENTREVISTA PROFESSOR ADRIANO MOREIRA (3º excerto)


Entrv.: Eu costumo dizer que nós somos as nossas circunstâncias! 


Prof. Doutor A.M.: É a relação com a circunstância. Eu lembro quando foi do primeiro grande golpe que foi as duas coroas, o nosso Frei Bartolomeu dos Mártires, que agora é santo… eu acho que ele fez uma coisa um bocadinho criticável, achando legítimo que viesse o rei de Espanha. Ora bem, mas outro bispo percebeu a circunstância: não estava de acordo, mas quando lhe perguntaram, o que respondeu foi – “Ao presente não lhe vejo mais remédio.” Quem diz isto não está de acordo.

Entrv.: Sei que ontem foi um dia muito cansativo…

Prof. Doutor A.M.: Foi, mas dormi bem. Mas eu queria dizer outro aspeto em que o país caiu que eu chamo “exíguo”, porquê? Porque não tem recursos suficientes, há tempos, para o que tem de fazer. As duas coisas… aconteceu-nos e não gosto, mas em todo o caso há uma coisa que é a dignidade. E isto já deve ser da idade… Quando via vir os homens da TROIKA explicar regras aos nossos ministros, eu perguntava-me: “então nós não temos empregados para falar com empregados?

EntrV: Justamente. É verdade.

Prof. Doutor A.M.: Eu sentia-me humilhado como transmontano e português.

Entrv.: Somos transmontanos. Eu sou da região de Vinhais e o meu marido nasceu na cidade de Bragança. Então somos mesmo! Embora eu tenha vivido no Brasil. Fui para lá pequenina e estive em São Paulo durante muitos anos até voltar para cá, mas somos e sinto-o porque os nossos pais sempre nos incutiram o trasmontanismo.

Prof. Doutor A.M.: Veio-me à ideia porque foi a pergunta que me fez. É que quando fiz estudos em Lisboa, como lhe disse, os meus amigos e do meu pai eram os transmontanos. Era gente muito modesta, mas amigos e solidários e vi isso, por exemplo, na guerra de Angola. Eu cheguei a Angola, não havia segurança. Não havia, ainda. O meu pai tinha acabado de se reformar e disse-me: “Sem segurança não vais, vou eu”. Foi comigo.

Entrv.: Sim, sim eu li alguns livros…

Prof. Doutor A.M.: Viu nas fotografias? Estava sempre no meio. Era um perigo. Mas é o pai transmontano! Em toda a parte que eu chegava e onde houvesse transmontanos eu estava protegido. Eles cercavam-me… estavam sempre, sempre. Quer dizer, é uma comunidade que onde estiver é transmontana.

Entrv.: É verdade, e eu senti isso no Brasil e senti mesmo muito em S. Paulo.

Prof. Doutor A.M.: É por isso que eu digo que os transmontanos têm uma maneira de ser de solidariedade que os identifica.

Entrv.: Sem dúvida que sim. Os descobrimentos portugueses deram novos mundos ao Mundo. Acha plausível que, Cristóvão de Mendonça, navegador português, tenha chegado à Austrália em 1522, 250 anos antes da chegada do Capitão James Cook, conforme teoria defendida por Peter Tricket no seu livro “Para além do capricórnio”? A ser verdade, a que se terá devido o secretismo dessa descoberta?

Prof. Doutor A.M.: Eu conheço essa questão e a questão é de facto de resposta duvidosa, as provas são duvidosas…

Entrv.: São circunstanciais…

Prof. Doutor A.M.: São duvidosas. Não ficou nada registado. Eu tenho uma neta, a Moniquinha, que foi fazer aquele programa, o Erasmus, para a Austrália. Agora vai ver do que lhe lembrou. Tinha uma amiga, alugaram um automóvel e deram a volta à ilha toda. Chamei-lhes malucas porque foi um perigo, mas disse-lhe: “Olha quem descobriu a Austrália foste tu”.

Entrv.: É verdade! Senhor professor, palavras suas: “Estes políticos afirmam que só há uma via! E, sobre isso, eu digo: “Nunca há apenas uma via única”.” E os partidos políticos em Portugal e no Mundo, Senhor Professor, que futuro?

Prof. Doutor A.M.: A ideia de “partido” ainda no século XVIII era discutida, porque, sobretudo ingleses, achavam contrária à ideia de comunicado. Há vários autores dessa época… A minha memória agora não me ajuda, mas quando vi esta multiplicação dos partidos, para as eleições europeias, lembrei-me que tinham razão aqueles velhotes. O que é que eles diziam: partido era facção. E isso era contrário à ideia de comunidade, portanto não queriam a palavra partido, mas depois, com o tempo, a palavra partido deixa de ser a tal facção quando o conceito estratégico é comum e o que discutimos é o que é melhor. A circunstância mudou. As grandes potências emergentes em competição. A definição interna dos partidos tem de se moldar para responder à nova circunstância. A última eleição para o Parlamento Europeu em França, teve 30 partidos, e veja agora a última eleição em Portugal mostrou novidades no sentido de se pôr de acordo com as novas circunstâncias.

Entrv.: Aprendeu com a sua mãe que “Deus é companheiro”. O que pensa do Papa Francisco e do futuro do Catolicismo?

Prof. Doutor A.M.: Eu sou adepto do Papa Francisco e também reparo… ainda ontem na conversa com os nossos amigos lembrei-me disso: o mundo está muito dividido… riscos vermelhos… agora é moda, mas se reparar, depois da Fundação das Nações Unidas, o único líder religioso que foi chamado, foi o Bispo de Roma – Papa dos Católicos. Primeiro foi Paulo VI. Deixou aquela célebre mensagem: que o “crescimento da economia é o novo nome da Paz”. Depois foi João Paulo II, duas vezes: a igualdade dos povos – era o seu próprio país dominado pelos russos; depois foi o Papa Emérito que é o grande mestre, professor Bento XVI pregando – aquilo que dizem é o que devem fazer. E o Papa Francisco já foi chamado duas vezes. Ora bem, simplesmente a campanha contra a Igreja Católica neste momento é brutal. Tem pecados, mas quando há pecados tem de se arrepender, condenar, absolver, etc. Na nossa fé: perdoar. Mas como a circunstância, neste momento, é o Terceiro Mundo contra os ocidentais: e quem foi que abençoou a ocidentalização? É a razão em que ninguém fala. A luta contra os ocidentais inclui a Igreja. E os católicos estão a fazer demonstração de perplexidade e dificuldades com esta história da Amazónia. 
Não sei se viu, o Papa convocou os Bispos, porque o Brasil não é único dono da Amazónia. Há uns cinco ou seis e o Papa chamou os Bispos e fez-lhes um questionário para ver como é que vai ajudar os nativos. E até entre as perguntas perguntava se deviam admitir homens casados. E eu percebi, porque me lembrei da história da lepra, porque quando apareceu a lepra no século passado foi grave. Organizaram uma ilha no Golfo do México, que era francesa, só para os leprosos e há um frade que se oferece. Mas há uma carta dele – isto está num livro do médico que foi um bom escritor também, português, Dr. Almerindo Lessa. O frade, com trinta anos, escreveu para a Ordem: “Irmãos, eu sou jovem, tenho tentações, perdão, rezem por mim”. Veja bem. O Papa sabe isto. E alguns vieram acusá-lo até de herege. E a estupidez, ainda por cima, é que pela lei que ele está a utilizar, os Bispos não podem decidir nada. Ele fez as perguntas. Ele tomará a decisão. Mas as perguntas, dizem alguns que são de herege. Até aquele cardeal que está na cadeia, na Austrália, naquele conforto da cadeia, dá-lhe tempo para divagar, chegou à conclusão de que é herege. Ora, tudo isto é para lhe dizer: a circunstância é muito dura, é muito problema sem experiência. Há Globo, mas não há governo do Globo.
E, depois, também aquelas vozes encantatórias que, no fim da guerra, fizeram a Paz europeia, eram todos da Democracia Cristã: da França, da Alemanha, da Itália. A democracia Cristã está de rastos. Praticamente só está em Portugal, e só elegeu cinco deputados. E a senhora Merkel está ligada, mas está a descer de poder, e esta coisa de ocidentalizar o mundo é agora uma atacada aventura. Ora bem, nós tratemos mais da situação de Portugal. Não há segurança do Atlântico sem Portugal; não há luta contra a criminalidade marítima sem Portugal, mas é a situação que o envolve e, mais uma vez, a minha convicção: os portugueses têm conseguido lugares da vida internacional que não estão de acordo com os 92 mil quilómetros em decadência. Tivemos a Presidência do Conselho de Segurança, da Assembleia Geral da ONU, tivemos a Presidência dos Emigrantes – estão lá representantes muito inteligentes. De onde é que vem este prestígio? Repare que não há missão militar portuguesa, que não termine sem receber elogios… a capacidade da Instituição Militar projeta-se na importância do país que não tem a força, tem a posição e a inteligência e é por isso que a nossa diplomacia tem de ser muito boa e é muito boa, muito competente! Mas já fui bastante claro sobre a nossa fragilidade, neste momento.

Entrev. Não, não é. O senhor professor é um sábio. Há pouquíssimos homens como o senhor professor. Sinceramente, acho que já não há.

Prof. Doutor A.M.: Então estão a acabar. Com os anos que eu tenho…

Entrev. O Museu da Língua Portuguesa é um projeto muito interessante e poderá ser uma mais-valia a nível nacional e internacional no que à lusofonia diz respeito. Gostaríamos de conhecer a opinião do Senhor Professor sobre este assunto.

Prof. Doutor A.M.: Olhe, eu defendi muito essa ideia antes de ser posta em prática. Até reuni dois congressos das comunidades portuguesas no estrangeiro… uma foi cá em Portugal com iniciativa da Sociedade de Geografia, e Coimbra e Braga. Criei a União das Comunidades Portuguesas no Estrangeiro. Um foi cá em Portugal. Houve sessões excelentes. E agora há o grande problema da língua. Veja a guerra civil que há aí por causa do acordo? Eu sou contra o acordo, mas cumpro-o. Mas sabe porquê? Eu era Presidente da Academia das Ciências, tinha que obedecer à lei. Mas protestei, porque “a língua não é nossa, também é nossa”.

Entrev.: Eu também. Eu sou professora e tenho que ensinar a norma.

Prof. Doutor A.M.: E eu representante da Academia, responsável, não me dá jeito escrever de duas maneiras. De qualquer modo, fiz um discurso muito firme. Penso muito seguro. Eu disse o seguinte: A língua não é nossa. A língua, também é nossa. Porquê? A língua, consoante o lugar onde é implantada, mistura-se com valores locais. E até tem como que regras. Quando há escravatura, por exemplo, as vogais abrem-se para que o escravo perceba. Mas se ele deturpar, o patrão, como o primeiro objetivo é ser obedecido, adota a deturpação. Depois as comunidades não contactam com a mesma realidade. O Brasil tem valores italianos, valores alemães, valores japoneses… e nós não temos. Quando chegarmos ao Oriente, é a mesma conversa, mas a língua não é nossa. A língua também é nossa. Nós transmontanos, temos palavras que os outros não sabem. De maneira que eu encontrei esta regra que me parece verdadeira. A língua não é nossa, também é nossa.

(Continua...)


Entrevista realizada por Maria e Marcolino Cepeda e Lídia Machado dos Santos

quarta-feira, 4 de dezembro de 2019

Egocentrismo radical (Editorial do Jornal Nordeste, 3 de novembro de 2019)

A essência da política é a liberdade de pensar, que orienta a acção na res publica, a comunidade, polis ou civitas, como diriam os nosso maiores, gregos e romanos.
Da liberdade de pensar ouvimos dizer que se realiza sempre, sem condicionamentos nem censuras, o que não é definitivamente verdade porque também somos resultado do nosso contexto, apesar de não haver “machado que corte a raiz ao pensamento”.
Na política não basta a aventura de pensar, porque a liberdade objectiva só se concretiza na relação com os outros, reclamando o contributo da igualdade e da fraternidade para que não nos tornemos simples adoradores do nosso ego, porventura luminoso, mas incapaz, só por si, de criar novos mundos ao ritmo do pulsar caprichoso de um qualquer génio do bem, ou do mal, porque também os há.
Apesar destas evidências as sociedades continuam a lidar com auto proclamados profetas, que olham com desprezo para os outros viventes, apontando-lhes, de dedo em riste, a rota da salvação de si próprios, desse inferno que é a condição humana, com todas as angústias, tragédias, esperanças, entusiasmos e desilusões que lhe conhecemos.
Quando vai alta a maré do desespero deixamo-nos arrastar pela emoção e perdemos a capacidade de observação racional da realidade. Foi assim que se abriram portas a ditaduras ferozes. Entretanto, continuamos a dar atenção a visionários que distorcem a realidade em nome das suas convicções, por mais absurdas que sejam quando olhadas com inteligência.
Temos aprendido pouco com a história, apesar das dores que a humanidade foi provando. Geralmente tais personagens messiânicos revelaram-se perigosamente inimigos das liberdades e do respeito pelos outros e pelas suas circunstâncias.
Oriundos dos extremos do espectro político-ideológico, tanto faz, quando lhes foi proporcionada oportunidade tomaram o freio nos dentes sem escrúpulos, convencidos que haviam sido eleitos para a revelação final, numa paranóia incomodativa. A centração em si próprios deixou memórias ridículas, miseráveis e agoniantes de Hitler, Staline, Salazar, Mao Tse Tung e, nos nossos dias, de Fidel Castro, Hugo Chavez e o seu herdeiro Maduro. Espera-se que os sistemas democráticos dos EUA e do Brasil encontrem condições de resistir ao espectáculo reles em que deram palco a duas figuras inenarráveis da ignorância atrevida.
Se a racionalidade continuar a perder terreno neste século XXI, corremos o risco de conhecer os primórdios de uma nova idade das trevas, que chegará para ficar por muito tempo. Há razões para temer a proliferação de fanatismos irrecuperáveis para o reconhecimento de valores comuns, condição para que a convivência seja possível.
O fenómeno, aparentemente marginal, que ocupa os noticiários no país é um bom exemplo: os egos no partido “Livre” estão sobreexcitados e uma proposta aparentemente interessante de participação cívica leva à constatação de que fazer política à esquerda pode não passar de mais uma situação risível da miséria a que estaremos condenados.

Escrito por Teófilo Vaz, Diretor do Jornal Nordeste.
Retirado de www.jornalnordeste.com 

ENTREVISTA AO PROFESSOR ADRIANO MOREIRA (2º Excerto)

Entrv.: E a capela da sua mãe? 


Prof. Doutor A.M.: Essa capela tem uma origem interessante. A santa protetora da nossa aldeia é Santa Madalena, mas a festa é ao Senhor do Calvário. E, portanto, a capela do Senhor do Calvário era fora da aldeia… agora já lá chega a aldeia. Era uma colina, tinha umas rochas e eu lembro-me que com o meu primo gostávamos de nos encavalitar nas rochas a ver o pôr-do-sol. Lembro-me disto… íamos para ali para o Santo Cristo… Depois houve, consta, um empreiteiro que precisou de amanhar a estrada e lembrou-se de, com dinamite, tirar as pedras e a capela ficou, claro, toda atingida. A minha mãe, que era muito crente, estava sempre muito aflita com a capela. Eu já era um bocadinho crescido quando isso aconteceu, já formado, era Ministro do Interior, um transmontano, o Dr. Trigo Negreiros, e era Ministro da Marinha outro transmontano, que era o almirante Sarmento Rodrigues. O Almirante Sarmento Rodrigues que, também era transmontano, eu já andava a dar aulas, mandou-me chamar e pediu-me para ir estudar o sistema prisional do Ultramar. Nesse tempo dedicava-me a isso: o direito prisional. E, então, corri as províncias todas de África, e sinto pena porque nunca tive a ocasião de ir a Timor. Fiz o livro. Desse livro saiu a reforma prisional Sarmento Rodrigues do Ultramar. Como eu tinha dito no estudo, a condenação à prisão é sempre destinada à reabilitação. Reabilitação, que tem sempre a tal circunstância, a cultura a que a pessoa pertence. E, portanto, não podemos ter as estruturas técnicas, que são europeias, para África. Defendi fazer um regime puramente de “colónias agrícolas”, prevendo até a reunião das famílias: os europeus, tão poucos, viriam para cá. Com o livro ganhei o prémio da Academia das Ciências. E esse prémio, na altura, era 80 contos.

Entrv.: Era significativo…sem dúvida…

Prof. Doutor A.M.: Para o meu pai era o ordenado de dois anos ou três. E, então, o que é que eu fiz? Peguei no dinheiro do prémio e dei-o à minha mãe: “Pode concertar a nossa capela!” Um amigo meu fez o projeto. Era o arquiteto Mário de Oliveira… morreu em Trás-os-Montes, em Vila Real porque, ele não era transmontano, mas veio para cá trabalhar.

Entrv.: E acabou por ficar…

Prof. Doutor A.M.: Portanto fizeram a Capela, ficou linda e ele fez o projeto, não levou dinheiro, mas faltava a estrada! Fui ao Dr. Trigo Negreiros, transmontano, e contei-lhe da Capela: “Isto está feito. Está uma beleza, mas depois há a procissão todos os anos, e as mulheres vão ajoelhar-se, e a estrada é uma coisa difícil e penosa”, - “Está bem, e então o que é que quer?”, - “Quero que o senhor faça a estrada!” E fez!
De maneira que a Capela tem um grande culto. A última vez que eu lá fui eles mandaram dizer a missa na capela. E amanhã vou lá. Infelizmente com esta crise em que o país está, consegui a segunda escola e estão as duas fechadas. As duas. O presidente da junta vive na aldeia, uma família média, transformou o edifício da primeira escola em biblioteca Adriano Moreia e depois achou natural: “Agora, mande os livros!”
E eu tenho mandado bastantes, com uma certa cautela por ser uma aldeia, e a minha irmã Olívia, sábia, disse-me com o seu ar de médica, “Vê lá se mandas livros que eles leiam!”

Entrv.: Pois, com certeza! O senhor Professor é um transmontano radical?

Prof. Doutor A.M.: Sou!

Entrv.: E o que é ser um transmontano radical?

Prof. Doutor A.M.: Sabe uma coisa? Isso foi muito benéfico porque escusava de ser radical no resto!

Entrv.: Só pelo facto de ser transmontano já era radical! Muito bem!

Prof. Doutor A.M.: Era! Ora bem, isto vinha a propósito, portanto, por que é que eu cheguei… à expressão “maneira portuguesa de estar no mundo” que, aliás, foi utilizada pelo nosso presidente do júri, Prof. Braga da Cruz, no último livro que publicou, onde faz um retrato do país através de correspondências ou ensaios de pessoas vivas! Portanto, são aí umas quarenta. Tem o livro dele?

Entrv.: Não! Ainda não o adquiri!

Prof. Doutor A.M.: Mas é um livro extraordinário e também lá fala de mim! E diz assim, mais ou menos: “caracterizo os esforços da vida dele, com este problema: a maneira portuguesa de estar no mundo…”

Entrv.: Como é que o senhor Professor encara a posição de Portugal no mundo, hoje em dia?

Prof. Doutor A.M.: Com muita preocupação porque, não sei se isto é fácil de explicar para o público, mas é mais ou menos isto que eu lhes vou dizer…e compreendam que com a II Guerra Mundial, Portugal não entrou por querer na II guerra Mundial… e aquilo que anda escrito, em regra… e que procura talvez salvar a face do país… não começa dessa maneira… foi o Ultimato dos Estados Unidos – precisavam do Arquipélago dos Açores, porque, naquele tempo, os aviões não tinham capacidade para atravessar o Atlântico com gasolina e, então, tinham de fazer uma aterragem, e o Presidente do Conselho, o Doutor Salazar, conseguiu uma coisa extraordinária: os Açores e Portugal, claro, entravam como associados à defesa ocidental e na guerra, o resto dos territórios eram neutrais! Eu ainda me lembro (era estudante durante a guerra) e nós andávamos sempre aflitos a ver se os alemães vinham por aí fora. Eles chegaram a estar nos Pirenéus.

Bom, ele acabou até o discurso, dizendo mais ou menos o seguinte, na Assembleia da República, “Os juristas vão ter muita dificuldade em explicar isto. Mas é assim.” Quem cobriu essa imposição com palavras mais respeitosas foi a Inglaterra, dizendo – “Invocamos a Aliança”. Só que se esqueceram de uma coisa: é que no tal território que não entrava na guerra, ficava Timor. Foi invadido pelos japoneses e eles mataram, fizeram quase uma destruição da população. Eles ainda haviam de sofrer outro grave abuso, mas, nesse tempo, foi um desastre. Eu ainda me lembro do primeiro-oficial português governador, que depois da paz entrou em Timor. Quando chegou ele tinha uma guarda de honra à espera, gente toda esfarrapada, mas com a bandeira. Tinham-na enterrado para os japoneses não poderem destruí-la. Era uma gente muito fiel a Portugal. Ainda este ano tive… já foi o ano passado… isto passa a correr… eu nunca fui a Timor e não conheço o Presidente da República atual que já é o terceiro. Ele mandou-me o convite para eu ir a Timor. Eu disse-lhe: “Não vou porque o médico não deixa. Ele proíbe-me de andar de avião”. Eu tive um acidente nos pulmões, uma infeção e ele respondeu: “Traga uma enfermeira!”. E eu respondi: “O médico não está preocupado com a enfermeira. O médico está preocupado comigo!”

Sabe o que ele fez? Veio cá o primeiro presidente de Timor para me entregar uma condecoração. A condecoração chama-se “Condecoração de Timor: “Pelos serviços prestados a Timor (porque eu defendi-os muito nas Nações Unidas preocupei-me com os que estiveram refugiados em Lisboa e que sofreram imenso, sobretudo as mulheres que são sempre vítimas) aos Direitos do Homem e à Humanidade.”

Eu tenho um neto com quatro anos, bastante doente, que tem o meu nome, e eu disse: “Eles enganaram-se! É para o Adrianinho!” E dei-lha, para se lembrar de mim quando crescer

Entrv.: Senhor professor, creio que vem a propósito eu utilizar uma expressão, uma frase também do senhor Professor que diz, “Nós tivemos um grande talento para criar impérios…Nós gostaríamos de ouvir o comentário do senhor Professor.

Prof. Doutor A.M.: A questão é esta: vamos sempre à circunstância. Ainda este ano foram publicadas traduções de duas histórias de Portugal feitas por saxónicos. Eu achei interessante. Li as duas. São muito justos. E ambos concordam em dizer que é um milagre: como é que o mais pequeno país europeu fez um império?! Ora bem, eu digo: a circunstância.

Tenho uma grande admiração por D. Dinis porque o que é que ele fez? Primeiro, fez a Marinha. O primeiro almirante português, creio que foi há dois anos que se celebraram os 700 anos da nomeação. E o D. Dinis fez isto porquê? Não foi por causa da religião católica. Foi porque os piratas atacavam a navegação e ele tinha de organizar a defesa. Fez o pinhal de Leiria para poder fazer os barcos, as pessoas que tratassem disto tinham de saber – fez a Universidade; conseguiu a absolvição dos Templários, e criou com eles a Ordem de Cristo, salvando assim o património. E o que é que aconteceu? Um professor inglês do século XIX disse uma coisa muito sábia: em geral, não é a nação que faz o estado, é o estado que faz a nação. E de facto, o efeito geral de estas três coisas, acho eu… atribuo a isto… ele não pensou, mas com tudo junto acontece que havia nação em 1385 porque a nação é que escolheu o rei. E já não é de herança! É aclamação. Depois vamos perdendo essa noção mas o rei de Portugal tinha de ser sempre aclamado pelas cortes. E foi D. Dinis! E foi isto que deu essa audácia, com a sorte que tivemos com a geração do Infante D. Henrique… é um grupo espantoso que admiramos: que saber… como é que eles tiveram aquela coragem?

Hoje, como sabem, cresce uma crítica salientando a escravatura, o resto é o milagre que historiadores estrangeiros sublinham.

Entrv.: Se compararmos com as outras escravaturas, a nossa não era das mais pesadas.

Prof. Doutor A.M.: Nunca é leve, mas aqui há dois anos saiu um livro importante que interessa às universidades. Imagine que foi uma universidade da América latina que organizou um livro sobre a paz ibérica. É o ensino de Coimbra, de Évora, de Espanha, (Salamanca), e você admira-se com gente que está no século XVI a discutir se os reis têm legitimidade para tomar conta do território de gente que já lá está, se o Papa tem realmente poder para fazer essas coisas, se a escravatura é legítima, etc.
Isto é o património imaterial da humanidade… nasceu cá uma grande parte. Foi uma grande parte: Coimbra e Évora, depois os professores que nós tivemos e os missionários, para mim o padre mais importante é o Padre António Vieira

Entrv.: O Padre António Vieira?

Prof. Doutor A.M.: António Vieira! Morreu no Brasil, velho, chegara a ser preso pela Inquisição, mas depois o Papa deu-lhe imunidade. E ele já estava velho, talvez tivesse noventa anos, mas continuou a escrever e avaliar o que se estava a passar.

Ora bem, Portugal com isto (por isso é que eu comecei por dizer – Portugal, como os outros países, está sempre ligado às circunstâncias)… as circunstâncias evoluíram muito porque apareceram as novas potências como agora estão a aparecer os emergentes. Como sabe o mundo começou a ser ocidentalizado, mas não éramos só nós, eram todos os outros que apareceram com interesses próprios. É uma mudança muito firme passar de sozinhos e Espanha para muitos. A balança do poder começa a ser diferente e por isso nós tivemos períodos de decadências como foi as duas coroas, de Portugal e de Espanha, etc. Ora, para não ser muito comprido… vamos ver o que aconteceu durante a minha vida. O que aconteceu foi em 1.º lugar a guerra – uma coisa espantosa. Quando se fez a paz em 1918, antes de eu nascer, o general alemão que assinou a paz disse – isto não é paz, é armistício por vinte anos. Foi dia por dia. Veja bem. II Guerra Mundial. Nós passámos aqueles problemas, não é verdade? E depois disso, a mudança da atitude dos europeus foi de aceitar que estava a desaparecer aquilo que lhe atribuíam: ser “a luz do mundo”. Que deixou de ser, aos poucos. E, Portugal começou, talvez a se compreender na II Guerra Mundial, que em vez de dominar a circunstância, a circunstância começava a dominar. E por isso a minha conclusão neste momento (eu escusava de ter sido tão comprido) é que o país - arranjei uma palavra feia porque a situação é feia -, é exógeno, quer dizer, é objeto das consequências de decisões em que não toma parte.

(Continua)

Entrevista realizada por Maria e Marcolino Cepeda e Lídia Machado dos Santos

segunda-feira, 2 de dezembro de 2019

Equipa de investigadores do IPB vence mais um prémio

CONSERVANTE NATURAL SEM TOXICIDADE PARA VINHOS VENCE DISTINÇÃO BORN FROM KNOWLEDGE

DTOM em Seg, 02/12/2019 




ChestWine, desenvolvido por uma equipa de investigadores do Instituto Politécnico de Bragança, é o vencedor da distinção Born from Knowledge (BfK), atribuída pela Agência Nacional de Inovação (ANI), no âmbito do Prémio Empreendedorismo e Inovação Crédito Agrícola (PEICA).
O projeto, que acumulou o BfK com o PEICA na categoria “Produção, Transformação e Comercialização”, utiliza a flor de castanheiro como conservante natural isento de toxicidade para o vinho, criando uma alternativa aos sulfitos adicionados e proporcionando ao consumidor um vinho biodinâmico, diferenciado, seguro e portador de propriedades bioativas.
A ANI considerou o ChestWine como o melhor candidato de base científica e tecnológica a concurso, que lhe valeu o troféu “Árvore do Conhecimento” e um prémio monetário de 5 mil euros.
A potencialidade económica deste projeto é grande num país em que o setor vitivinícola é de grande importância tanto pelo valor económico que gera como pela população que ocupa e pelo papel que desempenha quer a nível social como de conservação do meio ambiental. De acordo com o Instituto do Vinho e da Vinha, em 2018/19, foram produzidos cerca de 6,1 milhões de hectolitros de vinho. No primeiro semestre deste ano, Portugal exportou aproximadamente 1,4 milhões de hectolitros, o correspondente a 369 milhões de euros.
A distinção BfK será entregue hoje à tarde, na cerimónia da 6ª edição do PEICA, no âmbito do encontro “Centros de Competência e a Inovação na Agricultura”, que se realiza no Auditório da Reitoria da Universidade Nova de Lisboa. O PEICA é organizado pelo Crédito Agrícola e pela INOVISA, em articulação com a Rede Rural Nacional. Este é o sexto ano consecutivo que o Crédito Agrícola apoia os empreendedores e os seus projetos inovadores, numa iniciativa que pretende contribuir para a modernização, a competitividade e o crescimento do sector agrícola em Portugal.  Aos vencedores são atribuídos prémios no valor de 25 mil euros (cinco mil cada).
“O setor agroalimentar é, atualmente, um dos mais inovadores no país. As alterações climáticas e a necessidade de criar valor em torno da marca Portugal, como certificadora de produtos de grande qualidade, representam novos desafios para o setor, que tem procurado na inovação tecnológica as respostas de que precisa. O ChestWine reúne todos os critérios de um vencedor BfK: originalidade, resposta a uma necessidade da sociedade e inovação de base científica e tecnológica”, adianta António Bob Santos, administrador da Agência Nacional de Inovação.
Citado na nota, António Bob Santos, administrador da ANI, disse que “as alterações climáticas e a necessidade de criar valor em torno da marca Portugal, como certificadora de produtos de grande qualidade, representam novos desafios para o setor, que tem procurado na inovação tecnológica as respostas de que precisa. O ChestWine reúne todos os critérios de um vencedor BfK: originalidade, resposta a uma necessidade da sociedade e inovação de base científica e tecnológica”.
Refira-se que o Born from Knowledge é promovido no âmbito do SIAC – Iniciativa de Transferência de Conhecimento, cofinanciada pelo COMPETE 2020, através do Portugal 2020 e do Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional.
Foto: António Pereira 

Retirado de www.diariodetrasosmontes.com