A voz, resposta rápida e pronta, espontânea e ligeira que se
apresenta lampeira na ponta da língua, cavidade bucal para usar termo técnico
de conhecimento adquirido em formação recente e passada.
É a música da minha alma única, menina ainda, sem tempos
dispersos.
É a maciez da minha pele de mulher que ama o homem que a ama
e anseia pelo sonho de uma noite estrelada.
São os meus sonhos de todos os tempos que alguma vez farei
realidades.
Que voz é esta que me acompanha ainda e sempre, antes mesmo
do útero da minha mãe? Voz de mulher, da primeira mulher que soube que o era.
Poeta de palavras vivas sou, e sofridas são elas que tão
dolorosamente me escapam através do suor que da minha doce pele de mulher
emana.
E mãe sou dos filhos que não terei, tempos de ternura de
carinho férreo, tão limpo e suave como a canção da chuva que mansamente cai dos
telhados adormecidos num dia triste/alegre de Outono, envolto em perfumes de
Primavera.
Que a voz seja sempre algo que mais do que irritar, embale e
serene angústias que porventura vidas desavindas tragam em carrosséis de
emoções à flor da pele que também a música impregna.
A voz é tudo.
É silêncio quando o ruído impera.
É aurora quando raia o dia…
A voz mostra-me tal como sou e estou.
É a amiga que num murmúrio me pede guarida naquele momento
de séria tristeza.
É a alegria que eu sinto quando uma voz já antiga me conta
uma história de bruxas malvadas, maçãs vermelhas e envenenadas que o amor
liberta com a expressão: “Tão linda!”
Mas se a voz fosse apenas isso, melodia, feitiço, lua cheia,
voz de comando, sorriso… seria pobre, avara, andrajosa, uma concha vazia na
areia da praia… a voz é isso e muito mais.
A voz é o menino que balbucia, a soprano que canta a sua
peça favorita, o marulhar da água nas pedras limpas do rio, o sussurro do vento
nas espigas de trigo, o trautear de uma canção que se ouviu de manhã cedo ao
acordar e que nos acompanha durante todo o dia, o soluço que o peito já não
pode calar…
A voz é o silêncio de um dia de chuva quando a noite tarda a
chegar.
A voz não existe quando a alma está deserta de música.
A voz é a música que embala a criança no ventre da mãe.
A voz é o espelho da personalidade humana. É o instrumento
que nos apresenta ao mundo por meio de sons.
É o nosso bilhete de identidade oral.
Cada voz é única com as suas vibrações, cor, tons, sabor,
textura e musicalidade próprios.
Por meio da voz dizemos quem somos, o que sentimos e como
percepcionamos o mundo que nos rodeia.
Pela voz é possível descodificar as áreas mais escuras da
vida do ser humano e também a luminosidade da sua alma.
A voz é a arma mais poderosa da humanidade.
É um dos instrumentos de influência que maior eficácia
apresenta nas comunicações humanas juntamente com os gestos.
Um pequeno tremor na voz que fala, denuncia uma
característica muito própria do locutor. Nada passa despercebido na voz que se
projecta para quem nos ouve.
A tristeza, a insegurança, a alegria, o entusiasmo colam-se
à voz como lapas nas rochas das costas marítimas.
A voz é o melhor ou o pior cartão de visita que se pode
apresentar.
Conhecer a própria voz é conhecer um tudo/nada da nossa
própria alma. A voz põe a descoberto as nossas angústias, os nossos sonhos, as
nossas alegrias e intenções.
A voz expõe-me qual espelho da alma.
MARIA CEPEDA
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