Sobre a História não vale a pena derramar prantos,
porque o tempo é um caminho sem retorno e o que foi feito não se apaga, pelo
contrário, revela-se uma força a ter em conta quando se procuram novos
horizontes.
Durante três dias Bragança, no congresso Terras de
Sefarad, pôde retomar consciência do que foi o tempo em que a cidade e a região
eram uma referência de Sefarad, a Ibéria dos hebreus, um centro de grande
dinamismo nas actividades económicas e financeiras, com reflexos na renovação
da inteligência, na senda da racionalidade, que nos conduziu a um mundo em que,
apesar de todas as perplexidades, a razão é a luz que continua a impor-se
contra todos os reinos das trevas ululantes.
Foram dezenas de comunicações importantes para a
compreensão do legado filosófico, artístico e ético dos sefarditas, que
pontificaram nestas terras desde a alta idade média e que foram literalmente
enxotados, quando não simplesmente aniquilados pelos esbirros de um Santo
Ofício de má memória, que nos tolhe ainda hoje, quando queremos apontar o dedo
aos cobardes degoladores e assassinos sem freio, que nos ensombram os
dias.
Sabemos que estas misérias são resultado do
entendimento milenar que os “filhos” do Deus único alardearam, reclamando
sempre serem, uns ou outros, os detentores da verdadeira revelação.
Naturalmente os judeus e, por consequência, os
sefarditas também terão os seus pesos na consciência.
Mas, não há dúvida de que o percurso
judaico-cristão, com todas as iniquidades que arrasta, tem dado contributos
notáveis para a verdadeira construção civilizacional e o abrir das portas de
novas utopias.
Os sefarditas serão, entre os judeus, dos que têm
feito um percurso renovador relativamente ao tradicionalismo arcaizante.
Voltando à sua relação com a península e com a nossa região, valerá a pena
trazer à reflexão geral o trabalho apresentado por Fernando de Sousa, da
Universidade do Porto, que tornou evidente a relação entre as investidas
inquisitoriais em Bragança e o declínio da cidade e da região, oscilações que
viriam a redundar na decadência quase final no séc. XIX, depois de períodos de
grande esplendor industrial, nomeadamente no sector dos têxteis de seda.
Esta comunicação leva-nos a revisitar o grande texto
de Antero de Quental, de 1871, “ As causas da decadência dos povos
peninsulares”, que já detectava no fundamentalismo inquisitorial uma das razões
do atraso do país e da dependência em relação a outras potências, onde a
inovação e o espírito empreendedor encontraram terreno fértil e acolhedor.
Outra fora a história do nordeste transmontano se os
industriosos sefarditas tivessem aqui enraizado a modernidade, que partilharam
noutras paragens. Talvez hoje não nos víssemos no desespero da quase agonia e
nos pudéssemos sentir realmente no centro do mercado ibérico, como deixou dito,
em Bragança, o actual primeiro-ministro.
Escrito
por Teófilo Vaz, Diretor do Jornal Nordeste
Retirado de www.jornalnordeste.com
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