Quando se deu o 25 de Abril eu era uma catraia e vivia no Brasil, em São Paulo.
Recordo-me de ter ficado preocupada e de falar com o meu pai sobre o tema que fazia manchete em todos os meios de comunicação social de então nas grandes cidades brasileiras.
Portugal, para nós imigrantes, era um lugar especial e distante mas sempre presente nas conversas entre o meu pai e a minha mãe.
Vivíamos com a esperança do regresso embora não tivéssemos a menor ideia do que era.
Eu e os meus irmãos, dois deles nascidos na capital paulista e os dois mais velhos entre os quais me incluo, daqui saídos ainda muito novinhos, conhecíamos o que nos era contado pelos nossos progenitores que apenas sabiam do seu passado rural, de grandes dificuldades e momentos de pura alegria.
O meu pai demorou algum tempo a libertar-se do culto de Salazar. Fomos nós os filhos, depois de alguma pesquisa e estudo que o elucidámos sobre a influência do salazarismo e, como bom leitor que é, por sua conta, acabou por conseguir compreender o que foi a ditadura em que viveu.
Para mim, menina como era e por me encontrar tão longe, pouco significou.
Já para o meu marido, Marcolino Cepeda, a realidade foi bem diferente. Muito jovem, começou a sentir as garras da PIDE a cercarem-no. Com apenas catorze anos começou a escrevinhar para o Jornal Mensageiro de Bragança e teve o desprazer de "levar com o lápis azul" muitas vezes.
Usou pseudónimos, foi levado para a polícia duas vezes e lavrados os respetivos autos. Ouviu a rádio Argel, noite dentro, com os passos desconfiados de um ou outro bufo por baixo da janela do quarto de um amigo. Leu os livros proibidos que conseguiu encontrar até acontecer a revolução que o deixou em êxtase de pura alegria e esperança...
Duas versões bem diferentes do mesmo acontecimento nestes quarenta anos de hipotética liberdade que cada vez se assemelha mais a uma quase ditadura de nuances estranhas e preocupantes.
Mara Cepeda
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