quinta-feira, 23 de junho de 2022

Eng. Jorge Nunes novamente condecorado



Hoje, no Palácio de Belém, recebeu do Senhor Presidente da República, a comenda da Ordem do Infante D. Henrique - gratidão nacional pelos serviços prestados.




 

quarta-feira, 15 de junho de 2022

Homenagem ao professor Eduardo Manuel dos Santos, Diretor do Agrupamento de Escolas Emídio Garcia, em Bragança)



Hoje

o acordar foi negro como um poço sem fundo

Não sei se degredo 

se tristeza impossível neste arremedo de mundo.

Hoje ou ontem quase agora

tão cedo para ir embora...

Perdi um amigo...

sempre pronto para ser amigo.

A serenidade, a bondade, a temperança...

Quantas vidas amigo, terei de viver para ser como tu?

Que continues, aí onde estiveres, 

a acompanhar os teus filhos e a tua mulher

Descansa agora no amor que deixaste.

Se sonhares, sonha viagens que sempre pediste.


Maria Cepeda

  

sexta-feira, 10 de junho de 2022

Finalmente, a excecional entrevista realizada ao Comendador António Jorge Nunes


Entrevistador: Maria Cepeda (MC), 2 de maio de 2022.

Entrevistado: Comendador Eng. Jorge Nunes (Eng. JN)

MC: Boa tarde Senhor Comendador. Estamos aqui hoje para levar a cabo uma entrevista há muito esperada. Começaremos, como é natural, pelo princípio. Nasceu na pequena aldeia de Refóios, freguesia do Zoio, concelho de Bragança. É, portanto, um transmontano de gema. O que representou e representa para si, esta circunstância? 

 

Eng. JN: Ter nascido numa pequena aldeia do concelho de Bragança, na encosta poente da serra de Nogueira, obriga a manter memórias de ruralidade e de identidade que me parecem ser significativas, marcam a minha vida e personalidade.

A primeira vez que saí da aldeia não havia estrada, mas um caminho de terra, que no inverno era praticamente intransitável, não tinha água canalizada, a distribuição era feita por fontanários, não tinha iluminação pública. (Só viria a ter depois do 25 de Abril, já eu frequentava a Faculdade de Engenharia do Porto.). Saí da aldeia quando vim para o liceu. Foi a viagem mais longa que fiz até esse momento. Sair da aldeia, chegar à cidade, foi descobrir um mundo novo. Foi uma perdição nos primeiros dois anos de estudante em Bragança, o local preferido era o jardim José de Almeida, onde jogávamos à bola, com bola feita de trapos, diversão que a polícia interrompia com frequência, obrigando-nos a saltar, escorregando pelas árvores para a plataforma inferior do jardim, local preferido para o jogo do prego. Conhecer tanta coisa diferente… nascer na aldeia nas circunstâncias em que a vida se fazia na altura, deixou-me marcas e memórias para a vida.

Lembro as dificuldades com que muita gente ainda vive e que eu e muita gente na altura vivíamos. Na minha aldeia quase todas as famílias emigraram para França, vivam com muitas dificuldades, com muito poucos recursos, ainda cheguei a usar socos de madeira de amieiro, como todos.

Os poucos recursos com que se vivia e que tinham que ser repartidos, levou-me a sempre tentar usar os recursos com cuidado, com parcimónia, perceber que a vida se faz em comunidade, em parceria, em cooperação, com interajuda… essas são características que vêm da infância, em que se partilhava o pouco que se tinha. Havia famílias que não tinham nada verdadeiramente. Eram famílias com muitos filhos, não tinham terras, não tinham animais e tinham de criar os filhos, frequentemente trabalhavam recebendo em troca produtos, como batatas, cereais etc. Praticava-se muito a torna-jeira. O tempo de infância e juventude marca-nos de forma inquestionável para a vida. A circunstância da ruralidade, marca a minha vida, sem condicionar uma visão mais alargada e urbana.

MC: Estudou em Bragança. Fez engenharia na Universidade do Porto. Porque engenharia? Fale-nos um pouco do seu percurso estudantil.

ENG. JN: Desde muito pequeno tive que ajudar nas tarefas da agricultura… tínhamos que fazer tudo o que era necessário, trabalhar nas hortas, nos campos, guardar os animais, trabalhos que se faziam como há séculos. Desde jovem apercebi-me que muitas das dificuldades inerentes a alguns trabalhos deviam ser superadas… isso despertou-me para a necessidade de alguma modernidade, algum engenho que beneficiasse as actividades que era preciso desenvolver. Essa perspetiva, mais tarde o facto de ainda enquanto estudante no Liceu e até concluir o curso de engenharia, trabalhar com máquinas agrícolas, trator, ceifeira e malhadeira, fazendo a campanha das ceifas e das malhas em aldeias como Nogueira, Carrazedo, Ousilhão e Refoios, acompanhado de um empregado com mais um bom par de anos do que eu, trabalhos que fazia em férias, todos os anos, até concluir os estudos de engenharia. A malhadeira está guardada e parada em Refoios, há cerca de 40 anos. Os meus pais sabiam da arte da lavoura, não sabiam orientar-me nos estudos a seguir. Talvez essa curiosidade inicial tenha sido o início do caminho que me levou ao curso de engenharia. Fui o único irmão que estudou. Éramos quatro. Não havia recursos para todos o poderem fazer.

MC: É o mais novo?

ENG. JN: Não. Tenho um irmão dezanove anos mais novo.

MC: Antigamente, nas aldeias, estudava o irmão mais novo… Para o livrar da vida difícil.

ENG. JN: Quando nasceu o irmão mais velho, a vida já era difícil. Os meus pais colocaram-no no seminário em Vinhais, o que faziam muitas famílias que, com as dificuldades para criar os filhos, iam pela perspectiva da igreja para encontrar um novo caminho, uma mão estendida para poder aliviar o encargo da família, mas ele, passados dois ou três meses fugiu a pé de Vinhais para a aldeia e não se perdeu no caminho. (Risos) Tentei ajudar nos estudos o irmão mais novo, que acabou por abandonar o Liceu nos primeiros anos. O irmão mais novo, em particular o mais velho, são pessoas reconhecidas pelo trabalho que tem feito, contribuem muito, como poucos, para o desenvolvimento da economia rural.  

Enquanto frequentei o Liceu, ao escolher a alínea de ciências, acabei por consolidar a opção de seguir engenharia. Como as dificuldades da família para que pudéssemos estudar eram grandes, dirigi-me à Academia Militar, onde pensava poder estudar sem pagar.

Viajei sozinho para Lisboa, onde nunca tinha ido. Fui de comboio. Foi uma viagem de muitas horas. Cheguei a Lisboa e, na estação de Santa Apolónia, perguntei onde ficava a Academia Militar. E… bom… Não conhecia absolutamente nada. Lá fui perguntando e fui andando a pé, pensando que era coisa de poucos metros, pouco mais do que ir da minha casa até à igreja, no fundo da aldeia. Lá fui andando, andando, pensava que era perto, até que cheguei. Quem me atendeu foi o militar de sentinela. Perguntou-me o que pretendia, respondi-lhe que queria inscrever-me na Academia Militar para tirar o curso de engenharia. Ele perguntou-me se tinha algum familiar no exército que me recomendasse. Disse-lhe que não tinha ninguém. “Então está despachado!” (Risos) E assim foi. Restou-me a alternativa de me inscrever na Faculdade de Engenharia do Porto.

Tirei o curso nos cinco anos previstos e trabalhei, para ajudar ao esforço dos meus pais, que hoje considero ter sido enorme face às circunstâncias de vida, aos poucos recursos que a agricultura proporcionava. Fiz um pouco de tudo, desde vender livros do Círculo de Leitores, na cidade do Porto; trabalhei num gabinete de arquitetura e engenharia na altura em que estavam a desenvolver projetos de reabilitação dos bairros degradados. As ilhas, era assim que se chamavam. Fiz levantamentos gráficos numa área da cidade. Já dominava conceitos de topografia e outros conhecimentos que me permitiam fazer trabalhos básicos de engenharia. Trabalhei no Bairro Parceria Antunes, onde hoje está o Centro Materno-Infantil do Norte. A vida não foi fácil, mas eu queria tirar engenharia e assim foi no ano de 1978. 

MC: Não deve ter sido nada fácil conciliar o ganhar o dinheiro para poder estudar com os estudos universitários.


ENG. JN: As dificuldades não eram poucas, o maior esforço foi dos meus pais. Servia na cantina da faculdade de engenharia a troco das refeições, por exemplo. Não era caso único. Para além do apoio social a que recorria, a Universidade já concedia bolsa social a estudantes de escassos recursos. Mas foi uma vida intensa e rica. Felizmente fiz o curso no tempo regulamentar com a particularidade de ter coincidido com o 25 de Abril. Tive a oportunidade única de ativamente viver este período, militei no Movimento de Esquerda Socialista, aí contactei com pessoas boas, de princípios, valores, ideais, muitos vieram a ascender a lugares de topo nos Órgãos de Soberania, Jorge Sampaio, Ferro Rodrigues, Santos Silva e noutros lugares de destaque da política, da economia. Foi um tempo fantástico, em que aprendi com o entusiasmo dos mais velhos, dei um salto em frente, consegui, felizmente, conciliar tudo, vivendo a grande mudança que se operou no dia-a-dia, dentro da escola, fora da escola. Foi um tempo riquíssimo. Casei no mês de setembro de 1977, antes de iniciar o último ano de faculdade sem festa, em ato reservado, o tempo e os recursos não eram favoráveis.

MC: Acabou o seu curso e regressou a Trás-os-Montes. Nunca pensou em viver noutro lugar?

ENG. JN: Não. O meu primeiro contacto para arranjar trabalho, é uma história interessante. Foi feito em Lisboa, com o nosso distinto conterrâneo, Dr. Raul Rego. Conjuntamente com duas colegas, a engenheira Fátima Lameiras e a engenheira Josefina, saímos de autocarro do Porto para Lisboa. Íamos fazer algumas tentativas junto de entidades públicas, Junta Autónoma de Estradas, Fundo de Fomento Habitação… levávamos uma listagem de organismos a contactar para disponibilizar os nossos currículos e apresentar a nossa disponibilidade para trabalhar. Fomos um bocadinho à deriva, sem saber bem onde ir. Não tínhamos contactos… e viajámos de autocarro, com um só bilhete. (Risos da entrevistadora e do entrevistado). As colegas ficaram instaladas numa residencial feminina e eu aluguei um quarto, na Praça da Figueira, sei que era barato. Percorremos Lisboa de uma ponta à outra. Não tínhamos a noção da geografia, da localização. Tínhamos a listagem e escolhíamos uma entidade. Ao invés de perceber a relação de proximidade de outras entidades, íamos a uma de cada vez. Enchemo-nos de andar. As respostas eram muito evasivas. Tínhamos de facto a necessidade de iniciar uma atividade profissional, para libertar os pais do continuado esforço feito: A meio da semana as coisas não estavam a correr bem e então eu decidi a partir de uma cabine pública ligar para o Dr. Raul Rego, para o jornal que dirigia. Liguei algumas vezes. Foi difícil. A secretária não lhe passava a chamada… no segundo dia de tentativas lá lhe disse: “Olhe, somos transmontanos, temos urgência em falar com o Dr. Raul Rego, precisamos da sua ajuda.” E lá conseguimos falar com ele, depois de esgotarmos muitas moedas na cabine telefónica. Encontramo-nos com o Dr. Raul Rego numa pastelaria próxima da Assembleia da República. Nunca tínhamos estado com ele. Esperamos, esperamos… depois de muitas horas de espera, já descrentes, lá apareceu e, obviamente identificámo-lo, pela boina. (Risos). Deu-nos alguma esperança e perguntou: “Vocês já passaram pela JS?” Respondi: “Olhe, nós já fizemos essa tentativa, na verdade não o tínhamos feito. Acreditamos em si, como transmontano, necessitamos da sua ajuda.” E ele, de facto, decidiu ajudar-nos. Indicou-nos algumas perspetivas que iria trabalhar e seguramente que se concretizariam e nós, nesse dia, decidimos festejar, abrir um bocadinho os cordões à bolsa, que poucos recursos tinha, e fomos a um restaurante, pedimos uma garrafa de vinho Casal Garcia, fizemos essa estravagância. Pronto e toca de comprar os bilhetes de regresso pró Porto encantados. Chegámos ao Porto todos contentes. À saída do autocarro, no quiosque da estação rodoviária, na zona da Batalha, vimos nas primeiras páginas dos jornais: “O governo demitiu-se.” E assim foi. Fracassou a nossa primeira perspetiva, sendo que, nesse contacto com o Dr. Raul Rego, eu, de facto, disse-lhe que queria vir para Trás-os-Montes. “Quero regressar à terra, quero ajudar no seu desenvolvimento.” Respondeu que tinha boas perspetivas em Torre de Moncorvo, na empresa mineira Ferrominas, que falaria com o ministro das Obras Públicas. O sonho com que viajámos até ao Porto acabava de cair.

Comecei no último trimestre de 1978 pela Câmara de Gondomar. Aceitei um estágio. Consegui esse estágio através da Dra. Virgínia Moura que não conhecia, mas dirigi-me ao seu escritório no cimo da avenida dos Aliados, era vereadora na Câmara de Gondomar. Aí trabalhei um mês e pouco. Nesse intervalo de tempo concorri à Câmara Municipal de Torre de Moncorvo. Fui o primeiro engenheiro da Câmara de Torre de Moncorvo. Foi uma situação de algum modo acidental. Fui a Moncorvo para tentar um lugar no Gabinete de Apoio Técnico (GAT) do Douro Superior, sediado em Moncorvo. Tinha ido à CCDRN (Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte), falei com o seu presidente Professor Valente de Oliveira, que me disse existirem boas possibilidades no GAT em Moncorvo, que fosse falar com o Diretor. Eu lá fui, de autocarro, meio de transporte que usei até adquirir carro próprio, o que aconteceu, em maio de 1979, altura em que fiz a viagem de carreira, de Torre de Moncorvo para Bragança, para fazer o exame prático de condução. Obtida aprovação, dirigi-me ao stand automóvel da Citroen, na rua Alexandre Herculano, propriedade do senhor António Gonçalves e procedi à aquisição de um Citroen Dyane, fi-lo pagando a totalidade com uma letra e com fiador.

Regressando à primeira viagem a Moncorvo, cheguei ao GAT e o Diretor não estava. Foi uma maçada. Desanimado, lá desci e fui à Praça Francisco Meireles, entrei no Café Central para tomar alguma coisa, alguma torrada, qualquer coisa simples, olhei para a montra e vejo um anúncio da Câmara Municipal de Torre de Moncorvo para contratação de um engenheiro. Logo ao sair do café, dirigi-me à Câmara, preenchi o requerimento, fui admitido na Câmara de Moncorvo, houve outros concorrentes, creio que a minha admissão terá tido alguma água benta do pároco de Felgueiras, padre João Barros, natural da minha aldeia.

MC: A sua atividade profissional iniciou-se, enquanto técnico superior, como já referiu, nos Municípios de Torre de Moncorvo e de Bragança. Foi Assistente e Professor Adjunto do Instituto Politécnico de Bragança e, finalmente foi nomeado em março de 2015, para vogal da Comissão Diretiva do PO Norte 2020. Quer falar-nos desse percurso?

ENG. JN: Em Moncorvo estive algum tempo como técnico contratado. Iniciei contrato com o Fundo de Fomento de Habitação que estava a construir um bairro social em Moncorvo. Precisavam de um engenheiro para acompanhar os trabalhos. Ingressei na Câmara de Moncorvo, fui o primeiro engenheiro da câmara e para mim foi um desafio e experiência muito rica. A Câmara Municipal cedeu-me uma casa de função a título de incentivo de fixação. Fiz muita coisa, conheci cada canto das aldeias do concelho, nas empreitadas, nas obras de administração direta, nos licenciamentos, tudo estava a meu cargo. Gostei muito, foi um tempo fantástico, aí cresceram as minhas duas filhas até frequentarem o ensino primário.  Na altura estava o projeto de exploração de ferro da FERROMINAS com boas perspetivas de evolução, já com financiamento assegurado por parte do Banco Europeu de Investimentos. A evolução do projeto mineiro exigia que a Câmara Municipal se preparasse em termos de planeamento e previsão para uma situação de expansão para acolher operários, engenheiros, técnicos, quadros superiores, previa-se um grande crescimento da vila. Como era um jovem engenheiro na autarquia não havia mais quadros técnicos, eu era a pessoa que tinha que acompanhar esse processo e foi uma experiência muito positiva. O Presidente da Câmara, nesse tipo de reuniões, pedia-me para assegurar a representação da Câmara Municipal.

Foi bastante enriquecedora essa experiência e fiz muitos amigos, muitos contactos. Mais tarde passei para a área de actividade privada, tendo como sócio o diretor do GAT, que deixou a chefia e a atividade pública para ingressar na atividade privada. (Risos) Foi também uma área de atividade intensa, interessante, trabalhando, participando em algumas empresas, num período difícil, em que a inflação no país era muito elevada, no início da década de oitenta, com taxas de juro a rondar os 30%. Foi difícil, mas muito interessante porque as empresas qualificaram-se, contrataram quadros superiores, mantiveram-se em actividade. Tínhamos uma filial nos Açores e eu acabei por vender as minhas quotas na perspetiva de vir para Bragança quando percebi que a Escola Secundária de Moncorvo não tinha possibilidade de continuidade de algumas áreas de formação para as minhas filhas. E, daí, decidi que tinha que vir para Bragança, andavam as meninas na escola primária. Num dado momento desloquei-me a Bragança, fui à Câmara Municipal para adquirir processos de empreitadas de saneamento, das aldeias de Rabal e de França, para poder concorrer com a empresa Edibetão, empresa de obras públicas, que na altura tinha mais de uma centena de trabalhadores, e dos maiores alvarás da região. Tínhamos boa qualificação, boa estrutura técnica e fui levantar os processos para poder apresentar as propostas de concurso. O Engenheiro Pinheiro, presidente da Câmara Municipal cumprimentou-me. Conhecia-me por causa do meu pai, talvez também da altura em que foi inaugurada a iluminação pública na aldeia de Refoios (por volta de 1975), a população pediu-me para eu, jovem revolucionário, estudante na FEUP, (Risos) fazer o discurso de boas vindas e de agradecimento ao Presidente da Câmara. A juventude permite-nos fazer muita coisa sem problemas. Eu disse à população que a iluminação não se devia ao Presidente da Câmara mas ao “25 de Abril”. Terei dito outras coisas simpáticas. Ficou meu amigo. Eu, também era amigo dele, através do meu pai. Respeitava-o. Sabia que era um bom Presidente, uma boa pessoa. Perguntou-me o que andava a fazer. Respondi que estava a levantar os processos de empreitadas de saneamentos. Disse-me que necessitava de um engenheiro experiente, desafiou-me a vir para Bragança, que me dava um lugar de chefia na câmara, que tinha essa possibilidade legal recente.  Foi um encontro interessante. Nessa altura a sociedade que detinha 50% das empresas em que eu era sócio, quis vender por preços muito elevados. Pedi uma semana para decidir, fiz uma contraproposta a de ser eu a vender e por metade do preço que me pediam. Assim, saí da atividade privada. Foi um período de trabalho muito intenso, era jovem, com muita capacidade e vontade, a experiência de trabalho de gestão das empresas, de planeamento e direção de obra, foi profissionalmente e pessoalmente muito enriquecedora. Enquanto empresário empreendedor por um lado e conhecedor do concelho, o engenheiro Aires Ferreira, presidente da Comissão Política de Secção do PS em Moncorvo convidou-me para ser o candidato do PS à Câmara de Moncorvo, referi-lhe que os meus projetos eram outros, ele que tinha vontade de vier a ser candidato, que assumisse, e que tinha o meu apoio. Fiz muitos projetos de obra pública, alguns eram concluídos em jornada direta de trabalho, ou seja, trabalhar de dia e toda a noite, continuando no dia seguinte. Nessa altura, a minha mulher foi o pilar da família, trabalhava na Ferrominas, a meio tempo, tratava das filhas, tudo junto foi uma tarefa de heroína. Com o encerramento da empresa ficou sem trabalho, tal como muitos técnicos que tiveram de deixar Moncorvo.

Mudámos para Bragança. As filhas vieram para a escola das Beatas. Fui a primeira chefia da Câmara Municipal de Bragança, a Lurdes foi colocada no IEFP, logo na altura da abertura, sendo diretor o engenheiro Moura dos Santos, foi, sem dúvida, um bom diretor. Na câmara eu fiz, quer com o Engenheiro Luís Pinheiro quer com o Dr. Mina, tudo o que podia e que estava ao meu alcance. Nunca misturei sensibilidades de qualquer natureza e fiz sempre a pensar na exigência do dever público, na perspetiva do concelho, quer como cidadão quer como engenheiro. Foi, também, uma experiência muito positiva. Na saída para o IPB, os colegas e o executivo municipal, no mês de dezembro de 1996, fizeram-me, no restaurante Académico, um jantar de despedida. Por isso eu acho que acima de tudo, para além do trabalho, consegui, também no município, fazer boas relações com os colegas, com os cidadãos, dignificar a instituição, respeitar os autarcas eleitos.  

Saí para o IPB, com vontade de progredir na vida académica, no conhecimento e na actividade profissional. Anteriormente tinha aceite o convite do Instituto Politécnico, para dar aulas na Escola Superior Agrária, no curso engenharias de melhoramentos rurais e depois na Escola Superior de Tecnologia e Gestão, algumas cadeiras como betão armado, resistência de materiais. Fui dando cadeiras em que me obriguei a fazer as sebentas teóricas e práticas das cadeiras. Gostei muito, de dar aulas, dos alunos, dos colegas e dirigentes do IPB.

Nessa altura senti necessidade de refrescar conhecimentos, atualizar passados alguns anos da licenciatura, por isso regressei à Faculdade de Engenharia para tirar o Mestrado, o primeiro que surgiu, relacionado com a área de engenharia civil. Esse facto ajudou-me um bocado. Fui convidado para concorrer para fazer parte do Quadro do Instituto, para um lugar de Professor Adjunto e eu aceitei. 

MC: Desculpe a minha inqualificável ignorância, mas eu não sabia que tinha sido Professor no IPB (Fiquei a saber enquanto preparava esta entrevista, pelas pesquisas que fiz). Eu conhecia-o pelo Marcolino que dizia maravilhas do Jorge Nunes. Dizia que era uma pessoa extremamente honesta, que queria o bem público nunca se servido dele para benefício próprio. Era esse o Jorge Nunes que eu conhecia pelas conversas do Marcolino e ele tem uma memória fantástica. Sempre o considerou como um excelente amigo. Acompanhou o seu desempenho durante o período em que esteve na câmara a trabalhar com o Eng. José Luís Pinheiro e sempre o considerou um amigo.

Temos de voltar à pergunta, pois falta falar sobre o seu papel no PO Norte 2020…

ENG. JN: É verdade. Depois de ter deixado as funções autárquicas em outubro de 2013, no início de 2015, em fevereiro, houve a necessidade de fazer uma substituição na Comissão Diretiva do Programa Regional, em representação dos autarcas, lugar que deveria ser preenchido por consenso. Nessa altura o consenso existia sobre uma pessoa, mas o Primeiro-Ministro não quis aceitar a proposta, o que obrigou os autarcas a outra escolha tendo optado por fazer uma eleição.

Os autarcas do PSD indicariam alguém, os do PS fariam o mesmo, e todos juntos, oitenta e seis, fariam a eleição. Foi a primeira vez que aconteceu uma eleição para esse lugar. Eu soube dois dias antes que haviam tomado essa decisão. Reuniram numa segunda, os autarcas do PSD, na Maia e os do PS em Santo Tirso para escolherem os seus candidatos. Passados dois dias reuniram todos para fazer a votação da eleição.

Eu concorri com um autarca meu amigo do PS, o ex presidente da Câmara de Guimarães, o Dr. António Magalhães, autarca de referência no PS. Não fiz campanha. Disse: “se quiserem, se acharem que devo ser eu, aceito mas não vou fazer campanha. Sei que vou perder por um lado, por outro, o colega de Guimarães (integrava a Comissão Política Nacional do PS.) tem vontade, está empenhado, acho-o um bom candidato, tem forte apoio partidário, não vejo problema nenhum”. “Mas tem de ser. “Está bem. Ponham lá o meu nome se quiserem.” Não fiz campanha e de facto decidiram eleger-me com um resultado significativo. A escolha foi comunicada pela Associação Nacional de Municípios ao Governo.

O Governo fez a nomeação em março de 2015, para o mandato até 2023. Eu, no ano de 2019 pedi para me substituírem, ia fazer cinco anos e achava que já tinha dado bastante à causa pública. Queria continuar, mas não com aquela intensidade e porque tinha dedicado muitos anos à causa pública… não tinha dedicado à família tempo que mereciam, e que muito me apoiou. A exigência dos cargos que desempenhei foi muito elevada, muito intensa e, decidi que era eu que tinha de decidir quando parar. Tinha o mandato até 2023, acabaram por me substituir em 29 de fevereiro de 2020. Imediatamente antes da pandemia. Foi uma sorte para poder apoiar a família. Felizmente, na saída tive o reconhecimento das equipas técnicas com quem trabalhei, o agradecimento por escrito da maioria dos municípios, foi o que de mais importante ficou nesta fase da minha vida.

MC: A sua intervenção política, sem dúvida nenhuma, foi notória e consistente. Quer falar-nos sobre esse período da sua vida? 

ENG. JN: Sim. Essa área de atividade surgiu de uma forma imprevista. Primeiro eu não era militante de partido nenhum. Estava, como já referi, empenhado na atividade como docente no IPB. 

Surgiu um convite não só de um partido mas, neste caso vou referir só o do PSD, através do Dr. Adérito Trigo, para me candidatar à câmara de municipal. Para mim foi uma surpresa porque havia muitas figuras do PSD que queriam e podiam ser candidatos. A minha escolha foi uma tarefa difícil para o presidente da concelhia, Adérito Trigo e para o seu vice-presidente Dr. Luís Afonso. De facto, eu não tinha grande motivação. Levei alguns meses até dizer sim ao Dr. Adérito Trigo. E devo dizer que foi alguma insistência do meu pai, por pressão do Dr. Adérito Trigo, que me levou a tomar a decisão, também com o conselho do Eng. Luís Pinheiro. Numa altura em que a minha orientação de vida não estava para aí virada.

As minhas interrogações eram muitas, para partir para esse combate… Nessa altura, as sondagens que começaram a surgir davam ao Dr. Luís Mina uma vitória esmagadora sobre o PSD próxima dos 70%. Acabei por aceitar o desafio. As pessoas aceitaram com bastante recetividade a minha candidatura. Apercebi-me imediatamente que tinha apoios em todas as áreas. Tinha muitos amigos de outros partidos e no PSD. Apercebi-me que queriam mudar, experimentar uma mudança no concelho, na cidade e nas aldeias… e eu decidi iniciar esse percurso. Creio que essa recetividade tem bastante a ver com a minha postura de entrega ao trabalho, fazendo-o com correção, com respeito pelas pessoas e com pleno respeito pelo bem comum que era aquilo que se impunha. Sentindo essa recetividade avancei, arrisquei e resultou.

MC: Foram quatro maiorias, o que é impressionante.

ENG. JN: Foi bem. Esteve bem…

MC: Correu bem porque a pessoa que lá estava merecia.

ENG. JN: Foi interessante porque acabei por fazer um longo período de governo do município com a confiança, sempre, bastante alargada dos cidadãos, correspondendo este período, ao maior período de governação do município, desde 1820.

MC: Sim, já lá vão uns aninhos (Risos).

ENG. JN: Sim. Pelo menos são os registos que estão no livro “Bragança Contemporânea” escrito pelo Professor Fernando Sousa. O povo foi generoso comigo. Orgulho-me de ter cumprido um desejo que formulei, o de, concluída a missão autárquica, a 14 de outubro de 2013, sair pela porta da frente, aquela por onde entrei a 6 de janeiro de 1998, não sair “pela porta das traseiras”. Ou seja, cumprir com dignidade os mandatos.

MC: Acho que foi generoso porque tinha razões para ser. As pessoas não são só porque são. Quando alguém merece essa confiança é porque está a fazer um excelente trabalho. As pessoas só se deixam enganar se quiserem. Devo dizer que, enquanto preparava esta entrevista, fui ficando impressionada. Imagino, por isso, o porquê deste respeito e desta generosidade do povo em relação a si.

ENG. JN: Acho que fiz um trabalho interessante e tentei sempre respeitar as pessoas, ouvi-las, qualquer que fosse a sua condição, sendo que no processo de decisão, eu fui sempre inflexível no respeito à prevalência do bem público contra os interesses privados que pudessem prejudica-lo e, como a política é difícil e lida com muitos interesses, acredito que uma ou outra perturbação com pessoas, resultasse mais neste campo do que no campo da relação normal. Mais no campo da decisão de não deixar que no município interesses privados viessem a perturbar o interesse público. Aí acho que fui suficientemente firme nos princípios e nos valores e passados estes anos, já depois de sair da câmara, aquilo que mais me agrada é o reconhecimento das pessoas através do olhar, do cumprimento, da simpatia e não ter ninguém que me tivesse virado a cara.

Procurei sempre ouvir ideias distintas, estudar os problemas e cultivar com as instituições uma grande relação de respeito e de proximidade que é uma questão essencial. Portanto, respeitar os responsáveis das instituições, conversar com eles, ajuda-los se sentissem fragilidades enquanto máxima autoridade do concelho que tem, de algum modo essa responsabilidade e eu, de vez em quando, reunia com alguns dos responsáveis de instituições para almos de trabalho, para conversarmos sobre eventuais fragilidades das instituições, sobre perspetivas de desenvolvimento, sobre desafios e problemas que pudesse ter o concelho.

Tentei cultivar sempre, essa relação de fortalecimento da cooperação institucional e tive sempre bem presente que nas relações com o Governo, durante os meus quatro mandatos, feitos na maioria do tempo com governos do PS, tinha de saber ganhar o respeito para que me respeitassem, o que sempre aconteceu, e assim, poder beneficiar o município, desde o Eng. António Guterres, o Dr. Durão Barroso, o Dr. Santana Lopes, o eng.º Sócrates, o Dr. Passos Coelho, o Dr. António Costa e vários outros governantes. Sempre me respeitaram. Eles ajudaram o concelho e eu trabalhei nesse sentido. Sabia que a relação entre o poder local e central teria que pender a favor dos interesses do concelho e dos cidadãos de Bragança. Nesse âmbito, nunca tive qualquer complexo e nunca me passou pela ideia criar qualquer perturbação ao exercício da governação central, mesmo sem perder capacidade e força reivindicativa, de que, publicamente nunca abdiquei. Procurei que as políticas do governo central maximizassem o desenvolvimento de Bragança e, portanto, nesse âmbito fiz bons amigos, seguramente fiz, que eu respeitei e que também me respeitaram e respeitam. O atual Primeiro-Ministro, quando me encontra trata-me por “Presidente”.

É esse tipo de contacto e de observações que valorizo como autoavaliação. Estou de consciência tranquila. Procurei fazer o melhor possível, fazendo de forma absolutamente transparente, nem sempre tomando as melhores decisões, ter de decidir entre alguns projetos em detrimento de outros, já que os recursos são limitados e nem sempre se agrada a todos, mas foi um exercício em que eu sempre procurei esse equilíbrio, por forma, na medida do possível, servir a maioria dos cidadãos, tentando não excluir, particularmente as pessoas com mais fragilidades, com mais dificuldades. Foi uma preocupação que eu mantive no governo da autarquia, quer por mim, quer através dos serviços, assegurar e garantir de que qualquer cidadão que estivesse em dificuldades pudesse sempre, ser encaminhado ou ajudado. Na área social os recursos não eram uma questão de prioridade, seria sempre a prioridade. Foi um período muito interessante e muito rico da minha vida e continuo a dizer que a generosidade das pessoas permitiu-me construir marcas de mudança, esse que tinha sido o meu slogan de campanha no ano de 1997, fazendo no respeito pelo passado para construir o futuro. Foi de facto essa boa vontade das pessoas e o apoio que me deram que tenho sempre de salientar, também o das equipas políticas e de forma total, a generalidade dos trabalhadores da autarquia, que com entusiasmo fizeram o melhor. A confiança foi o cimento que tudo permitiu, governar em prol do interesse de todos.

MC: Que obras destacaria dos seus quatro mandatos na presidência da Câmara Municipal de Bragança?

ENG. JN: É um exercício difícil… Antes de responder quero salientar que o primeiro pilar da gestão foi o de garantir o bom governo da instituição, do rigor financeiro do respeito pela legalidade, pelos cidadãos, pelo bem comum, no sentido de otimizar recursos, dar ânimo e ambição aos cidadãos, instituições e empresas. Desde o primeiro ao último dia, a entrega foi a mesma, no início surgiram algumas emergências, destaco ter sido confrontado com a urgência de construção de um novo cemitério na cidade, processo nada fácil em termos de aceitação de localização e de obtenção de terrenos etc. Foi construído e designado de Santo Condestável, nome sugerido pelo Bispo da Diocese D. António Rafael, que fez a sua bênção, em 2001. Tínhamos um plano B, enquanto a construção não estivesse finalizada, fazer inumações num dos cemitérios rurais. O projeto que mais trabalho nos deu foi o projeto da Barragem das Veiguinhas. Exigiu-me imenso durante os quatro mandatos. Sabia que era um projeto absolutamente prioritário, cuja concretização tinha muitos adversários, alguns na assembleia municipal. A água é um bem escasso e fundamental à vida das pessoas e à atividade económica do município. A cidade de Bragança vivia com escassez de recursos da água, sempre assim foi ao longo de séculos, vale a pena escrever a história de séculos, do abastecimento de água à cidade e perceber como foi a grande preocupação dos brigantinos. A seca do ano 2005 pôs bem à vista o que era essa fragilidade que obrigou o município a medidas drásticas de contenção de consumo e de transporte de água a partir do Azibo. Fê-lo noutros anos a seguir, o país apercebeu-se pelas muitas notícias da imprensa regional e nacional, que Bragança se confrontava com um grave problema.

Convencer a administração central, de que o impacto positivo para o concelho superava muito o impacto negativo no Parque Natural de Montesinho, foi um exercício muito complexo, sem esquecer que o armazenamento de água, permitia de verão libertar água para o rio, com elevado benefício para a biodiversidade. Tive que lidar com vários ministros do ambiente, muitos secretários de estado, com alguns Primeiros-Ministros até que, a cerca de dois anos de terminar quarto e último mandato, se conseguiu desbloquear a situação, com o Primeiro-Ministro Dr. Pedro Passos Coelho. A obra foi feita e Bragança nunca mais se queixou de falta de água. Esse é um projeto de referência que foi concretizado, para o abastecimento ao longo de décadas, de um bem essencial à vida.

Há muitos projetos concretizados na área da cultura, em edifícios novos ou reabilitados, no centro histórico, como o antigo colégio dos Jesuítas, (atual Centro Cultural Adriano Moreira, Biblioteca Municipal; Biblioteca Adriano Moreira e Conservatório de Música e Dança) que estava em ruínas, sem telhado, ou da antiga agência do Banco de Portugal, entre outros. A área da cultura em termos autárquicos é de enorme relevância, é um pilar estratégico para as comunidades locais. Bragança precisava de fazer esse avanço. Acho que o fez bem e depois, obviamente, a requalificação da cidade foi um belo trabalho, necessário. A cidade precisava de se modernizar, tornar competitiva, mais atrativa, mais asseada e limpa. Quem visitava cidades próximas, Zamora, Salamanca, etc., percebia que havia muita fragilidade, necessidade de evolução. Bragança tinha poucos espaços verdes. Aceitava-se a ideia de que a floresta das montanhas que fazem a moldura verdejante da cidade era verde suficiente. A atratividade, a modernidade e a competitividade exigiam muito mais na área do ambiente, exigiam a plantação de milhares de árvores na cidade, de parques urbanos.  

A área do ambiente foi um terceiro pilar da gestão municipal, quer nas questões do saneamento básico, quer nas questões de espaços verdes, quer de resíduos sólidos urbanos. Lembro que quando cheguei à câmara, havia uma lixeira à entrada da cidade, na entrada de quem vem de Vinhais e havia outra na Quinta das Carvas onde o lixo era queimado e ardia durante o verão a céu aberto libertando intensas colunas de fumo sobre a cidade, em particular quando ardiam os pneus e outros plásticos. Fez-se um trabalho profissional na organização do sistema de recolha, de limpeza, quer na cidade, quer nas aldeias, de tratamento e reciclagem dos lixos urbanos. Registei depoimentos de turistas, incluindo americanos, que escreveram para a câmara e elogiar a limpeza da cidade. A área do ambiente foi uma área a que se dedicou muito, até pela minha formação… Já na faculdade a minha sensibilidade na área ambiental era elevada, afirmo ser um ecologista à nascença, não fundamentalista.        

Fez-se muito noutras áreas. Na área da economia, sendo as empresas que criam riqueza, sabíamos que a autarquia tinha um papel importante na criação de melhores condições para o investimento. A economia necessitava crescer, aumentar a oferta de emprego, garantir maior confiança no futuro. Bragança, em termos industriais não constava no perfil exportador do país. Representava duas ou três décimas, não era nada, a dependência dos serviços era excessiva. A necessidade de captar investimento externo era um desafio. Conseguimos captar, o investimento da FAURECIA para Bragança. Tem uma história muito interessante. Não foi um processo fácil. Sabíamos que era necessário captar investimento externo e de preferência, investimento que pudesse ancorar outros investimentos como prestadores de serviços para essa empresa e assim aconteceu de facto. Captámos a FAURECIA. Através desta empresa, hoje há outras empresas que se fixaram em Bragança nas zonas industriais, empresas nacionais e outras, que são fornecedores da FAURECIA mas também exportam para outros mercados, empregando muitos quadros qualificados. Na altura soube através de um amigo com responsabilidades na administração central, que o investimento desta multinacional francesa estava a ser negociada pelo governo para se instalar num concelho do Minho, em Arcos de Valdevez, no âmbito do que ficou conhecido na Assembleia da República, como Orçamento do “Queijo Limiano”, foi aprovado na Assembleia da República com o voto do deputado engenheiro Daniel Campelo e creio que, do Dr. Francisco Araújo do PSD, eleitos pelo distrito de Viana do Castelo. Soube dessa negociação, um amigo deu-me a direção da empresa em Paris. Escrevi para o presidente do conselho de administração a disponibilizar-lhe as instalações da antiga fábrica GRUNING que a câmara tinha adquirido em processo muito exigente e muito polémico na própria Assembleia Municipal, só por si é uma história. Este processo e a captação da Faurécia para Bragança são uma história política e administrativa interessante e longa, só possível descrever em algumas páginas. Passados dez dias tinha a resposta, o agendamento de reunião com o responsável da empresa para a Península Ibérica, que decorreu na Câmara Municipal. A partir dessa reunião foi uma corrida contrarrelógio, a empresa impôs-nos um conjunto de exigências a resolver num prazo muito curto. Para responder elaborámos um dossier técnico-financeiro exigente. Contámos com o apoio da AICEP e da Agência de Investimento e de outras boas vontades, numa equipa de cerca de duas dezenas de pessoas capazes, una para tratar dos apoios financeiros públicos, outros para os problemas administrativos e jurídicos e também para uma matéria muito sensível de âmbito ambiental, designadamente a descontaminação de solos.

Havia problemas ambientais por resolver ligados à atividade da anterior empresa alemã, a Gruning, de que muito a imprensa local e nacional falou, que tinham envolvido negociações entre os ministros do ambiente de Portugal, engenheiro José Sócrates e da Alemanha, Angela Merkel. Num prazo curto, trabalhando sem descanso, conseguimos que a empresa viesse a optar pela sua instalação em Bragança, tendo abandonado a negociação com o governo para se instalar em Arcos de Valdevez, conforme compromisso.

Estava subjacente a instalação em Bragança do maior investimento privado de sempre em Trás-os-Montes, que poderiam vir a ser muito aumentado, e envolvia centenas de postos de trabalho. Tínhamos que apostar na área da economia, na criação de postos de trabalho, na alteração do perfil industrial do concelho. Bragança é hoje uma das cidades mais exportadoras da região norte, na altura era estatisticamente irrelevante, só tínhamos a exportação de castanha. O volume de exportações era muito baixo. Esta empresa trouxe outras empresas associadas que geraram mais emprego qualificado, fixando jovens técnicos de Bragança trazendo outros de outras regiões, uma transformação rápida que era difícil de prever. Acreditamos e Bragança ganhou. No âmbito desta estratégia de desenvolvimento sabíamos ser necessária evoluir nas competências científicas e tecnológicas da cidade. Começamos a sonhar com um novo projeto, que nos deu muito trabalho na conceção, no convencimento de aceitação pelos governantes e na obtenção de financiamento.

No ano de 2004 tínhamos a ideia já consolidada, como tecnoparque eco energético, ligado à temática do ambiente, a instalar na Traginha, sendo os projetos base de uma consultora de Madrid. A ideia ganhou maior consistência. Visitamos o parque tecnológico de Boecillo, da Junta de Castela e Leão, para uma parceria. Neste ano, conforme as notícias públicas evidenciam, falava-se na instalação de um tecnopolo em Bragança, essa era a ideia de projeto do então Ministro das Cidades, Dr. Isaltino Morais, um conceito um pouco diferente do nosso. Houve alguma disputa por parte de Mirandela, embora a Câmara Municipal nada tivesse feito, o ministro era natural desta cidade, disputa relatada nos jornais locais. Nada aconteceu, o ministro esteve pouco tempo no governo. Numa visita do primeiro ministro Durão Barroso, no dia de inauguração do túnel da avenida Sá Carneiro, final de 2003, apresentamos, na sessão pública que decorreu no cine teatro Torralta, o projeto do tecnoparque para solicitar o apoio do governo.

 Fomos persistentes, continuamos o trabalho, até que no ano de 2009 conseguimos avançar com a construção do Parque de Ciência e Tecnologia, visando qualificar a atividade económica, através da investigação, da inovação, da incubação de empresas tecnológicas, com o objetivo de fixar atividade industrial altamente qualificada, fixar empregos qualificados. Estávamos então a trabalhar numa quarta dimensão da gestão, a da economia do concelho. Passaram alguns anos, a previsão inicial era a de crescer mais rápido, com mais edifícios, ampliação da infraestrutura. Tem que haver um esforço prioritário nesta área. O grande impulso económico do concelho deve ser transversal, às atividades económicas, incluir mais conhecimento, inovação e mudança de paradigma, para a economia verde e do conhecimento. A autarquia tem que manter a visão e um maior empenho neste projeto.

Houve projetos pelos quais lutámos, não concretizados, outros que ficaram orientados para a gestão seguinte. Destaco a luta pela Universidade de Bragança. Para pena de muita gente e minha não conseguimos que o IPB viesse a ser transformado no que poderia ser uma Universidade de Ciências Aplicadas. Foi muito o esforço da autarquia, do presidente do IPB, da Associação de Estudantes, Associação Comercial, NERBA, etc. Teve alguns opositores locais. Nos anos mais recentes, o projeto deixou de preocupar os responsáveis, políticos e académicos e empresariais, o que não é bom.

MC: Sim. Apesar de o IPB estar muito bem cotado a nível nacional e internacional, é sempre um politécnico.

ENG. JN: O processo de competição entre instituições de ensino superior é muito elevado e as do Interior estão, de um modo geral, em desvantagem. 

MC: Pergunto o porquê desta resistência do Poder Central contra este território? Não se consegue entender muito bem…

ENG.JN: É o centralismo. A cultura centralista que esgota os recursos do país e tudo concentra em Lisboa. No litoral concentra-se a economia, as pessoas, o conhecimento, o poder financeiro e administrativo. Sabemos como tem sido paulatinamente e ao longo das últimas três décadas, extintos ou esvaziados de competências, tantos serviços em várias áreas. Vejamos dois exemplos emblemáticos: o encerramento do caminho de ferro e a extinção da presença militar em Bragança. Mesmo a Região Norte foi esvaziada de Direções Regionais e de competências. A concentração do poder em Lisboa tem sido muita. A região tem perdido de forma clara, voz política, voz económica, voz administrativa. O sistema político tem favorecido muito isso. Vemos a obediência dos deputados à estrutura partidária e a perda do objetivo central que é a defesa dos interesses das pessoas que os elegem. A lei eleitoral necessita ser revista, de outro modo os cidadãos eleitores cada dia se afastarão mais do sistema político, abstendo-se de exercício essencial da democracia, a escolha através do voto. Conseguir benefícios para os territórios do Interior não é fácil. É preciso encontrar muito boa vontade da parte dos decisores do governo central e muita energia e determinação política a nível local.

A universidade chegou a ter declarações públicas favoráveis por parte do engenheiro António Guterres, de Durão Barroso, enquanto chefes de governo, também de outros políticos. Também houve políticos que achavam que Bragança não devia ter uma universidade, mesmo políticos da região. Esse projeto não se concretizou ainda, é, no entanto, um projeto estruturante, estratégico para o futuro da região e da própria instituição. Sempre há momentos altos e baixos nas instituições, por isso temos que preparar soluções que evitem retrocessos.

Quando cheguei à câmara estava em construção a circular a Bragança do IP4, estava a iniciar o troço de Bragança a Quintanilha e na minha tomada de posse eu disse que “Bragança não pode ficar excluída do mapa de autoestradas e logo desencadeamos uma luta intensa. Esse processo foi desencravado com o III Congresso transmontano. Na altura houve pessoas, algumas da região, com responsabilidades públicas, até no Parlamento, quem afirmaram que Bragança não precisava de autoestrada, nem sequer o IP4 estava concluído. Está escrito na primeira página de um jornal local. Não desistimos. Quando estava a ser construída a ponte do IP4 sobre o rio Sabor, insisti muito para que essa ponte tivesse perfil de autoestrada. Deu alguma polémica. Houve quem dissesse que depois se faria um alargamento da ponte em construção, afirmei que, pelo contrário, teria de se fazer uma ponte nova e assim desperdiçar dinheiro (e assim veio a ser), quando o que se impunha era logo naquele momento deixar a ponte com perfil de autoestrada. Mais tarde, insistimos que a ponte de Quintanilha fosse construída com perfil de autoestrada. O governo de Durão Barroso e de seguida o de Santana Lopes decidiram executá-la com perfil de autoestrada. Com o III Congresso Transmontano em 2002, conseguimos desencravar a região, em termos de acessibilidades rodoviárias, vindo a ser em pouco mais de uma década construídos o IP2, o IC5 e a A4.

A partir de setembro de 2002, no pós-Congresso, tendo por base o compromisso político assumido pelo governo e a boa vontade do Presidente da República, iniciou-se, logo no mês de outubro um processo de reuniões entre a AMTAD - Associação de Trás-os-Montes e Alto Douro, a que presidia, com o ministro das obras públicas, Engenheiro Valente de Oliveira. Fizemos várias reuniões, priorizaram-se investimentos e a partir daí, o processo começou a evoluir bastante rápido. Repare que em 30 de setembro de 2004, dois anos depois, é tomada a decisão, no Conselho de Ministros, de ligar Bragança à autoestrada. Era Primeiro-Ministro o Dr. Pedro Santana Lopes. Eu estava em Amsterdão com mais três colegas, o engenheiro Carlos Taveira de Vinhais, de Vimioso, o Dr. José Rodrigues, de Miranda do Douro, o engenheiro Manuel Rodrigo, recebi uma chamada às dez da noite, no dia 29 de setembro, do então Primeiro-Ministro a dizer que ia tomar a decisão no dia seguinte, no Conselho de Ministros que reunia em Coimbra, de ligar Bragança por autoestrada.

Assim foi. O conselho de ministros reuniu em Bragança pela primeira vez, pouco depois, a 11 de novembro de 2004, nesse dia estava publicado em Diário da República, o concurso para a elaboração do estudo da autoestrada. Na conferência de imprensa que se seguiu ao conselho de ministros, foi declarado pelo ministro das obras públicas, que o governo se propunha investir até 2009, oitocentos milhões de euros na construção do IP2, do IC5 e da A4.

Passados poucos meses, houve eleições legislativas, sucedeu José Sócrates que deu seguimento a estes projetos. O último troço da A4 inaugurado foi o túnel do Marão, no ano de 2015. Em pouco mais de uma década Trás-os-Montes ficou desencravado, note-se que a A24 estava em execução quando decorreu o III Congresso Transmontano e Alto Duriense.

Se assim tivesse acontecido com a Universidade, também reivindicada nas conclusões no III Congresso, estaríamos com melhores perspetivas de futuro. Estamos no Interior, com algumas debilidades estruturais, a atual capacidade do IPB, de captação de alunos dos PALOP, no âmbito da mobilidade, ou de países europeus, pode sofrer quebras, nada é eterno, é preciso antever e preparar mudanças, razão pela qual me parece que o estatuto de Universidade de Ciências Aplicadas defendia melhor a instituição, em termos de imagem e de competitividade. Infelizmente esta luta deixou de ser mobilizadora, isto para dizer que está cada vez mais difícil e os deputados são menos e falam pouco dos problemas da região.

MC: É verdade. Não falam quase nada. Então, em termos culturais fez-se muito, como já referiu. Fez-se imenso. O Centro de Arte Contemporânea Graça Morais, o Centro de Fotografia Georges Dussaud, aqui a Biblioteca Adriano Moreira, o Centro Cultural Adriano Moreira… Isso tudo…

ENG. JN: O Teatro Municipal, o espaço de memória da presença militar no Forte São João de Deus, o Museu Ibérico da Máscara e do Traje, o Centro de Ciência Viva, o projeto de requalificação do Museu Ferroviário …

MC: O Centro Interpretativo da Cultura Sefardita…

ENG. JN: Sim, sim. A cultura e o ensino foram o segundo pilar da governação municipal. Sinto satisfação, quando assisto, a espetáculos da Escola de Dança ou de Música, da atuação da banda filarmónica de Bragança que tanto evoluiu com jovens músicos formados no Conservatório de Música, quando olhamos para as escolas dos nossos netos, todas recuperadas ou novas, caso dos centros escolares inaugurados no âmbito das comemorações do centenário da República. A cultura Sefardita exigia o lançamento de um projeto, que levou bastante tempo em termos de investigação, feita pelo Centro de Estudos da Cátedra Sefardita da Faculdade de Letras de Lisboa. Mas houve também alguns investimentos na área cultural na parte rural. Por exemplo, o Museu Etnográfico de Izeda, na Casa do Povo, ficou um museu bonito à escala da vila. Os conteúdos foram muito bem estruturados. Em Outeiro foi criado um pequeno Museu na antiga Cadeia, tendo sido apoiadas outras pequenas iniciativas na área rural.

MC: Claro. O que se nota na cultura, é que há um maior interesse das pessoas. Por exemplo, Graça Morais e o seu espólio. Adriano Moreira que decidiu que seria aqui, contra ventos e marés, talvez…

ENG. JN: Com alguma oposição local, expressa num jornal. Mas também Graça Morais. Houve quem tivesse referido não ser o tempo, ou não ser oportuno.

MC: Sendo de Vila Flor, poderia ter feito lá o Centro de Arte Contemporânea. Tinha toda a legitimidade para o fazer…

ENG. JN: Ela tinha essa vontade. A câmara não deu a celeridade necessária ao projeto que se foi arrastando. Eu fui suficientemente leal com o presidente da Câmara Municipal, o amigo Artur Pimentel. Disse-lhe que se ele não desse andamento ao projeto, a Câmara de Bragança avançaria e que a pintora Graça Morais estava interessada. Deixei claro que a nossa ideia seria sempre a de respeitar a opção por parte da Câmara Municipal de Vila Flor. Assim foi. Num espaço interessante, um antigo solar, edifício abandonado, propriedade e antiga Agência do Banco de Portugal, entidade com a qual se desenvolveu negociação interessante, feita com intervenção direta do Governador, Dr. Vítor Constâncio. Fez-se um esforço significativo em termos financeiros, quando assumi a presidência da Câmara Municipal, a divida a bancos e fornecedores era muito elevada, teve que ser reestruturada, mesmo assim, a minha ideia foi a de não me deixar vencer por essa situação, e assumir fazer o que de mim os cidadãos esperavam. A ideia da construção de um Museu de Arte Contemporânea teve a sua génese cinco anos antes de ter feito qualquer contacto com a pintora Graça Morais. Foi no âmbito da cooperação transfronteiriça, uma dimensão da política municipal a que se deu impulso, nessa altura, fazíamos projetos conjuntos relevantes. No presente a Cooperação transfronteiriça perdeu muito, está um pouco parada, não se dá conta de iniciativas. Projetos tão relevantes como os que o AECT, Agrupamento Europeu de Cooperação Territorial, com sede em Bragança e da Meseta Ibérica – Reserva Transfronteiriça da Biosfera, classificação atribuída pela UNESCO, sob gestão do AECT, nem sequer está sinalizado no território, isso era a prioridade, divulgar tão importante classificação e dela tirar benefícios sociais e económicos.

O Museu da Arte Contemporânea foi feito no âmbito de uma parceria com Zamora, em que, no acordo de cooperação assinado em setembro do ano 2000, assumimos conjuntamente obter financiamento comunitário, visando a criação de um Pólo Cultural Regional Transfronteiriço, o que entre outros projetos passava por construir dois museus de arte contemporânea, com projeto de arquitetos de referência, preferencialmente premiados. Do lado português convidamos o arquiteto Souto Moura, do lado espanhol, Rafael Moneo, ambos premiados a nível mundial. Que aos museus fosse atribuído o nome de artista consagrado em cada um dos territórios. Em Zamora foi atribuído o nome do escultor Balasar Lobo e em Bragança, o da pintora Graça Morais, no ano de 2005, projetos que teriam parceria com o Museu de Serralves e com o Museu Rainha Sofia. Os museus foram construídos, perdeu-se progressivamente a ideia da programação cultural conjunta entre as duas cidades.

MC: O Centro de Fotografia Georges Dussaud foi, talvez a ajuda do Dr. José Monteiro?

ENG. JN: Foi. Eu conheci o casal Georges Dussaud e Christine Dussaud quando das Comemorações Nacionais do 10 de Junho de 2004 em Bragança. Estava a dar um passeio com o Dr. Jorge Sampaio, a minha esposa e a esposa do Dr. Sampaio, Dra. Maria José Rito, pelo POLIS, sem seguranças próximos, acompanhava-nos um dos seus assessores, António Manuel, já falecido, passeamos de forma descontraída, em conversa informal, estávamos a entrar na zona da Praça Camões e eu vi o casal Georges Dussaud que estava no passeio do outro lado da rua. Disse ao Dr. Sampaio que lhe ia apresentar o autor da exposição que estava a decorrer nesse momento, no âmbito das comemorações do 10 de junho, organizado para a Presidência da República, a aproximação fez-se nesse momento. O Dr. José Monteiro foi um importante obreiro neste processo de diálogo tendo em vista o acolhimento do espólio do Georges Dussaud.

MC: Nós entrevistámo-lo. É uma pessoa de quem se gosta. Voltando agora para o Concurso Literário da Lusofonia Professor Adriano Moreira, pergunto: O que é que isso trouxe em termos de riqueza cultural à cidade, à região?

ENG. JN: A resposta exige-me algum enquadramento prévio. O tema da diáspora e em particular da lusofonia foi tratado com empenho, a partir de 2002, iniciaram-se os “Colóquios da Lusofonia”, nos quais foram sendo genericamente abordados projetos como o lançamento de um prémio da lusofonia, a criação de um Museu da Língua Portuguesa, colóquios que decorreram até 2011, colaboraram distintos investigadores dos países da lusofonia, a Academia de Ciências de Lisboa, a Academia de Letras do Rio de Janeiro, a Academia Galega de Língua Portuguesa e outras. No âmbito dos Colóquios, na 5.ª edição lançamos o Prémio Literário da Lusofonia. Com a criação da Academia de Letras de Trás-os-Montes, no ano de 2010, projeto que apresentei como compromisso político nas eleições de 2009, abriu-se uma nova perspetiva. Com o alargamento do Conselho de Curadores da Biblioteca Adriano Moreira, ao qual presido, em abril de 2018, ao IPB, à Diocese de Bragança-Miranda e à Academia de Letras de Trás-os-Montes, foi retomado o Prémio Literário da Lusofonia, ao qual foi associado o nome do Professor Adriano Moreira. No âmbito do Conselho de Curadores, a Academia de Letras assume a responsabilidade de dinamizar o Prémio Literário, sob responsabilidade do Conselho de Curadores e com o apoio essencial da Câmara Municipal.

A criação da Academia de Letras foi um grande passo, como muito bem hoje se observa, pelos associados, pelas iniciativas, pelo amplo reconhecimento. O meu sonho para esta década, para a Academia, é o de que a Academia de Letras, viesse a ter um edifício próprio, digno, no centro histórico onde tivesse um auditório, uma boa biblioteca, um bom espaço de exposição e de doações de associados, que estivesse aberto permanentemente.

O alargamento do Conselho de Curadores da Biblioteca Adriano Moreira a instituições relevantes, veio dar maiores garantias de preservação e valorização da doação e da obra do Professor Adriano Moreira, e de iniciativas ligadas à Biblioteca, como o Prémio Literário da Lusofonia Professor Adriano Moreira, ou o desenvolvimento do Ciclo Bianual de Conferências “Conversas sobre Valores e o Futuro”, tendo conferencistas grandes pensadores, cujas conferências serão editadas numa sequência editorial.

A nossa ideia do Prémio Literário é o de valorizar, no meio académico e dos autores da Lusofonia, o desenvolvimento de competências culturais, apoiar a afirmação de Bragança cultural no espaço da CPLP, prémio que ganhará ainda mais relevância quando o Museu da Língua Portuguesa estiver a funcionar. Está presente uma ideia de projeto, que envolve a Academia de Letras de Trás-os-Montes, o prémio Literário da Lusofonia Professor Adriano Moreira e o Museu da Língua Portuguesa, num conceito universal no âmbito da Lusofonia. As duas primeiras edições do Prémio foram interessantes, as próximas serão melhores.

MC: Acho que sim. De alguma forma, as pessoas pensam em cultura literária e já pensam em Bragança. E isso é muito importante. O Marcolino é sócio da academia e quando faziam as assembleias, onde estavam pessoas do Pará, de Brasília…

ENG. JN: De Angola, de Timor…

MC: Entendo que esta instituição tem pernas para andar. Anseio que se desenvolva cada vez mais e que se transforme em polo aglutinador da lusofonia.

ENG. JN: Acho que se vão desenvolver. Há algumas fragilidades criadas pela crise financeira de 2009, a que vieram juntar-se a crise sanitária Covid-19 e em cima desta, a crise provocada pela guerra na Europa, feita pela Rússia à Ucrânia, apesar de tudo isso, que não é pouco, estou convencido que Bragança concretiza os seus projetos. Seria importante que, na perspetiva do meio prazo, a câmara começasse a preparar uma candidatura a Capital Europeia da Cultura, para reforçar as estruturas existentes e até para criar alguma nova. Acho que a dinâmica cultural da cidade, do concelho, no fundo esta âncora do interior norte, não pode ficar pelo que tem. Tem que ter mais e acho que esse era um bom desafio, para mobilizar e focar mais as atenções naquilo que de muito bom Bragança tem e nas possibilidades de abraçar novos desafios.

MC: O senhor Engenheiro foi um dos grandes impulsionadores do Museu da Língua Portuguesa, juntamente com Adriano Moreira, Sobrinho Teixeira enquanto Presidente do IPB, Ernesto Rodrigues, Amadeu Ferreira que infelizmente já não está connosco, Telmo Verdelho…

ENG. JN: Várias pessoas apoiaram o projecto. O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, manifestou o seu apoio através de documento escrito enviado ao professor Adriano Moreira, e várias outras pessoas. A câmara municipal agora com o Dr. Hernâni Dias, está a recuperar os antigos silos da EPAC adaptando-o a Museu da Língua Portuguesa, com alguns percalços e imprevistos.

MC: Mesmo porque, é marcante. Existe um em São Paulo, Brasil. Não há mais.

ENG. JN: Para perceber melhor a ideia do que poderia ser o Museu da Língua, ideia emergente nos Colóquios da Lusofonia, fui visitar o museu de São Paulo. Estive lá com algumas pessoas incluindo o Vice-presidente da Câmara Municipal, engenheiro Rui Caseiro, para nos esclarecermos e podermos vir a assumir de forma efetiva este desafio. Depois de entrar e ver o conteúdo do museu, a forte interatividade, oportunidade educativa tão interessante para os estudantes, nós dissemos, tem de ser. Agora, uma coisa é ter de ser e ter vontade de fazer outra coisa… é concretizar. No meu mandato não conseguimos. Tinha essa perspetiva para o último mandato, mas não se conseguiu, fizemos muitos outros projetos, destacando os Paços do Concelho. Felizmente com Dr. Hernâni Dias, manteve-se e está a ser executado, após obtido financiamento através de fundos comunitários e eu tive a sorte de ter sido nomeado como gestor público, assumindo o cargo de vogal da Comissão Diretiva do Programa Norte 2020, e dar aval ao financiamento do projeto do Museu da Língua, que será valia importante no quadro dos equipamentos culturais de Bragança.

MC: O que existe é falta de gente e tudo isso que se fez e que se fará, visa atrair mais gente. Penso que o museu será um dos polos de atração. Nós precisamos de gente que viva cá, mas também precisamos de quem nos visite. E o que eu noto é que há muito mais gente que nos visita.

ENG. JN: Sim. O museu é capaz de atrair muitos jovens estudantes do secundário de todo o país, e turistas diversos. Será uma âncora na área da cultura.

MC: O seu terceiro livro remete-nos para temas associados ao património, à cultura, às cidades, às alterações climáticas e às desigualdades territoriais, no essencial, ligadas às questões do desenvolvimento regional, com foco nos problemas da interioridade. Haverá forma de resolver esses problemas?

ENG. JN: Sim. Os problemas da interioridade são um problema que já traz séculos atrás.

Tem sido um problema real de condicionamentos e restrições para os cidadãos que vivem no Interior. Foi pior, quando não havia estradas capazes, se circulava por caminhos, em meios de tração animal, a cavalo, na Malaposta, quando as deslocações de pessoas e mercadorias se faziam com mais dificuldades, com menos segurança. No final do século XIX e início do século XX, a situação mudou, com o comboio a vapor e o automóvel, os tempos de percurso encurtaram, ficamos mais próximos, menos isolados. O conceito de interioridade era mais sentido nesses tempos, as pessoas viviam muito mais isoladas e em situação de maior pobreza. Apesar disso, Trás-os-Montes e Alto Douro entre 1960 e 2021 perdeu quase 50% da sua população. O problema da interioridade não tem só a ver com a acessibilidade, também com a disponibilidade de serviços públicos, de oportunidade de emprego e do rendimento das famílias. 

Bragança sempre deu ao país tudo o que lhe foi pedido. Sempre foi solidária. Pagámos impostos como todos os portugueses, por vezes mais elevados, apesar de ser mais pobre. Ao longo de séculos os seus mais jovens militares partiram para onde o dever chamava, muitas vezes eram os primeiros a ter que cumprir o dever. Bragança acolheu a tropa, por vezes em casa das próprias pessoas, com sacrifício enorme da população, em momentos em que os quartéis estavam danificados ou eram insuficientes. Bragança defendeu a fronteira durante séculos, isolada, sozinha, o último rei que se deslocou a Bragança fê-lo no ano de 1483, D. João II, que se deslocou a Bragança para repor a sua autoridade no Castelo, nem mesmo os monarcas da IV Dinastia de Bragança, desde 1640 a 1910, o fizeram, ainda assim, o povo nordestino não deixou de cumprir com as suas exigentes obrigações de defesa do território. Por isso e muito mais, Bragança merecia maior solidariedade nacional, o que não tem acontecido. Pelo contrário, veja-se o facto de em Bragança terem acabado com a presença militar e em cidades tão próximas como Chaves, Vila Real e Lamego se ter mantido. Nas últimas décadas Lisboa tem retirado serviços e recursos ao Interior, acentuando novamente o conceito de interioridade. Se é verdade que hoje estamos menos isolados, temos melhores instituições de ensino, melhor rede social, melhores infraestruturas, melhores instituições, falta a oportunidade e as condições que permitam desenvolver a atividade económica, criar postos trabalho, fixar os jovens. Falta o regresso do comboio, voltamos a estar excluídos dos projetos de modernização da rede ferroviária nacional. Temos de lutar por uma ligação ferroviária moderna que nos ligue à rede nacional e à rede europeia. Mas, se é verdade que a situação presente não se pode comparar às condições de vida que tiveram os nossos antepassados, mesmo os pais e avós, a realidade é que em termos relativos, o interior continua com problemas graves que se refletem na demografia e na redução da atividade económica. O país tem um problema demográfico, mas o interior tem um problema grave de despovoamento e envelhecimento da população, com tendência de agravamento. No livro que referiu apresento propostas concretas para tentar vencer este ciclo de divergência com as regiões do litoral e de apontar o interior como essencial para o crescimento da economia nacional.

MC: Ainda fazemos centenas ou muitas dezenas de quilómetros para ir fazer uma consulta.

ENG. JN: Sim, só se vêm ambulâncias na autoestrada a circular em direção ao Porto, a Viana do Castelo e a não sei quantos sítios, para fazer coisas simples como exames elementares de diagnóstico. É uma irracionalidade completa, um esforço económico, perda de tempo e sacrifício, que os cidadãos do litoral não fazem. Há investimentos essenciais no âmbito da saúde, para melhorar a qualidade de vida das populações e assegurar confiança às pessoas que aqui se podem fixar. É uma luta em que não podemos baixar os braços, não nos podemos render ao encanto das boas intenções, das palavras simpáticas dos centralistas, que olham para o Interior muito através da estatística, menos pela exigência de soberania e de proteção dos cidadãos destes territórios.  

MC: No quarto livro faz a síntese de um século de congressos transmontanos. Um relato de esperança, parte da caminhada do heróico povo transmontano e duriense, nas suas preocupações e realizações, na luta incansável por um futuro melhor e avança propostas para a realização de um novo congresso, de uma união de esforços e de políticas contra o despovoamento. Será, a sua esperança plausível? Conseguiremos, enquanto transmontanos, contribuir para a mudança de paradigmas a nível nacional e governamental, seja o governo qual for, para a compreensão do país como um todo?

ENG. JN: Acho que sim. Quando realizámos o III Congresso, estavam trinta e seis municípios agregados numa associação à qual eu presidia, todos se envolveram com elevado empenho, sinal de união, de respeito entre todos, de congregação de esforços. Em termos administrativos, hoje, em vez de uma associação existem três comunidades intermunicipais, o que torna o exercício mais difícil. O apelo que eu faço é que as três comunidades se entendam para liderar uma próxima assembleia magna da região, para tomarem novas decisões relevantes à volta de três ou quatro dos principais problemas da região, isso poderá permitir-lhes de forma mais eficaz planear e reivindicar politicamente, falando a uma só voz e mais forte. Quem tem voz, hoje, são os eleitos, são os autarcas. Os deputados também têm, mas os deputados estão tão distantes da região que quase se deixa de falar neles. Os autarcas têm poder efetivo. Eles têm que trabalhar em conjunto.

De facto, gostei muito de escrever este livro. Quando liderei a comissão executiva do III Congresso não tinha informação sobre o primeiro congresso e praticamente nenhuma sobre o segundo. Também no programa das intervenções não se dedicou uma intervenção ao tema dos anteriores congressos, o desejável era que tivesse acontecido. Quis perceber como tinham decorrido os congressos anteriores e daí ter feito o trabalho de recolha de informação, com alguma dificuldade, mas com muita colaboração. O livro permite-nos aceder a informação importante, desde 1920, os principais problemas e preocupações, aceder a informação de âmbito estatístico, social, administrativa e política. A necessidade de mecanização da agricultura, a necessidade de aproveitamento de energia elétrica do Douro para desenvolver a indústria. As preocupações iniciais com a construção de museus, de uma rede de pousadas para desenvolver o turismo, as exigências de modernização dos comboios e de melhores estradas, a construção de hospitais, de tribunais etc. Numa altura em que o analfabetismo era elevado, em Trás-os-Montes era de cerca de 80%, encontramos homens de enorme preparação profissional e académica, com leitura regional e nacional dos problemas, que se afirmaram a nível nacional em todos os âmbitos, … ler o livro também nesta perspetiva, é fantástico!

Foi das coisas que a mim mais me entusiasmou nesse livro, foi perceber a força e a capacidade dessas pessoas, de olharem para a região, apresentar soluções, reivindicar a sua concretização. Gente de muita qualidade. Basta ver as pessoas que lideraram, logo no primeiro congresso. Tanta gente que encontramos. Gente que saiu das aldeias onde não havia luz, onde não havia estradas, não havia esgotos, não havia nada. Onde havia muita pobreza, alguns, poucos que daí saíram, adquiram uma formação académica notável, ocupando os mais altos cargos da Academia e do governo e de outras áreas. Encontramos pessoas de uma capacidade incrível. Acho que foi essa circunstância de ruralidade associada às dificuldades do meio onde nasceram, que os levou a lutar até onde podiam e foram muito longe. Quer no conhecimento académico, técnico ou político. Encontramos declarações absolutamente surpreendentes no bom sentido.

MC: Quando se prevê a realização do novo congresso?

ENG. JN: Não faço ideia. A minha parte de alertar, de reunir um contributo e também deixar algumas propostas, está feita. Agora já estou noutro projeto.

MC: Que obra de sonho não conseguiu realizar enquanto Presidente da Câmara de Bragança?

ENG. JN: Sem dúvida, o projeto da Universidade de Bragança.

MC: Para terminar, que personalidade ou personalidades mais o marcaram ao longo da sua vida?

ENG. JN: É difícil. (Silêncio) A principal marca da minha vida, é a marca da família. Há uma segunda marca é a que resulta da diversidade de contactos com os cidadãos em geral, com o povo. Acho que essa diversidade nos enriquece muito. Evidentemente, há leituras que devemos fazer de forma variada, mas também há biografias de personalidades políticas que tem de se ler como leituras obrigatórias. Gostei de ler, mais do que uma vez, a biografia de Churchill; gostei de ler a de Obama, a de Nelson Mandela e outras. Logo que Obama foi eleito li os seus primeiros discursos. Gostei muito, revia-me nos princípios e valores que foi partilhando. Gostei de ler a biografia do engenheiro António Guterres, os roteiros de Cavaco Silva, a biografia de Jorge Sampaio e os seus discursos a que dediquei particular atenção. Uma das minhas paixões, ao longo dos anos foi a aquisição de livros, por isso li muitos. Temos uma biblioteca interessante, com alguns milhares de livros. Fui um pouco seletivo nas aquisições, na perspetiva do ambiente, da construção das cidades e da política em geral. A primeira marca na vida é a da família, a segunda é dos cidadãos com quem contactamos e aquilo que conseguimos sintetizar na nossa personalidade, nos nossos valores, a leitura é uma terceira marca na minha vida. Gosto de ler.

MC: Muito obrigado. Foi um gosto estar aqui e conhecê-lo como pessoa.

ENG. JN: Eu é que agradeço. É a primeira vez que faço este tipo de entrevista. Não fiz nenhuma entrevista desta natureza, tenho mantido alguma reserva pessoal e familiar.        


quinta-feira, 2 de junho de 2022

VI FESTIVAL LITERÁRIO DE BRAGANÇA



O último dia do VI Festival Literário de Bragança foi uma autêntica ode à literatura transmontana, onde, além de uma sessão inteiramente dedicada aos autores associados da Academia de Letras de Trás-os-Montes, houve espaço para a magia das letras inundar de sorrisos a biblioteca infantil.

Hernâni Dias, Presidente da Câmara Municipal de Bragança, fez “um balanço extremamente positivo do evento, quer pela participação assídua e ativa do público, quer pela qualidade dos intervenientes”. “Prestou-se homenagem a um dos nomes maiores da literatura em Portugal, José Saramago, e celebrou-se o gosto pelos livros, em colaboração com diversas entidades locais”, sublinhou.

A manhã foi dedicada, por inteiro, aos mais novos. A iniciativa “Livros com Histórias à Solta” fez as delícias das crianças e pais, com histórias contadas por Marisa Alves (“Carlota, a Menina Canhota” e “A Mochila Sorridente”) e Virgílio Tavares (“O Jumbito Neno”).

A tarde na Biblioteca Municipal, por sua vez, foi dos autores associados da Academia de Letras de Trás-os-Montes. Primeiro, uma “Sessão de Poesia e Prosa”, com os autores Idalina Brito, Lourdes Graça, Guida Nunes, Aires Diniz, Ana Freitas, Paulo Salgado e moderação de Carla Guerreiro. De seguida, a apresentação da obra “Academia de Trás-os-Montes – Memórias de uma década”, de Assunção Anes Morais e Odete Ferreira. Por fim, foram homenageados os associados honorários e falecidos da Academia.

A sessão de encerramento foi abrilhantada pela atuação, a piano e voz, da Professora Isabel Castro e do pianista Alexis Alves.

 

Retirado de www.cm-braganca.pt 


Entrevista ao Comendador Engenheiro António Jorge Nunes

Brevemente publicaremos, na integra, a entrevista realizada ao Exmo. Senhor Comendador, Engenheiro António Jorge Nunes, natural da pequena aldeia de Refóios, freguesia do Zoio, concelho de Bragança, no distrito com o mesmo nome.

Esta entrevista foi realizada há exatamente um mês na biblioteca Adriano Moreira. 

É de toda a justiça dizermos que descobrimos uma pessoa com uma entrega enorme à causa pública, com grande inteligência e respeito pelos cidadãos. 

Revelou-nos o passado, contou-nos o presente e antecipou estratégias de futuro.

O seu "princípio", como o de muitos transmontanos, fala-nos de uma vida difícil. 

"Ter nascido numa pequena aldeia do concelho de Bragança, obriga naturalmente a manter memórias de ruralidade e de identidade que me parecem ser significativas, e marca caracteristica na minha vida e personalidade."

"Saí da aldeia quando vim para o liceu. Foi a viagem mais longa que fiz até esse momento. Sair da aldeia, chegar à cidade, foi descobrir um mundo novo. Foi uma perdição nos primeiros tempos de estudante em Bragança. O local preferido era o Jardim António José de Almeida onde jogávamos à bola, com bola feita de trapos, diversão que a polícia interrompia com frequência, obrigando-nos a saltar, escorregando pelas árvores para a plataforma inferior do jardim, local preferido para o jogo do prego. Conhecer tanta coisa diferente... nascer na aldeia nas circunstâncias em que a vida se fazia na altura, correspondeu, inequivocamente, a uma marca que se mantém ao longo da minha vida."

"Tive o reconhecimento das dificuldades com que muita gente ainda vive e que eu e toda a gente vivia."...


Maria e Marcolino Cepeda