sexta-feira, 8 de novembro de 2024

Entrevista Graça Morais

Esta entrevista foi realizada em 2004, se não estou em erro, há precisamente 20 anos. 

Combinámos com Graça Morais, ir buscá-la ao Teatro Municipal de Bragança. Assim fizemos e à hora marcada, com muita alegria e alguma ansiedade pela responsabilidade de entrevistar uma das mais importantes e talentosas pintoras portuguesas, de renome internacional, com obras espalhadas pelo mundo inteiro, fomos buscá-la e seguimos para a rádio RBA, que já não existe. 

Esperava-nos o Rui Mouta, locutor, grande amigo, excelente profissional e a voz escolhida para grande parte das entrevistas que levámos a cabo. 

À chegada, entreguei o guião ao Rui, como sempre que íamos à rádio, apresentei-lhe a nossa convidada que a recebeu com a simpatia que lhe é natural. 

Com o formigueiro nervoso próprio dos grandes momentos, demos início à conversa que aqui plasmamos.    


ENTREVISTA GRAÇA MORAIS

Nasceu numa pequena aldeia do nordeste transmontano, Vieiro. Indubitavelmente esse acaso marcou a sua vida… 

Completamente. Eu costumo dizer que tive a sorte de nascer numa aldeia perdida nos montes, porque na altura em que eu nasci, em 1948 essa aldeia que era o Vieiro, não tinha estrada, não tinha electricidade, não tinha telefone, e por isso esse isolamento em vez de ser considerado por mim hoje, a esta distância, uma falha, acho que foi um grande enriquecimento na minha infância, porque em vez de estar a olhar para fora, virei-me completamente para dentro. Todas as experiências foram intensamente vividas e fiquei de facto mergulhada nesse reino rural e a minha pintura tem muito a ver com isso.

Acabou por África, primeiro Moçambique depois Cabo Verde. Sente que essas vivências se refletem no seu dia-a-dia e também na sua alma?

Não. África como as viagens que fiz ao Japão… esses dois anos em Moçambique foram marcantes porque eu tinha sete anos, sete e nove anos são idades em que o ser humano atinge uma grande inteligência e de facto eu absorvi muito… África, na altura, estava muito à frente… Por exemplo, lá eu lia banda desenhada e aqui nas aldeias ainda não tinha chegado a banda desenhada, por isso tive contacto com a chiclete, com a banda desenhada, com a Coca-Cola, com modas que vinham da África do Sul, com outras pessoas e, sobretudo, com a população que tinha uma cultura diferente. Gostei muito. A minha facilidade de convívio com africanos vem dessa altura. Em breve vou fazer uma viagem, a convite do Centro Nacional de Cultura, a África. Disse logo que sim porque eu gosto muito de África, gosto dos africanos. Acho que são pessoas com uma grande generosidade. São países que vivem muito mal, sempre com muitas dificuldades e eu sinto-me sempre muito solidária com essa gente, por ter vivido no meio deles e dei-me sempre muito bem com todos.

Uma meninice errante, juventude arredada do ambiente familiar devido aos estudos. Mais fundas as raízes?

Meninice errante é relativamente, mas de facto muito cedo saí de casa porque tinha que ir estudar porque na altura o colégio em Vila Flor ficava a dois passos mas Bragança já ficava mais longe.

Eu lembro-me que vinha muitas vezes de comboio, naquele comboio que agora não chega cá, e eu estava hospedada nas freiras do arco e eu carregava a minha malinha e outras coisas e fazíamos isso tudo a pé. Hoje as crianças são um bocado mais mimadas, os pais levam-nos sempre à porta da escola e na altura nós fazíamos isso tudo com ar muito natural.

No caminho íamos encontrando também outras pessoas que vinham de outras aldeias, era um percurso diferente e por isso muito cedo me habituei a sair de casa mas, sempre com saudades de casa, porque a minha estava sempre casa era uma casa de lavradores estava sempre com a porta aberta e era uma casa sempre cheia de gente e eu tive também essa sorte de pertencer a uma grande família.

O meu avô tinha oito filhos e por isso na casa do meu avô que era um lavrador muito generoso havia sempre muita gente havia muitos obreiros e de facto aquilo tudo encheu-me a cabeça e quando comecei a ganhar consciência de mim como pessoas e comecei a decidir que agora realmente quero é pintar, as minhas pinturas começaram a falar dessas pessoas, dessa terra.

De facto eu acho que não foi de propósito acabou por acontecer. Se calhar é a minha missão e durante dois anos eu levei a minha filha comigo, na altura estava na segunda classe, foi frequentar a escola onde eu também andava quando era criança e foram dois anos muito difíceis mas ao mesmo tempo muito especiais porque foi a partir daí que a minha pintura começou a crescer.

O isolamento faz falta para um acto de criação e eu ali pude estar isolada e ao mesmo tempo em contacto com uma cultura rural, observando todos os dias o que é que acontece no campo desde manhã à noite, como é que as pessoas faziam os seus trabalhos. Não é que eu escrevesse ou que a minha pintura contasse isso, mas precisei de viver esse dia a dia e de falar com as pessoas. A pintura não é uma realidade, porque a minha pintura não é real nem é regionalista mas, realmente vive dessas emoções fortes, dessa relação.

É o que lhe vai na alma, essencialmente a pintura.

Bastante. Eu acho que é uma relação daquilo a que eu chamo mente e do meu corpo. Toda a minha pintura é feita com uma grande deturpação do momento que eu estou a viver.

A pintura não é só para decorar paredes, por acaso também pode ter essa função, mas quando um artista faz arte e não faz quadros… o que eu faço é uma grande relação comigo própria e com o mundo que me cerca. Por isso, quando estou a pintar, estou a pintar as minhas grandes inquietações sobre o que me rodeia e as minhas grandes felicidades. Não quero ficar com o carimbo de que só pinto pessoas de Trás-os-Montes, ou as mulheres de Trás-os-Montes, porque muitos dos meus quadros parecem cenas às vezes também ligadas ao terrorismo, àquilo que se passa no mundo e que me toca mais de perto. Às vezes são assuntos dramáticos e de uma grande injustiça.

Existe a melancolia do tempo que passou?

Não. Eu não sou uma pessoa melancólica. Vivo também a pensar no futuro. Acho que tenho tanto que fazer… e agora que já passei a barreira dos cinquenta anos, sinto que terei mais vinte anos com muita saúde se tiver sorte. E por isso a percepção do tempo começa a ser muito cruel, porque começo a sentir que cada vez tenho menos tempo para pintar e ainda tenho muita coisa para pintar ou desenhar. Ainda tenho muito para fazer e por isso não tenho tempo de olhar para trás. O que está atrás é o meu património que me serve como experiência, como amadurecimento. Eu acho que sou uma pessoa mais rica do que era há vinte anos porque tenho a experiência, muitas experiências negativas. Todos nós com a minha idade já sofreram perdas, já se perdeu um pai, outro já perdeu uma criança e isso tudo magoou, sofri mas não serve para me queixar porque o que eu quero é crescer e fazer cada vez mais e melhor.

Pintar cada vez mais e melhor.

Sim. Eu só espero nunca me reformar. Às vezes tenho muita pena quando vejo as pessoas a dizer: “Que pena. Nunca mais me reformo.” Sinto que essas pessoas são capazes de estar contrariadas naquilo que estão a fazer. Muitas vezes as pessoas são levadas por caminhos que a vida os levou a ter. Muitas vezes não tiveram coragem para forçar a porta.

Costumo dizer aos jovens quando vou às escolas que, quando sentirem que têm necessidade de fazer o caminho das artes, caminho de que falo mais, porque é um caminho mais difícil, que os pais não gostam que os filhos vão para artistas e são sempre, não digo profissões, porque não considero isso uma profissão, mas são sempre caminhos de risco.

No início ganha-se muito pouco e é preciso insistir e lutar muito e eu digo-lhes que se têm necessidade, devem ir por esse caminho para não chegarem aos cinquenta anos e sentirem-se pessoas frustradas. Nenhum artista pode começar a fazer arte aos cinquenta anos. É uma pura ilusão quando as pessoas dizem: depois da reforma vou pintar ou vou escrever. De facto, pode-se pintar ou escrever mas, já passaram muitos anos em que se perdeu… porque qualquer arte, música por exemplo, e eu tenho a sorte de ser casada com Pedro Caldeira Cabral que é um grande músico, acompanho a luta diária que ele tem que fazer todos os dias. Tem que tocar tantas horas porque se não tocar não se toca bem. Comigo acontece a mesma coisa.

Desde muito nova que o seu caminho era a pintura e o desenho. Foi um despertar lento ou foi uma necessidade visceral?

Já na escola primária desenhava imenso, desenhava coisas muito simples porque, na escola primária de uma aldeia com esse isolamento só havia lápis de cor, não havia mais nada. Não tenho consciência disso.

Com nove anos, virei-me para a minha mãe e disse-lhe que queria ser pintora. A minha mãe dizia-me sempre: “Mas como é que queres ser pintora se os pintores morrem todos de fome?” E eu respondia-lhe: “Antes quero morrer de fome, mas quero ser pintora.”

A minha mãe lembra-se disso que eu já não me lembrava, ela é que se lembra dessa frase de eu insistir que mesmo que eu morresse de fome queria ser pintora. Felizmente nunca passei fome e, se ao princípio os meus quadros não se vendiam com facilidade, agora não tenho dificuldades. Pelo contrário. Sempre pintei o que me apeteceu. Eu fui a grande crítica da minha obra e nunca pintei para os outros, mas pintei sobretudo para mim.

Fico muito contente quando os meus quadros são expostos e a reacção é boa mas, nesse sentido também tenho os meus críticos que nem toda a gente gosta. Faz parte de haver pessoas que gostam do nosso trabalho e outras que gostam menos. Quando exponho uma série de pinturas elas só saem do atelier se de facto eu achar que têm qualidade.

É mais fácil pintarmos para nós ou pintarmos alguma coisa a pedido de alguém?

Eu tenho encomendas públicas e aqui em Bragança, como sabem, tenho um painel de cerâmica no mercado, no teatro municipal e vou ter outro na Caixa de Crédito Agrícola no novo edifício mas, antes de Bragança já tinha obras públicas. Não tinha muitas porque eu não aceito muitas obras públicas, mas tenho uma na estação metropolitana em Moscovo, que é uma das redes metropolitanas mais importantes do mundo. Eles têm uma grande vaidade nas estações deles e têm razões para ter. Estes desafios de obras públicas também são importantes. Toda a gente tem acesso à obra e ao mesmo tempo é um desafio. Há uma equipa a trabalhar, arquitectos, engenheiros, muita gente e ao mesmo tempo eu acabo por ajudar muita gente a ganhar a vida porque são as fábricas que estão a trabalhar.

Há uma equipa que eu tenho a trabalhar comigo e que me dá muito prazer. Dou-me sempre bem com essa gente e é um trabalho que realmente é muito importante, mas quando eu me sinto muito feliz é quando estou sozinha no meu atelier a trabalhar, aí é que eu gosto, porque posso dizer: “Hoje faço o que quero.” No atelier sou a rainha. Aquele espaço é meu. Aí estou a brincar como as crianças e faço o que quero.

Pinta com a sua liberdade.

Pinto com a liberdade porque a liberdade é fundamental. Depois censuro-me dentro daquilo que eu exijo para mim como qualidade. As minhas pinturas têm sempre a ver com a minha experiência como pessoa.

É muito bom ter uma terra, um lugar onde refrescar a alma de todos os cansaços?

Eu, infelizmente, já não descanso tanto porque as aldeias estão muito cheias de barulho. É uma coisa que é preciso repensar.

Nesta região transmontana ainda temos quilómetros e quilómetros de paisagem que ainda está intacta, que é um descanso para os olhos e para o nosso coração, para o nosso espírito mas, as aldeias ultimamente estão muito cheias de barulho, muito cheias de tractores e as pessoas, que não fazem isso por mal, habituaram-se a ligar o tractor e se calhar vão tomar café e deixam o tractor ligado durante meia hora ou um quarto de hora. Não imaginam que isso faz mal à cabeça de alguém que está a querer concentrar-se.

As pessoas, quando andam numa grande azáfama, de um lado para o outro, não se apercebem daqueles ruídos. Outras apercebem-se mas não se queixam porque acham que não se podem queixar e, por acaso, eu acho que as câmaras deveriam fazer uma chamada de atenção às pessoas para a luta contra o ruído porque o ruído faz mal à saúde e toda a tecnologia moderna que facilita a vida às pessoas, também transforma um paraíso num inferno porque tudo em nossas casas desde o aspirador até ao frigorifico faz ruído mas, sobretudo esses ruídos dos carros a gasóleo, dos motores de rega, são coisas que se não forem bem geridas transformam os espaços mais bonitos, mais paradisíacos, num lugar muito indesejável.

Hoje em dia acontece isso naquele lugar, acontece isso noutros lugares. Eu, às vezes, encontro mais paz no meu atelier em Lisboa que é na Costa do Castelo que é um lugar muito sossegado, junto ao castelo, do que muitas vezes no Vieiro.

Os lugares transmontanos do seu tempo de menina começam a esvair-se na modernidade, ou ainda consegue senti-los em cada regresso. Como diria o Lobo Antunes à procura do osso que deixou enterrado?

Acontece apesar desses barulhos, o ritmo do campo não tem nada a ver com o da cidade e eu sinto-me mais em sintonia com este ritmo em que o tempo cresce e ao mesmo tempo, há uma relação com as leis da natureza. As pessoas levantam-se cedo, quando o sol nasce no verão. No Inverno levantam-se mais tarde e deitam-se conforme o por do sol. Dá uma grande paz quando estou aqui em cima, nessa relação de sintonia com a natureza. Em Lisboa não existe nada disso. Sou capaz de jantar às dez da noite. Deito-me às duas da manhã porque, na cidade, quase não sentimos a passagem das estações do ano. Só se sente se se for ao jardim da Gulbenkian, e mesmo assim essas plantas não são bem as plantas do campo.

Aqui eu sei que em Abril vou encontrar certas plantas, em Fevereiro encontrei as amendoeiras em flor. De resto há um trabalho que eu quero fazer a seguir que tem muito a ver com essa transformação do tempo, dessa relação com a natureza. Dá-me imensa vontade de estar um ano sem sair desta região para ver o que é que eu consigo fazer.

Para relembrar as várias estações. As suas mulheres já não são as mesmas. Sente pena dessa descaracterização, ou aceita e compreende?

Eu só tenho que aceitar. Há uma coisa que como artista não tenho direito de fazer que é revoltar contra aquilo que faz parte do ser humano e ao mesmo tempo faz parte das transformações de uma época. No século vinte e um não se vive como no dezanove. Há pessoas que viveram 90 anos e sentiram as grandes transformações que são sempre acompanhadas com grandes conquistas científicas, técnicas… Não se pode só ver o lado mau tem de se ver também, as grandes conquistas do homem. Simultaneamente também chegamos à conclusão que, a par dessas grandes conquistas, o homem continua a ser tão selvagem como sempre foi perante a guerra… Os cientistas conseguiram lutar contra certas doenças mas, depois, surgem outras. Temos sempre o pânico dos cancros que não se conseguem resolver e agora estamos todos muito receosos deste terrorismo sem rosto.

A religiosidade faz parte do seu quotidiano e muito da sua pintura. É a eterna procura do nosso anjo escondido?

Eu sou uma pessoa religiosa. Não pratico, sou católica, vou muito pouco à igreja mas sou crente. Independentemente desse lado ligado à religião, nós podemos desenvolver uma certa espiritualidade mesmo não estando ligados a nenhuma religião e a espiritualidade tem a ver com a forma com as pessoas encaram a vida, com a forma de como as pessoas se ligam aos outros.

Eu acho que as pessoas que se ligam à família, aos amigos, a estranhos de uma maneira muito humana, como uma certa irmandade, essas pessoas estão a praticar alta espiritualidade e quando as pessoas são muito íntegras naquilo que fazem, são pessoas profundamente espirituais porque as religiões no seu lado melhor pretendem sempre que o ser humano se aperfeiçoe se santifique, ou seja um ser espiritual e tanto o budismo como a religião católica, todas as religiões pretendem isso, depois muitas vezes tornam-se intolerantes porque os outros são diferentes e quando nós conseguimos ser tolerantes, aceitar as pessoas como elas são, aceitar a diferença, acho que aí estamos a ser pessoas não perfeitas, porque ninguém é perfeito, mesmo os santos não foram, mas estamos a praticar realmente a grande espiritualidade.

A paisagem, a terra, o arado, o tempo sulcado pelas mãos gretadas, pelo agreste, o sofrimento do trabalho árduo mesmo quando a idade já não ajuda e é necessário cavar e limpar a vinha de joelhos como a mulher de noventa anos que falou numa das suas entrevistas. Isso fá-la sofrer?

Não. Faz-me sentir solidária com essas pessoas mas não me faz sofrer. Eu acho que a maior parte das pessoas ligadas ao trabalho do campo são pessoas heróicas porque a agricultura sobretudo nestas regiões… primeiro eu acho que o agricultor tem uma relação de amor com a terra. O cavador, o agricultor, eu até gosto muito da palavra lavrador embora se fale muito de novos agricultores. Agricultor é uma palavra mais sofisticada mas as pessoas que têm as suas terras… Nós temos aqui muita gente que mesmo depois de emigrarem voltam para os seus pedaços de terra e trabalho. Fazem-no até com certo sentido criativo, por isso é que eu às vezes noto que são pessoas realizadas porque estão a trabalhar aquilo que é delas e quando o vêem crescer sentem-se felizes com isso.

É muito duro porque às vezes não conseguem vender os produtos, não conseguem as compensações. Muitas vezes, não conseguem recuperar o dinheiro que aplicaram. Isso é um problema que tem a ver com apoios governamentais e que eu aqui não gostava de falar mas essa mulher de que falei numa entrevista foi uma mulher que era muito velha e que a vi bastante cansada e ela disse-me: “Fui à vinha e as videiras estavam tão cheias de erva que eu como já não me posso dobrar ajoelhei-me para lhe tirar as ervas.”

Eu acho que a mulher que faz isso trata das videiras como se fossem pessoas porque se calhar até as plantou e ganhou um afecto a essas videiras é o que eu sinto nestas pessoas. Elas ganham afecto e quando um agricultor lhe oferece a si o vinho que ele cultivou ou o azeite, muitas vezes ele faz aquilo com o tal carinho e além de serem pessoas sabedoras, porque souberam como é que quilo se fez, eles dão-lhe valor porque, desde semear a colher, perceberam todas as fazes porque aquilo passa, e nisso tudo há uma sabedoria de vida e ao mesmo tempo uma valorização pelas coisas porque eles viveram aquilo tudo.

E o reino maravilhoso de Torga, ainda existe?

O de Torga, se calhar já não existe, o meu ainda continua. Eu acho que esta região é muito bonita, nesta altura do ano. Eu fico tão contente por estar cá, que sempre que posso venho cá. No verão é mais difícil porque é muito quente. O inverno é muito frio mas agora já aquecemos as casas, já muita gente se defende e por isso aguenta-se muito bem. E sobretudo a paisagem é deslumbrante. Eu acho que todos nós devemos defender esta região, primeiro de um espírito de novo-riquismo que impera por todo o país e que é preciso termos cuidado.

É muito bom todos vivermos melhor, passarmos a pertencer a uma Europa civilizada, oxalá tenhamos uma economia estável, mas isso, muitas vezes, vem acompanhado dos exploradores e das pessoas que querem ganhar dinheiro a todo o custo e por isso estragam a paisagem sem se importar; poluem tudo com cartazes, com barulhos e para eles o progresso são casas em altura. É o oposto daquilo que deve ser o progresso e isso tudo parte de nós da nossa consciência como indivíduos, como pessoas que vivem nesta terra e por isso temos de estar alerta e defendermos, isto com unhas e dentes.

Ao mesmo tempo os presidentes de câmara têm um papel muito importante, nesta política, às vezes mais do que os ministros apesar de dependerem dos dinheiros que vêm do poder central. Um presidente de Câmara com uma equipa boa pode desenvolver a região não ligando àquilo que é tido como progresso, mas pensando mais nos valores do nosso património, na nossa cultura e casando essa cultura com outras culturas que todos nós só ganhamos em conhecer.

Que critérios usa na escolha dos projectos que realiza?

O critério é sempre aquilo que eu gosto mais. Quando me convidam para várias exposições, aqui ou ali, eu escolho sempre os lugares. Muitas vezes não é só aquilo que gosto mais. Às vezes pode ser o mais interessante para o meu trabalho. Muitas vezes é o acaso.

Não sou muito orientada, obedeço mais a apelos exteriores do que à minha própria vontade, mas selecciono muito porque hoje em dia sinto maior prazer em pintar do que em expor, porque o tempo cada vez é menos e preciso muito de trabalhar, de pintar. Então como cada exposição me obriga a gastar muito tempo sobretudo em lugares que não estão muito preparados, eu recebo muitos convites de câmaras para expor por todo o país. Por acaso, aqui em Bragança, deve ser dos lugares em que eu recebo menos convites e percebe-se, porque é um lugar onde até agora não tem havido espaços para expor. Não é porque haja má vontade, porque não tenho má vontade de ninguém, mas há outros lugares em que já têm museu, já têm centros culturais. Então, a cada passo, me convidam para fazer exposições, mas eu, quando percebo que as equipas são frágeis, porque há muitas terras que neste momento têm bons edifícios mas as pessoas que estão à frente não sabem trabalhar bem e eu percebo logo que vou ter muito trabalho e defendo-me. Então decido não expor porque de facto uma exposição para ser bem organizada, para ser bem planeada, não é só pendurar quadros numa parede, mas obriga a um trabalho, desde o catálogo aos seguros e transportes, depois divulgar a exposição, que nem todas as equipas estão preparadas para isso e hoje com tantos apelos que há de consumo e de publicidade, se uma exposição não é bem trabalhada, pressupõem um trabalho para cem pessoas na inauguração e não vale a pena.

Tem de ser tudo muito bem publicitado.

Sim, bem trabalhado, defendido. Eu dou o melhor na minha pintura e depois as outras pessoas também têm de ser boas no seu trabalho.

O ser transmontana é mais do que um facto, é uma maneira de ser e de viver. Concorda?

Eu concordo. Assumi-me sempre como transmontana com uma certa vaidade. Em Lisboa numa certa altura, Trás-os-Montes era considerada uma região bonita mas atrasada e de facto isto estava longe de tudo, éramos muito abandonados. Quando andei a estudar no liceu, quando nevava ficávamos isolados, não chegava o comboio, não se podia sair da cidade, mas também tinha as suas vantagens porque desenvolvíamos laços muito fortes, os estudantes, grande parte dos meus amigos são de cá e havia esse lado de intensificação dos afectos porque não havia mais nada.

Tinham-se uns aos outros, não é?

Tínhamo-nos uns aos outros.

Realizou ainda dois belos painéis de azulejos a pedido da câmara de Bragança. Isso deu-lhe satisfação?

Deu-me muita, porque eu não tinha obra pública aqui em Bragança, só tinha uns painéis também de azulejos na biblioteca de Carrazeda de Ansiães. O painel do mercado foi o presidente da câmara que me convidou, este painel para o teatro não foi o presidente da câmara, foi o arquitecto que me convidou a entrar neste concurso para este teatro e quando ele me disse que era para Bragança eu aceitei logo porque tinha um imenso prazer de fazer parte deste projecto de tanta qualidade que é tão importante para a cidade, porque a cidade de Bragança com este teatro, talvez as pessoas não se apercebam, mas pode revolucionar completamente esta cidade. Haja dinheiro para fazer boa programação, porque se não houver dinheiro… as boas programações saem muito caras, porque é tudo caro.

Um bom artista não pode levar o mesmo que um mau. Às vezes, os maus querem-se fazer tão bem pagos como um bom artista, mas um bom artista tem os seus custos, o seu cachê. Uma companhia de dança também sai muito cara e aí é muito importante existirem estes espaços como o Teatro de Bragança. É um belíssimo espaço para apresentar obras, apresentar companhias de dança… De tudo um pouco mas não chega. A pessoa que está à frente é uma pessoa de muita qualidade, a Dra. Helena Genésio. Claro que é preciso haver dinheiro para que essa qualidade se concretize, senão, não vale a pena ter centros culturais. Não vale a pena ter centros de arte contemporânea se depois não houver dinheiro. Não queremos essas instituições só para constarem no currículo.

Para depois ficarem estagnadas no tempo…

Sim. É melhor nem construir. É a mesma coisa que nós gastarmos dinheiro numa casa grande e depois não a habitarmos nem a abrirmos aos amigos. É necessário que as casas cumpram a sua missão. Que sejam centros de acolhimento e de confraternização.

O que acha da cultura que se faz por este país e principalmente aqui em Trás-os-Montes?

Eu penso que estamos num momento pobre. Estamos num momento em que se tem investido muito na cultura… Quando os países como o nosso atravessam dificuldades económicas, a cultura apanha logo, deixa logo de haver dinheiro porque os políticos acham que não faz falta. Os artistas podem esperar.

A verdade é que há muitos artistas e eles continuam a fazer coisas, continuam a viver intensamente e devem continuar porque os artistas não vivem para ganhar dinheiro. Os grandes artistas, sobretudo, obedecem a grandes necessidades interiores e têm mesmo de fazer aquilo. Claro que eles também precisam de viver e por isso quando são convidados e se podem auto financiar de uma forma mais folgada é óptimo.

Qualquer artista gasta muito dinheiro para se enriquecer, porque é preciso viajar, é preciso conhecer, é preciso comprar livros, é preciso ler, ouvir e por isso é muito bom quando o artista é recompensado. Fico muito satisfeita quando os meus quadros são vendidos por muito dinheiro embora não os pinte a pensar nisso.

Também é uma coisa que se vai conquistando com o tempo, a qualidade.

Sempre defendendo a qualidade e nunca fazendo a vontade à facilidade.

Muitas vezes, quando a pessoa começa a ser famosa, a ter muito prestigio, é muito fácil vender um desenho por muito dinheiro. Isso é um erro. As pessoas têm uma sensibilidade e uma inteligência que as fazem aperceber quando estão a ser enganadas e isso até se nota com os políticos.

Às vezes, as sondagens enganam tudo, porque realmente há uma força nas pessoas que parece que adivinham quando estão a ser enganadas e quanto mais cultas forem, mais instruídas, mais se apercebem disso. Os povos educados e cultos são pessoas que realmente vivem melhor com os seus artistas, porque conseguem distinguir a qualidade. Eles precisam da qualidade.

No nosso país temos de lutar cada vez mais por isso. Eu fiz recentemente uma viagem à Irlanda, quando o presidente da república, o Dr. Jorge Sampaio foi e fiquei impressionada com as palavras do presidente da Irlanda que dizia: “Nós, cá, não investimos em autoestradas. Nesta fase o que nos interessa é apoiar a instrução, a cultura, a educação. E tem sido essa a grande força da Irlanda.

Nós seremos capazes de conservar a nossa individualidade neste mundo que cada vez está mais estandardizado?

Temos que lutar por isso. Todas as pessoas são seres diferentes. Esta grande massificação é um perigo porque daqui a pouco, em Portugal, fala-se como em Espanha.

Ou seja, nós nunca falaremos como os espanhóis, como os ingleses... Mas a verdade é que está a nascer uma língua nova, que é a língua da Internet. Os jovens falam só por siglas. As pessoas mais novas já têm uma linguagem só por códigos e essa linguagem é internacional. Isto é uma coisa nova que pode ser fantástico para as pessoas comunicarem umas com as outras rapidamente, mobilizando-se para partilharem informação.

É uma globalização na língua, também.

Também. Isso por um lado é muito bom, mas eu acho que também é muito importante e interessante que cada um de nós continue a defender a sua diferença. Eu, dentro deste país, sou uma pessoa diferente das que vivem no Algarve. Como artista, sou diferente de uma artista que viva em Nova Iorque.

Os primeiros anos de vida são importantes para decidir o que nós somos como pessoas. Se a minha infância foi passada numa aldeia com certas características, tudo o que sou como pessoa, já não falo como artista, é diferente de uma pessoa que nasceu no Brasil, também num lugar remoto, ou em Nova Iorque, ou em Paris.

E então quando nós somos artistas de facto há uma arte que se diz universal. É uma arte muito urbana, tem muito a ver com a cidade, mas quando aparecem artistas que defendem o seu lugar e uma identidade mais profunda, esses artistas são sempre seres que têm muita dificuldade em se imporem mas, ao mesmo tempo, também são admirados por essa diferença.

Eu costumo dizer aos jovens quando falo com eles, jovens que passam o dia agarrados à Internet, que a Internet é um meio extraordinário de comunicação, de informação, mas há uma coisa que as pessoas não podem esquecer. Mais do que se sente através da Internet e até mesmo da televisão quando mudamos de canal para canal e, de repente, estamos numa civilização muito antiga e, rapidamente, estamos noutro canal em que viajamos por expedições extraordinárias, ao Tibete e aquilo é tudo muito bonito e exaltante, mas há uma coisa que não nos chega através do ecrã. Faltam os cheiros, o contacto, o toque com as pessoas, aquilo que às vezes sentimos que nos desagrada, por exemplo, estar ao pé de outra pessoa. Outras vezes gostamos muito porque há empatia. Essa passagem das energias que nós todos temos só é possível quando estamos frente a frente. Há um carisma que as pessoas podem passar através das imagens virtuais mas, sobretudo, a grande força entre os homens é aquela que se faz carne a carne, pele a pele, boca a boca. Aquelas coisas que nós sentimos quando estamos olhos nos olhos.

Continua a faltar essencialmente o contacto físico, não é?

Eu acho que isso é sempre importante, porque nós quando estamos a falar, eu estou a falar consigo, eu estou a viver este momento mas se isto for filmado e se alguém assistir a esta nossa conversa, já está a assistir a uma conversa que já aconteceu, não está a viver o momento e o que é importante é viver os momentos e tirar desses momentos experiência de vida.

Falou em determinada altura que os velhos, mais do que a tradição, vivem a solidão e o abandono. De que maneira é que se poderá resolver esse problema?

Isso é um problema que tem de ser resolvido, porque a mim impressiona-me muito ir a certos lares e ver os velhos que estão à espera da morte. É das coisas mais chocantes.

Por todo o país fizeram-se muitos lares estatais e apoiados pelas misericórdias e outros lares privados, alguns até são lares de gente com muito dinheiro e com actividades mas, o normal são lares onde há uma sala de espera em que as pessoas estão com um ar muito querido. Já não estão ali, estão noutro lado e isso impressiona-me muito. Essas pessoas podem ser aproveitadas, integradas, numa comunidade.

Dantes isso era feito de uma forma natural porque as pessoas viviam com a família, às vezes, na mesma casa estavam três gerações. Era normal.

Eu ainda ganhei com essa vivência, ainda vivi com o meu avô, com as minhas tias, a minha mãe, apesar de não vivermos na mesma casa, era uma casa que estava pegada à outra.

Hoje, os jovens, como as casas são cada vez mais pequeninas, cada jovem que se torna independente da família e vivendo sozinho, torna-se solitário. As pessoas optam por não ter sequer companhias. Só se encontram de vez em quando, com a família e os amigos. Vivem em celas pequenas e por isso os avós envelhecem também sozinhos.

Normalmente as mulheres ficam para lá dos maridos, que morrem mais cedo e optam por ir para um lar. A solidão é triste.

Não são só os lares onde existe solidão, nas nossas aldeias também.

Nas aldeias vêem-se casas fechadas e pessoas com ar errante. Eu estou muitas vezes no Vieiro e impressionou-me ver duas senhoras a andarem para um lado para o outro, porque o médico lhes recomendou andar. É uma recomendação que hoje os médicos dão e que acho muito bem.

Antigamente, elas andavam naturalmente porque iam trabalhar para o campo e essas pessoas que hoje não estão muito bem de cabeça, ficam um bocado perdidas e os filhos estão lá fora no estrangeiro. Muitas vezes não podem vir com medo de perder as reformas. É um problema de difícil resolução porque os filhos e netos não querem ou não podem regressar à terrinha e os “avós” não querem ir porque não se adaptam aquelas casas e aquelas terras.

Mesmo que as levassem, se calhar era para ficarem num lar.

Ou se calhar ficarem em casa mas completamente desajustadas. As pessoas precisam de estar naqueles locais onde viveram 70 ou 80 anos, precisam do contacto com as pessoas, com a vizinhança, nem que seja para se queixarem.

Eu acho graça porque as pessoas nunca dizem que estão bem. Sempre se queixam e aquilo é uma forma de terapia. Por exemplo, os ingleses disfarçam sempre. Não têm por hábito queixarem-se. Nós temos por hábito queixarmo-nos. As pessoas nunca estão bem de saúde, estão sempre com constipação, ou dói-lhe a cabeça ou estão mal das costas e aquele queixume mútuo, serve para se consolarem umas às outras e isso faz bem.

Lembro-me também de ver um casal de velhos, muito velhos, porque ele já tinha noventa e tais e ela ainda está viva e já vai fazer cem anos e achava muita graça porque os encontrava numa horta que tenho e todos os dias iam regar a hortinha deles. Acho que isso os ajudou a serem calmos e felizes.

Sabe o que é ver crescer couves e tomates e depois comer? Isso é muito bom. Se os lares todos tivessem uma hortinha…

É bom que as pessoas continuem a ocupar a cabeça e é péssimo pô-las a ver televisão porque ficam completamente manipuladas, endoidecidas, porque o que aparece na televisão são coisas tão negativas.

Parece que o mundo está todo doido e no mundo acontecem coisas extraordinárias, continua a haver pessoas bonitas, generosas, boas, continua a haver arte, continua a haver tanta coisa boa no mundo, mas parece que está tudo maluco.

O que é para si o silêncio?

É o melhor bem do mundo. Quando tenho silêncio sinto-me tão feliz porque há barulho em todo o lado, a gente vai para o hotel, tem barulho desde o elevador até à casa de banho, “barulho” música, mas é aquela coisa que eu considero barulho. No campo nós também podemos estar num lugar muito bonito e de repente aparece um tractor ou uma máquina qualquer que está a trabalhar e há espaços de grande silêncio que é muito bom. Eu aprecio muito o silêncio, preciso dele para viver, para trabalhar, para pintar e temos todos de fazer uma campanha a favor do silêncio.

E eu também estou de acordo.

Também está de acordo! Precisamos de boa música, boas palavras humanas, ouvir o som da voz humana perto de nós mas lutar contra aquilo que está a mais e que pode fazer mal à nossa saúde.

A sua casa museu em Vila Flor é finalmente uma realidade.

Ainda não é. A câmara já comprou o edifício mas neste momento ainda estamos numa fase…

Está cada vez mais perto.

Acho que vai ser. Eu não tenho muita pressa porque uma vez que neste momento não há dinheiro para nada tenho um bocado de receio, confesso, de abrir uma casa com uma colecção que eu considero de qualidade e depois não ter dinheiro para criar outras actividades para trazer escritores, músicos…

Eu não gosto nada das casas museus que abrem, sempre com a mesma colecção e se fecham. Acho que deve ser um lugar vivo onde as pessoas se encontram com obras de arte. Elas próprias começam a criar, começam a fazer… e eu penso sobretudo nos jovens, porque eu fui jovem nesta região e lembro-me do grande isolamento que era Bragança…

Eu gosto muito de Vila Flor que se mantém como vila sem aquelas pretensões de novo-riquismo de querer parecer cidade, ou querer parecer uma vila, podia agitar-se um bocadinho mais comercialmente e era óptimo que isso acontecesse para as pessoas também poderem viver melhor e dependerem desse mercado local, mas é uma vila que se tem mantido simpática… Acho aquela zona bonita e gostava muito de contribuir para que viessem pessoas de outras terras e é isso que os presidentes e todos nós temos que começar a perceber que a cultura dá riqueza.

A Espanha já percebeu isso há muito tempo. Sempre apoiou os artistas deles, sempre incentivou… o Antoni Tàpies,  o Miquel Barceló, que é um pintor mais novo que eu vai ter agora uma grande retrospectiva. Sempre apoiou intensamente os seus artistas, porque isso traz sempre dinheiro para a Espanha.

As grandes exposições e os grandes espaços onde se pode ver boa pintura, só estou a falar de pintura; não estou a falar de mais nada. Se forem bem divulgados e se houver muito boa informação sobre esses lugares, pode levar milhares de pessoas aos sítios e as pessoas vão e sentem-se bem. Podem gostar ou não gostar mas sentem que lhe estão a oferecer qualquer coisa de qualidade…

A Espanha exulta de alguma forma com o Picasso, por exemplo?

Eu acho que a Espanha até absorveu o nosso escritor José Saramago. Lembro-me que… o Zé Saramago casou com uma espanhola mas continua a ser português. Há tempos estava em Espanha e comprei uma revista em que diziam o escritor ibérico, que é uma maneira simpática de dizer que já não é português mas é mais espanhol. Eles apoiam muito porque a Espanha é um grande país e vimos agora nas eleições que aquele povo é um povo com raça e com personalidade.

Estamos com pouco tempo para o final da nossa conversa e perguntava-lhe que personalidade ou personalidades mais a marcaram ao longo da sua vida?

Isso é uma pergunta muito difícil porque foram várias. Vou falar-lhe só de artistas. Na pintura houve um pintor que me ensinou muito, sem nunca ter falado com ele: foi o senhor Picasso. Quando eu andei na escola de belas artes não o entendia. Achava que era um grande artista mas não tinha a ver comigo. Depois, à medida que fui conhecendo melhor a obra de Picasso, mais reconhecia que ele era um grande desenhador, era um grande pintor.

Quanto mais entendo ou procuro entender a arte, mais aprecio a arte egípcia. Não há personagens. Recentemente descobri um artista alemão de que gosto muito que é Kiefer. A Paula Rego também é uma grande artista que vive em Londres, que tem dupla nacionalidade porque foi casada com um muito bom artista inglês. É uma mulher que me dá muita força porque é uma grande artista. É uma mulher generosa, é uma mulher com quem eu me identifico muito. Eu vou tendo os meus heróis e as pessoas com quem eu me identifico, familiaridades.

Por vezes vão mudando com o tempo também?

Vão. Isso faz parte, é cíclico. É curioso que nós vamos descobrindo outras pessoas porque nós também vamos mudando, nós nunca somos a mesma pessoa.

Muito obrigado. Foi um prazer estar à conversa consigo.

Obrigada. O prazer foi meu.


Maria e Marcolino Cepeda

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