Natural de Grijó de Vale Benfeito, o concelho de Macedo
de Cavaleiros, Adriano Moreira tem um vasto currículo, destacando-se nas áreas
da política e direito. O ex-ministro do Ultramar é actualmente presidente do
Instituto de Altos Estudos da Academia das Ciências de Lisboa.
Este mês foi
nomeado presidente do Conselho Consultivo da Unidade Local de Saúde do
Nordeste. Adriano Moreira diz que foi “levado ao colo” para Lisboa mas nunca
perdeu a ligação a Trás-os-Montes, onde passava as suas férias de Verão. Aos 92
anos, aceitou receber o Jornal Nordeste para uma conversa na Pousada de S.
Bartolomeu, em Bragança, onde esteve recentemente alojado.
Jornal Nordeste – Os problemas das regiões do interior
preocupam-no particularmente. Como caracteriza actualmente a região
transmontana e, em particular, o distrito de Bragança?
Adriano Moreira – A nossa região sofreu sempre da
interioridade em todas as épocas. Agora, atravessamos uma época de grandes
exigências, dificuldades e sacrifícios da população. A emigração aumenta, o
despovoamento cresce, o desemprego também… É um fenómeno geral no país mas,
naturalmente, nestas regiões é mais intenso. Há uma grande tradição de
afirmação do carácter dos transmontanos quando emigram. Durante muito tempo, a
emigração foi para o Brasil, depois para a Angola… e com uma circunstância: em
geral emigravam os homens e ficavam as mulheres. As mulheres governaram a
sociedade civil. Foram elas que ficaram, ‘viúvas de homens vivos’, como disse
um escritor nosso [Aníbal Rodrigues]. Essa homenagem tem que lhes ser prestada.
Por outro lado, não obstante ser uma região pobre, é uma região com uma grande
personalidade que todos mantêm: a identidade transmontana. Eu verifiquei isso
em viagens por todas as comunidades no estrangeiro. Verifiquei que os
transmontanos eram sempre solidários e muito ligados às suas origens e
forneceram homens com uma intervenção extremamente importante na vida do país.
Eu recordo, nos meus tempos de estudante, de aparecer num jornal de Lisboa, que
se chamava ‘Sempre Fixe’, um desenho que imitava a linha do Marão e depois umas
cabecinhas que eram, por exemplo, do Almirante Sarmento Rodrigues, do Ministro
do Interior, de um Secretário de Estado do Ultramar, o Ministro das Finanças…
Era uma meia dúzia de transmontanos que governava o país e o jornal chamava-lhe
‘a ilustre casa de Bragança’. É curioso que essa gente, que teve esse poder,
não o utilizou em favor dos territórios de Trás-os-Montes porque tinha como que
uma espécie de pudor de ter poder e poder parecer que o exercia em favor das regiões
de que eram originários.
Quais são para si, os verdadeiros problemas relacionados
com a interioridade no distrito de Bragança?
Neste momento, as circunstâncias de Portugal são muito
sérias mas são um reflexo das grandes dificuldades que atravessa a Europa. Eu
acho que a Europa a que nós aderimos está dividida entre uma Europa pobre e uma
Europa rica. A nossa Europa pobre, às vezes, dá-me a impressão que é o Império
Romano mas agora vestido de pobre porque tem o Chipre, a Grécia, Itália,
Espanha, Portugal…A emigração é muito grande, o despovoamento é enorme e isso
leva a um pensamento que está a ser desenvolvido no distrito, que creio que já
está em organização. Como sabe, foi reconhecida pela Constituição a necessidade
de um estatuto especial para os arquipélagos da Madeira e dos Açores. Está em
estudo e em organização em Bragança um grupo que inclui vários professores
universitários para definir um conceito de interioridade equivalente a esse
conceito, mas de conteúdo diferente, para que tenham um regime que vá ao
encontro da realidade e das exigências específicas do território. O grupo está
já em organização, creio que está já a tratar da sede e creio que o senhor
presidente do Município de Bragança tomou a orientação desse projecto. Vamos
esperar que esses estudos e essa vontade, completamente desinteressada do ponto
de vista pessoal, mas empenhada na situação da região, venham a ter propostas
que sejam, ao mesmo tempo, exequíveis e produtivas em relação às dificuldades
que estamos a enfrentar.
De que outra forma se poderiam resolver os problemas da
interioridade?
Há coisas que são graves noutros lados mas que aqui, no
interior, naturalmente são graves, como por exemplo o problema do afastamento
dos serviços das populações. É o caso da saúde, da justiça… E isto tem de ser
encarado. Sei que vai haver algumas reuniões sobre extinção de serviços. Temos
de ter consciência das dificuldades que o estado enfrenta mas é preciso
conhecer a realidade. Esses vão ser problemas que vão certamente ocupar essa
nova organização. Há um problema que me chama especialmente à atenção, mas não
vou dar soluções porque não se deve ser precipitado nem irresponsável nestas
questões mas, o despovoamento é um dos problemas mais ameaçadores. Há problemas
que dizem respeito à reforma do estado e que penso que deviam ser considerados.
As regiões transfronteiriças precisam de ter uma política própria.
Qual a importância que acha que o Instituto Politécnico
tem no distrito e na região transmontana?
Os politécnicos, em geral, estão com dificuldades,
sobretudo em regiões em que o despovoamento é grande. É evidente que as
dificuldades não são iguais em todos os sítios mas é extraordinário que, apesar
das circunstâncias a interioridade serem tão adversas, a qualidade do ensino do
Instituto Politécnico de Bragança, seja reconhecida em todo o país. O politécnico
de Bragança tem defendido a qualidade, tem tido iniciativas extraordinárias e é
um elemento dinamizador imprescindível, sobretudo nas circunstâncias difíceis
da região. Imagine que suprimiam o politécnico… Não é difícil de imaginar o que
isso representaria para a própria cidade de Bragança. Esta instituição tem um
corpo docente bastante competente e uma direcção bastante dinâmica.
Retirado
de www.jornalnordeste.com
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