Acho oportuno regressar a um carnaval de há quase 30 anos aqui em Bragança (exatamente do ano de 1997): São pessoas locais com atitudes ou poses de participação, cansaço ou resignação após uma grande folia.
Carnaval 1997 - Foto1
Neste
animado carnaval na Bragança dos anos 90, aonde ainda havia amostras de
carnaval popular de características mais ou menos espontâneas, fotografei este
rosto espreitando do interior de um grande saiote de flanela preta que
correspondia à parte inferior de um enorme gigantone que o portador fazia agora
descansar em plena praça Cavaleiro de Ferreira. Quis o transportador, nesse
momento, certamente também apreciar o que se passava à sua volta, aonde havia
outros protagonistas e povo que observava com interesse, embora, ele próprio
mostrasse um certo recolhimento ao encobrir todo o resto do seu corpo. Este Bragançano
fazia-se notar amiúde pela sua militância nas festividades da cidade e, muitas
vezes, incentivado ou angariado para tal fim pela própria Câmara Municipal de
Bragança.
Uma pessoa também criativa que um dia me abordou e,
delicadamente me entregou um cartão pessoal bem impresso e concebido em que se
apresentava como executor de serviços de "limpa-chaminés". E esta?...
Talvez o primeiro que formalmente se apresentava como tal numa cidade aonde as
procuras e as ofertas neste sector de serviços domésticos a particulares eram
tipo passa-palavra.
Carnaval 1997 - Foto 2
Para
esta foto e a seguinte ocorreu-me de imediato um título para elas: "Restos".
Efetivamente era quase o final da tarde fria daquela terça-feira de há 27 anos
quando este personagem, de que não sei a identidade, após correr e esgalhoufar pelas ruas da cidade foi,
finalmente, ancorar o costado e o rabo num grande vaso de cimento que servia de
separador mais do que de floreira ou base de um raquítico arbusto. A sua
atitude corporal, com a fatiota e a máscara simiesca, em conjunto, denotando um
certo e estranho alheamento à sua volta e cansaço também, o que parecia até
contraditório, com o espírito de um dia de carnaval (talvez não tanto assim,
pois que a quaresma está à porta e há quase que um aviso de pecado ou
soturnidade associado também ao dia e tempo, que quase sempre aqui em Bragança
estás climaticamente careta - falemos então de uma ressaca do próprio tempo de
carnaval...).
Este sentir e observar despoletou em mim, num reflexo, o interesse
visual desse antagonismo, acrescentado ainda pela atitude do fotografado olhar
para o tomador da imagem também contraditoriamente: patenteando um certo
laxismo do corpo em repouso mas, ao mesmo tempo, um enfoque frontal da sua
máscara algo intimidatória e remetendo-me para o universo de algum filme como
"O Planeta dos Macacos", aonde pululam grupos de macacos agressivos
(embora também outros grupos civilizados, diríamos).
Carnaval 1997 - Foto 3
Esta
foto é aquela que mais me conduz para o título de "Restos". Efetivamente
o rosto da criança e o molho de serpentinas que a mesma angariou lentamente do
chão da praça, fala-nos de uma certa apatia emocional talvez abandono e que
aquele molho parece suprir na condição de um pequeno troféu festivo. Efetivamente
era uma criança que se via muitas vezes sozinha.
No momento certo, na hora exata!
Três imagens elucidativas do carnaval de outros tempos, feito com o que se podia arranjar e com o intuito de brincar, esquecendo regras.
Era preciso ser feliz pelo menos três dias por ano. Na quarta feira de cinzas haveria a penitência e o perdão. "És pó e em pó te tornarás".
Obrigado Jorge pela contextualização das fotografias. É muito interessante a forma como "nos explicas" estas imagens cheias de pormenores significativos que nos transportam, sem dúvida nenhuma, para outros tempos tão diferentes dos de agora.
Maria e Marcolino Cepeda
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